Acórdão nº 08P444 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2008
Magistrado Responsável | SANTOS CABRAL |
Data da Resolução | 26 de Março de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA veio interpor recurso da decisão que o condenou, pela prática de um crime um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º, nº 1 do Decreto Lei nº 15/93 de 22/01, na pena de 5 anos de prisão, de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo artº 86º, nº 1 al. a) com referência ao disposto nos artºs 2º, nº 1 al. ax), 3º, nº 2 al. a), todos da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 2 anos de prisão, e de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo artº 86º, nº 1 al. d) da mesma Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 2 anos de prisão, em cúmulo na pena única de 6 anos de prisão e ainda na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 8 anos.
As razões de discordância com a decisão recorrida prendem-se, por um lado, com a medida das penas parcelares de 5 anos de prisão aplicada pela prática do crime p. e p. pelo artº 21º, nº 1 do Decreto Lei nº 15/93 de 22/01 e de 2 anos de prisão aplicada pela prática do crime p. e p. pelo artº 86º, nº 1 al. d) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro e única aplicadas e, por outro, com a injustificada aplicação da pena acessória de expulsão, verificando-se neste particular nulidade do acórdão por excesso de pronuncia e falta de fundamentação.
Refere o recorrente que: I - Ao arguido foram aplicadas as seguintes penas parcelares: 5 anos de prisão, pela prática do crime do artº 21º, nº 1 DL do 15/93 2 anos de prisão, pela prática do crime do artº 86º, nº 1 al. a) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, com a qual se conforma, e 2 anos de prisão, pela prática do crime do artº 86º, nº 1 al. d) da mesma Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro.
Refere o recorrente que: a) Muito embora esteja consciente da forte necessidade de se punir com rigor e uniformidade o tráfico de estupefacientes, numa tentativa de se pôr travão a quem já delinquiu e evitar que novos traficantes apareçam no circuito, entende que as penas parcelares de 5 e 2 anos de prisão que lhe foram aplicadas respectivamente pela prática dos crimes p. e p. pelo artº 21º, nº 1 do Decreto Lei nº 15/93 de 22/01 e artº 86º, nº 1 al. d) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, no caso concreto, se mostram demasiado severas, com a necessária repercussão ao nível da pena única encontrada; b)Com efeito, a pena concreta tem como finalidade principal ser um remédio que, não pondo entre parêntesis a censura do facto, potencie a ressocialização do delinquente, principalmente quando, confesso e primário, como é o caso; c)Porquanto, o desiderato da ressocialização, que tendo de ser avaliado em concreto, não pode deixar de ter como parâmetro o inconveniente maléfico de uma longa separação da delinquente da comunidade natal e em especial do filho de tenra idade, não faz sentido que o arguido cumpra uma longa pena de prisão que em nada contribui para a respectiva reintegração social posterior; d)Assim, as penas a aplicar, in casu, deveriam aproximar-se ainda mais do limite mínimo da moldura penal abstractamente aplicável, concretamente nos 4 anos e 3 meses de prisão a pena a aplicar pela prática do crime p. e p. pelo artº 21º, nº 1 do DL nº 15/93 de 22/01 e nos 6 meses de prisão a pena a aplicar pela prática do crime p. e p. pelo artº 86º, nº 1 al. d) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, e)Por conseguinte, a pena a aplicar, in casu pela pratica do crime p. e p. artº 21º nº 1 do D.L. 15/93, de 22/01, deveria aproximar-se mais dos limites mínimos da moldura penal abstractamente aplicável e fixar-se concretamente nos 4 anos e 3 meses de prisão.
f)E o mesmo se diga em relação à pena parcelar aplicada quanto ao crime p. e p. pelo artº 86º, nº 1 al. d) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, valendo também quanto a este as razões apontadas supra, a propósito do crime de tráfico de estupefacientes simples, devendo em consequência fixar-se nos 6 meses de prisão; g)Tal, é o que resulta de uma correcta interpretação e aplicação das normas citadas e bem assim do artº. 71º do Código Penal, coisa que o douto Tribunal a quo não fez.
II - Consequentemente, considerados os factos e a personalidade do recorrente, em cúmulo, do conjunto destas penas com a pena de 2 anos de prisão não impugnada com que o tribunal a quo decidiu condenar o arguido pela prática do crime p. e p. artº 86º, nº 1 al. a) da Lei 5/2006 de 23/2, mostra-se mais adequado aplicar-lhe uma pena única que não exceda os 5 anos de prisão, pois é o que aconselha a melhor e mais prudente interpretação das normas supra referidas e bem assim do artº 77º do Código Penal, contrariamente ao que foi feito no acórdão recorrido.
