Acórdão nº 07P4735 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução16 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça O Ministério Público veio interpor recurso da decisão que condenou o arguido AA pela prática como autor material na forma consumada de um crime de violação na forma continuada na pena de três (3) anos de prisão, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 164º, nº1, 30º, nº1, 26º e 14º, do C.Penal.

Tal pena foi suspensa na sua execução por um período de quatro anos com a condição de demonstrar nos autos o pagamento do montante a que foi condenado em sede de danos não patrimoniais.

As razões de discordância do requerente encontram-se sintetizadas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que:

  1. Pressuposto da continuação criminosa será a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilite a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigivel ao agente que se comporte de maneira diferente. Não constitui crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime se não foram as circunstâncias exteriores que levaram o agente a um repetido sucumbir, mas sim as mesmas foram criadas pelo próprio delinquente, inclusive por via de tendências da sua personalidade.

  2. o acórdão recorrido fez uma incorrecta subsunção ao direito dos factos provados praticados pelo arguido, ao considerar que este praticou um único crime de violação, na forma continuada, pois não ficou provada qualquer circunstância exterior que precipitasse e facilitasse as suas sucessivas condutas e o pressuposto da continuação criminosa deverá tão-só ser encontrado numa relação que, de modo considerável, e de fora, o impele à repetição das condutas criminosas e leve à diminuição de culpa.

  3. Assim, os factos provados e praticados pelo arguido integram pelo contrário, em concurso real, dois crimes de violação p. e p. pelos arts. 164, nº 1 do C. Penal pelos quais deverá ser condenado e não um crime continuado de violação p. e p. pelos 164°, n° 1, 30°, n° 1, 26° e 14° todos do mesmo diploma legal como decidiu, erroneamente, o douto acórdão recorrido.

  4. Foram violados por erro de interpretação, os arts. 30°, nºs 1 e 2,79°, 164°, n° 1 todos do Código Penal.

Nesta instância o ExºMº Sr.Procurador Geral Adjunto pronunciou-se pela forma patente de fls .

Os autos tiveram os vistos legais.

Cumpre decidir.

Em sede de decisão recorrida encontra-se provada a seguinte factualidade: 1-No noite de 18 de Junho de 2005, pelas 21.00 horas, encontrava-se a ofendida BB na adega da sua residência, sita no Lugar de ......., Freguesia de ....................., em Ribeira de Pena quando foi agarrada, pelas braços, pelo arguido que ali inesperadamente aparecera ao mesmo tempo que lhe dizia «hoje tem de ser, esta noite sonhei contigo, tem de ser».

2-De seguida tombou-a por cima de um monte de batatas, ficando esta ali deitada de costas e deitou-se por cima da ofendida.

3-Nesse entretanto, ao mesmo tempo que dizia que lhe queria fazer uma "mamada", levantou-lhe a saia e a combinação.

4- De seguida, concretizando o seu propósito, o arguido manteve com esta trato sexual de cópula completa, introduzindo-lhe o seu pénis erecto na vagina, aí ejaculando.

5-Isto, não obstante a ofendida o ter tentado empurrar com as pernas e com os braços, não o vindo a conseguir.

6-Na noite de 19 de Junho de 2005, cerca das 22.30 horas, quando a ofendida se encontrava a arrumar a cozinha da sua residência o arguido, aproveitando-se do facto da porta da mesma se encontrar entreaberta, acedeu ao seu interior sem o consentimento e, agarrando-a pelos braços disse «BB, hoje vamos para o quarto».

7-Posto isto, valendo-se da sua superioridade física, arrastou-a para o quarto e, uma vez ai, empurrou-a para cima da cama, onde esta ficou caída de costas.

8-De imediato, o arguido levantou-lhe a saia e combinação, tirou-lhe as cuecas e, abrindo-lhe as pernas à força, introduzindo-lhe o seu pénis erecto na vagina, mantendo com esta trato sexual de copula completa até ali ejacular de nada valendo à ofendida o ter tentado impedi-lo com as pernas e os braços.

9-Para concretizar os seus intentos aproveitou-se o arguido do facto da ofendida ser pessoa de idade e viver sozinha num sitio isolado, valendo-se depois da diferença, de forças.

10-Ao proceder do modo supra descrito, o arguido sabia que o fazia contra a vontade da ofendida.

11-O arguido agiu livre, consciente e deliberadamente, bem sabendo que não tinha o consentimento da assistente da assistente, e que a sua conduta era proibida.

12-Agiu ainda o arguido também com o propósito concretizado de com a ofendida tratar sexualmente, pelos modos supra descritos.

13-Conhecia o arguido a oposição e mesmo repulsa da ofendida a tal relacionamento sexual; 14-Agiu, apesar de tal, do modo descrito, indiferente a tal oposição valendo-se do ascendente derivado da diferença de força física, do local ser isolado, da confiança que tinha com a ofendida, logrou o arguido manter com aquela, nas circunstancias referidas, os relacionamentos sexuais descritos.

15-Agiu o arguido sempre de forma livre, voluntária e consciente, sabendo proibidas as suas condutas.

16-O arguido é jornaleiro.

17-Trabalha na agricultura em terras de outrem.

18-Não terras próprias.

19-O seu agregado familiar é neste momento composto pela sua mulher que o auxilia nas tarefas da lavoura e uma filha de dezassete anos que se encontra a estudar.

20-O arguido é analfabeto e de condição económica e social modestas.

21-Foi condenado anteriormente pela prática de dois crimes de injúrias.

Não resultaram provados quaisquer outros factos com relevo para a decisão da causa, provando-se todos os constantes da pronúncia.

Relativamente ao pedido de indemnização civel Está provado que: 1-A requerente é tia por afinidade do requerido.

2- Ela tinha 77 anos à data da prática dos factos e ele 47 anos.

3-Foi ofendida no seu corpo e na sua intimidade e liberdade sexual.

4-Sentiu-se e sente-se vexada envergonhada e humilhada na sua honra.

5-Sentiu nojo e vergonha.

6-Teve a requerente de se deslocar: ao Posto da G.N.R; escritório do seu patrono; ao Centro Hospitalar de Vila Real para ser submetida a exame pericial; O núcleo central da matéria do presente recurso refere-se á questão de a conduta do arguido configurar, ou não, a existência de uma continuação criminosa.

Pronunciando-se sobre a mesma refere a decisão recorrida que: "Ora, se bem vemos, e confrontando-nos com a matéria dada como assente sem grande esforço concluímos que o arguido não praticou dois crimes de violação mas, apenas um e, na forma continuada.

Embora tenha havido duas acções, há apenas a violação da mesma norma jurídica...

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