Acórdão nº 07P3206 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução19 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 18/07, da 7ª Vara Criminal de Lisboa, AA com os sinais dos autos, foi condenada como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes na pena de 4 anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 10 anos.

A arguida interpôs recurso.

São do seguinte teor as conclusões extraídas da respectiva motivação: 1. O douto acórdão condenatório, apesar de considerar sofrer a arguida de problemas do foro mental e de ter ajuda psiquiátrica, não relevou a circunstância (que resulta da simples leitura da acta de audiência e que motivou a dispensa de prova), de a arguida haver confessado na íntegra e sem qualquer reserva os factos delituosos imputados - ou seja, o transporte de cerca de 1.000 gramas de cocaína, que se não destinavam ao nosso país, mas a Espanha - não considerando ainda e devidamente tudo quanto a favor da recorrente se deu como provado, quer no tocante à sua vida passada, grau de cultura e de socialização incluído, quer no respeitante às suas capacidades intelectuais reveladas no cárcere (escritora, pianista), o que mitigaria o dolo na acção revelado.

  1. Deste modo, ao não considerar a relevância dessas circunstâncias (que ainda assim a instância considerou provadas, resultando algumas delas de prova documental inserta na contestação) para o efeito da atenuação especial da pena (que se impunha in casu dadas as características do crime, a ilicitude dos factos delituosos e a mediana intensidade do dolo), violou o recorrido acórdão o disposto no artigo 72º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, por nítido erro de interpretação.

  2. Ainda, ao condenar a recorrente pela prática de um crime de tráfico simples, p. e p. pelo artigo 21º, do DL 15/93, de 22.01, o douto acórdão condenatório fez incorrecta e salvo o devido respeito, indevida interpretação do mesmo artigo 21º, do DL 15/93, 22.01, podendo e devendo considerar-se o simples transporte de cerca de 1 quilo de cocaína, um ilícito penal a subsumir no crime de tráfico mitigado a que alude o artigo 25º, do DL 15/93, dado se tratar in casu de simples transporte de droga, a mesma se não destinar ao nosso país, nem o comportamento, a personalidade ou o tipo de vida anterior da condenada (pianista, escritora, mãe de três filhos que com ela viviam), evidenciar propensão para o crime, surgindo o agir ilícito da recorrente como algo de inesperado ou fortuito na sua vida.

  3. Na verdade, mais nenhuma outra actividade de tráfico foi produzida pela recorrente que não o mero transporte da dita cocaína, tendo este Venerando Supremo Tribunal já entendido que um transporte de 700 gramas de heroína, acrescido de um transporte de outra quantidade não exactamente determinada de cocaína, desacompanhada de qualquer outro acto de tráfico, constitui tráfico de menor gravidade, a punir pelo referido artigo 25º, do DL 15/93.

  4. Aplicando a pena de 4 anos de prisão à recorrente, o recorrido e douto acórdão violou o princípio da equidade e o princípio da coerência da aplicação das penas de prisão, tendo ainda violado a Recomendação n.º R (92) 17 de 19.10.92 do Conselho da Europa, sendo certo que recentemente pelo menos um indivíduo condenado por transporte de 4 toneladas de cocaína, num julgamento que decorreu no Tribunal de Almeirim, foi condenado em 6 anos de prisão - acórdão de 7 de Março de 2007 (P.º 207/05).

  5. Devendo, em consequência, o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que, por mais douto e acertado, condene a recorrente em pena de 3 anos de prisão.

Na contra-motivação apresentada o Ministério Público pugna pela improcedência do recurso, com integral confirmação do acórdão impugnado.

A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta, após referência à legitimidade da recorrente, à tempestividade do recurso e à ausência de circunstância obstativa do seu conhecimento, manifestou o entendimento de que o recurso, pese embora a medida da pena haja sido fixada no mínimo legal, não deve ser rejeitado, visto que haverá que ponderar a eventual aplicação do instituto da suspensão da execução da pena, atenta a alteração operada ao n.º 1 do artigo 50º do Código Penal pela Lei n.º 59/07, de 4 de Setembro, que aumentou para 5 anos de prisão o limite da pena susceptível de suspensão na sua execução.

A recorrente não respondeu.

Colhidos os vistos e realizada a audiência, cumpre agora decidir.

São duas as razões de discordância da recorrente na base das quais fundamenta o seu recurso: a) Incorrecta qualificação jurídica dos factos; b) Desajustada dosimetria da pena.

Questão que oficiosamente cumpre conhecer é a referida pela Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta no seu douto parecer, qual seja a da eventual aplicação do instituto da suspensão da execução da pena, face às alterações introduzidas à lei substantiva penal pela Lei n.º 59/07, de 4 de Setembro, que veio permitir a aplicação daquele instituto às penas de prisão aplicadas em medida não superior a 5 anos - artigo 50º, n.º 1.

O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos - (1): «No dia 5 de Fevereiro de 2007, pelas 13:40 horas, a arguida chegou ao aeroporto de Lisboa, no voo TP-192, procedente de São Paulo, em trânsito pelo Porto e por Lisboa, tendo como destino final Barcelona; No decurso de revisão de bagagem efectuada à arguida no referido aeroporto, foram encontradas na sua posse, na mala de porão da marca "Alexander" modelo "Milano", que ostentava a etiqueta TP 668806, a qual foi aberta na sua presença, depois de a ter reconhecido como sendo sua, três embalagens contendo um produto suspeito de ser cocaína (cloridrato), com o peso bruto de 1037 gramas; Mais lhe foi apreendido: - a aludida mala no interior da qual se encontrava uma bolsa preta, contendo, o citado produto; - uma bolsa preta, da marca Verão e sem modelo aparente, no interior da qual se encontrava o produto estupefaciente; - 70.00 US Dólares; - 81.00 Reais; - um Telemóvel da marca Nokia, modelo 7370, de cor dourada, com o IMEI nº .............; - um telemóvel da marca Siemens modelo C45, cinzento, com o Imei nº ....................; - uma etiqueta de bagagem referente ao percurso Porto - Lisboa - Barcelona, em nome da arguida; - um recibo de bilhete electrónico, emitido pela TAP; - um cartão de embarque referente ao voo Lisboa - Barcelona, ainda por utilizar; - um canhoto de um cartão de embarque, referente ao voo...

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