III - Por último, inexistem razões que determinem a aplicação ao recorrente da pena acessória de expulsão, sendo, nesse particular, nulo o acórdão recorrido a)Com efeito, na acusação não se pugnava pela aplicação ao recorrente da pena acessória de expulsão do território nacional; b)Por isso, o recorrente não se defendeu quanto a uma eventual aplicação dessa medida, alegando e justificando o que entendesse em sua defesa, razão pela qual, e desde logo, se mostra violado o princípio do contraditório; c)Porquanto é, nesta parte, nulo o acórdão recorrido por excesso de pronuncia, nos termos do disposto na al. c) do nº 1 do artº 379º do C.P.P., o que se argui para os devidos e legais efeitos.
d)Sendo inconstitucional por violação dos nº 1 e 5 do artº32º da C.R.P. o arco normativo constituído pelos artigos 34º da Lei 15/93, de 22/1, 99º, 101 e 102º da Lei 244/98, de 8/8 e pelos artigos 134º, nº 1, 140º e 151º da Lei 23/2007 de 4/7 quando individual ou conjuntamente interpretados no sentido de que não é necessário a acusação ou a pronúncia conterem factos que de alguma forma permitam uma apreciação concreta a fazer pelo Tribunal nomeadamente quanto à situação pessoal e familiar do arguido, ao período de permanência do mesmo no país, ao seu grau de inserção na sociedade portuguesa, ainda que não possua autorização de residência, mas também por forma a que, por sua vez, o visado deles se possa defender alegando o que tiver por conveniente para a sua defesa.
e)Inconstitucionalidade que, cautelarmente, aqui se deixa invocada para efeitos de eventual recurso para o Tribunal Constitucional f)Por outro lado, a aplicação da pena acessória de expulsão não é automática, dependendo de uma apreciação concreta a fazer pelo Tribunal e onde deverão ponderar-se e equacionar-se vários aspectos, tais sejam os atinentes à situação pessoal e familiar do arguido, ao período de permanência do mesmo no país, ao seu grau de inserção na sociedade portuguesa, ainda que não possua autorização de residência; g)Não obstante, a base factual que no acórdão recorrido serve de suporte à decisão de expulsar o arguido do território nacional pelo período de 8 anos é o que vem descrito em 2.6 sob a epígrafe Sanção Acessória de Expulsão, a fls.13, no entanto sem qualquer correspondência nos factos provados em 2.1, mesmo o que ficou provado sob o nº 8. E só.
h)E é com assento em tal factualidade que o tribunal a quo decide nessa vertente, escrevendo na decisão sob censura: "sem família aqui constituída, sem profissão nem trabalhos certos, pelo que entendemos estarem reunidas as condições para aplicação da sanção acessória de expulsão (...)" ; i)Não obstante, verdadeiramente não se deu como provado que o arguido não tem família aqui constituída, e nem quanto à ausência de profissão ou trabalhos certos, o que redunda numa clara e insuficiente justificação do facto para a imposição da pena acessória em causa, aliada à omissão das razões que a ditaram; j)Na verdade, inexiste no acórdão recorrido o quantum factual bastante para se saber qual a situação do arguido perante o país e, em qualquer circunstância, a sua inserção social, personalidade, família cá residente, etc., tudo para que se possa enquadrar devidamente a sua situação nas hipóteses que a lei prevê e levar em linha de conta, se for caso disso, os condicionalismos legalmente estabelecidos para cada uma das situações.
k)Assim, é também por esta via nulo o acórdão recorrido, nos termos do disposto na al. a) do nº 1 do artº 379º, ex vi artº 374º nº 2 do C.P.P.
l)Impõem-se, por isso, a não aplicação daquela pena acessória ao recorrente, já que se mostram violados por erro de interpretação e aplicação as disposições conjugadas dos artºs . 134º, nº 1, 140º e 151º da Lei 23/2007 de 4/7 e 34º, nº 1 do D.L. 15/93, de 22/01.
Respondeu o Ministério Público referindo que: 1ªSendo a ilicitude muito elevada (detenção de cocaína em significativa quantidade e uma panóplia de instrumentos aptos à venda), sendo intenso o dolo, e pouco relevando em sede de atenuantes a ausência de antecedentes criminais por parte do Arguido, as penas impostas situadas perto dos mínimos legais, são penas que não devem sofrer alterações.
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A pena única de seis anos é equilibrada e ficou aquém da medida da pena achada em função do critério habitual do Tribunal - somar à pena mais alta um terço das restantes penas parcelares.
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O Tribunal observou pois as normas dos artigos 70º, 71º e 77º do C.Penal.
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Para que possa ser decretada a pena acessória de expulsão não é necessário que do despacho acusatório conste tal proposta, essencial é que os factos satisfaçam os pressupostos daquela medida.
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A pena acessória de expulsão deve ter lugar quando o julgador não possa prever como provável que, sem a aplicação daquela medida, os fins da ressocialização sejam alcançáveis.
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No caso concreto estão reunidos os requisitos de natureza objectiva (condenação por tráfico e tratar-se de cidadão estrangeiro), tendo o Tribunal fundamentado a decisão nas circunstâncias de o cidadão cabo-verdiano em causa não ter autorização de residência em Portugal, sem família constituída no nosso país e sem profissão nem trabalho certos, isto é, sem integração social ou familiar no nosso país.
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Não violou pois por isso o Tribunal, nem as normas dos artigos 134º nº 1, 140º e 151º toda lei 23/2007 de 4/7 nem a norma do artº 34º nº 1 do DL 15/93 de 22/1.
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