Acórdão nº 07P3985 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução17 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

    No 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Amarante, no âmbito do processo comum colectivo n.º 17/04.6GCAMT, foi julgado o arguido AA, identificado nos autos, e condenado como autor material de um crime de abuso sexual de criança, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 172.º, n.º 2 e 30.º, n.º 2 do Código Penal (CP), na pena de 4 (quatro) anos de prisão.

    1. Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que negou provimento ao recurso e manteve a decisão recorrida.

    2. Ainda inconformado, o arguido interpôs recurso para este Tribunal, pondo em causa a medida da pena, que entende que deve ser reduzida para quantum não superior a três anos e suspensa na sua execução, com sujeição a deveres: não frequentar os locais frequentados habitualmente pelo menor; proibição de dirigir a palavra ao menor em caso de encontro fortuito; obrigação de custear as despesas da conclusão dos seus estudos no ensino secundário - 12.º ano de escolaridade; obrigação de custear as despesas de um curso de formação técnico-profissional do menor, designadamente, de um curso de informática.

      É que a conduta do arguido ficou-se a dever a doença, "dado que não há ninguém escorreito da cabeça que faça o que ele fez", sendo que o arguido, por outro lado, goza de estima social. Uma pena como a proposta satisfará melhor as exigências de prevenção geral e dará mais adequada reparação ao mal praticado ao menor, para além de que as exigências de prevenção especial ficarão melhor defendidas, permitindo a cura do arguido e obrigando-o a trabalhar duramente para reparar o mal que causou.

      Respondeu o Ministério Público junto do tribunal "a quo", defendendo a decisão recorrida e o consequente não provimento do recurso.

    3. Neste Supremo Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se sobre os pressupostos do recurso, não vendo obstáculo à prossecução do processo para julgamento.

    4. Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento, tendo o Ministério Público defendido que a ilicitude e a culpa são acentuadas, agravadas pela continuação criminosa, pois a pluralidade da factos que integram a continuação não pode deixar de agravar o crime, embora considerado como unidade, e as exigências de prevenção geral são prementes neste tipo de crime, não sendo irrelevantes as de prevenção especial. Assim sustentou a manutenção integral do decidido.

      A defesa remeteu para as motivações.

  2. FUNDAMENTAÇÃO 6. Matéria de facto apurada 6.1. Factos dados como provados: 1.

    No Verão do ano de 2002, o arguido era vizinho do agregado familiar do menor BB nascido em 10 de Fevereiro de 1989; 2. Nessa altura o arguido dedicava-se à exploração de terrenos agrícolas situados junto, ou nas redondezas, da sua habitação, sita no Lugar da Fonte de Cima, freguesia de Real, nesta Comarca; 3. Uma vez que os pais do menor e o arguido estavam ligados por laços de amizade e de vizinhança, combinaram entre eles que no decurso das férias escolares do Verão de 2002, o menor BB iria trabalhar nos terrenos agrícolas que o mesmo arguido agricultava; 4. Deste modo o menor ocuparia os seus tempos livre e receberia, em troca, € 5 diários como compensação pela ajuda prestada; 5. Assim, a partir de data não concretamente apurada, o menor aludido passou a frequentar quase diariamente a casa do arguido; 6. Em data não concretamente apurada mas nunca anterior ao mês de Junho de 2002, e após terem almoçado, o arguido convidou o menor BB para ir dormir uma sesta com ele, no seu quarto e na sua cama; 7. Apesar de inicialmente ter recusado tal convite, mediante a insistência do arguido o menor acabou por aceder ao convite que este lhe dirigiu e foi deitar-se na cama, ao lado do arguido, estando ambos vestidos; 8. Logo de seguida, porém, o arguido esticou o braço e começou a afagar com a sua mão o pénis do menor BB, altura em que este lhe disse para «não lhe fazer mal»; 9. Vencendo a resistência aposta pelo aludido menor, e acto contínuo, o arguido despiu as calças e as cuecas que o BB trajava; 10. De seguida, após despir-se, o arguido massajou o seu pénis até à erecção, colocou-lhe saliva com os dedos e introduziu-o no ânus do menor; 11. Com o pénis introduzido no ânus do menor, o arguido fez movimentos com o corpo de modo a friccioná-lo, até ejacular, o que demorou cerca de cinco minutos; 12. Após esse dia e até ao final do período em que o menor BB consigo trabalhou, e de qualquer modo até data nunca anterior ao final do mês de Agosto de 2002, o arguido, repetiu, por número de vezes não concretamente apurado, e em circunstâncias similares às aludidas, o acto sexual atrás descrito; 13. Tal ocorria, por regra, após o almoço e no quarto da habitação do arguido, tendo no entanto, e por uma única vez, ocorrido no meio de um campo de milho; 14. Sempre que o menor se não mostrava disposto a sujeitar-se às suas intenções libidinosas, oferecia-lhe o arguido € 20, quantia que este, no entanto, nunca aceitou receber; 15. O menor BB sabia que o arguido tinha uma arma de fogo; 16. Porque tinha ouvido o arguido dizer que se «alguém lhe lixasse a vida também lixaria» essa pessoa, o menor BB convenceu-se que o arguido poderia atentar contra a sua integridade física ou contra a sua vida com tal arma, se denunciasse os...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT