Acórdão nº 07B3933 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução15 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA - Comércio de Automóveis, Ldª intentou, no dia 11 de Maio de 2001, contra BB SA, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe 491 000 000$ e juros de mora a contar da citação, a título de indemnização, 186 000 000$ por danos emergentes, 105 000 000$ por lucros cessantes e 200 000 000$ por causa da título de indemnização de clientela.

Fundamentou a sua pretensão na circunstância de ter sido constituída em 12 de Dezembro de 1991 com vista à representação comercial de veículos automóveis da marca Ford, ter celebrado com a ré um contrato de concessão comercial relativo a veículos automóveis daquela marca, ter feito consideráveis investimentos em função dele, e que aquela, sem que nada o fizesse prever, o fez cessar por carta de 22 de Junho de 1999, para produzir efeitos no prazo de um ano.

A ré, em contestação, arguiu a nulidade parcial do processo por ininteligibilidade do pedido e, em quadro de impugnação, afirmou que a autora, não obstante o referido contrato, só ter ficado impedida de vender veículos e peças de qualidade inferior aos da marca Ford, não ter cumprido os objectivos das vendas e saber em 1998 que ela iria proceder à reestruturação da sua rede de concessionários.

A autora, na réplica, afirmou a não verificação da ininteligibilidade do pedido e justificou os cálculos dos valores peticionados, e, na audiência preliminar, julgou-se improcedente a referida excepção.

Realizado o julgamento, após as alegações de direito formuladas pelas partes, foi proferida sentença, no dia 29 de Agosto de 2004, por via da qual a ré foi condenada a indemnizar a autora no montante 233 500 000$, sendo 91 000 000$ a título de danos emergentes, 52 500 000$, a título de lucros cessantes, e 90 000 000$, a título de indemnização de clientela.

Apelou a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 29 de Março de 2007, considerou não escrita a resposta ao nº 33 da base instrutória e revogou a sentença, limitando-se a condenar a apelante a pagar à apelada € 165 000 a título indemnização de clientela.

Interpuseram AA-Comércio de Automóveis Ldª e BB SA recurso de revista, a última subordinadamente, formulando a primeira, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação; - não podem aplicar-se por analogia os prazos de denúncia do contrato de agência ao contrato concessão, dados os avultados investimentos e a obrigação de exclusividade do concessionário; - está em causa a conduta da recorrida por ter conhecido, aprovado e incitado a recorrente a realizar avultados investimentos no ano que antecedeu a denúncia do contrato, sabendo que o ia denunciar no prazo de um ano; - há responsabilidade da recorrida por quebra da confiança em termos de venire contra factum proprium, proprium consubstanciado no incitamento da recorrente que a levou a realizar avultados investimentos na expectativa de continuidade da representação comercial que veio a ser frustrada pela denúncia do contrato, sem possibilidade de os recuperar; - os referidos investimentos aproveitaram à recorrida, aumentando as vendas e melhorando a sua implantação na zona, sabendo não poderem ser rentabilizados; - a conduta da recorrida foi ilícita, por violar o princípio da boa fé na execução dos contratos e integrar uma situação de abuso do direito, pelo que deverá indemnizar a recorrente dos prejuízos que lhe causou derivados desses investimentos; - deve indemnizá-la por danos emergentes e lucros cessantes, nos montantes de € 453 906 e € 261 868, respectivamente, com a actualização prevista no artigo 551º do Código Civil; - ao não condenar a recorrida no pagamento destas indemnizações, violou o acórdão os artigos 334º e 762º, nº 2, do Código Civil e o princípio da responsabilidade pela confiança; - o direito de indemnização de clientela, como princípio de ordem pública, é irrenunciável, houve substancial aumento da clientela por força da actividade da recorrente e ocorrem as causas objectivas do seu aproveitamento pela recorrida; - verifica-se o requisito da alínea b) do nº 1 do artigo 33º do Decreto-Lei nº 178/86, de 3 de Julho, porque a recorrida se aproveitou das informações que lhe prestou sobre a clientela angariada; - a alínea c) do nº 1 do artigo 33º do Decreto-Lei nº 178/86, de 3 de Julho, é inaplicável ao contrato em causa porque nada recebeu de retribuição após a sua cessação; - a antecipação do termo do contrato é mera consequência da sua denúncia e destinou-se a minorar prejuízos por via de nova contratação com outra marca; - ocorrem todos os requisitos para a atribuição à recorrente de uma indemnização de clientela a fixar em termos equitativos, por aplicação analógica do artigo 34º do Decreto-Lei nº 178/86, de 3 de Julho; - relevam essencialmente para o efeito as suas margens brutas nos últimos anos do contrato equivalentes aos seus proventos abatidos do custo das mercadorias; - em termos de equidade, a indemnização de clientela a arbitrar à recorrente deve ser fixada em € 448 918$10, pelo que o acórdão recorrido, ao fixá-la nos termos em que o fez, violou o artigo 34º do Decreto-Lei nº 178/86, de 3 de Julho.

Respondeu BB, SA ao recurso interposto por AA Ldª: - o prazo de um ano para a denúncia do contrato era suficiente para acautelar os interesses da recorrente, porque na altura já tinha cinco anos de experiência no sector automóvel, pelo que não é atentatório da boa fé; - assumindo os riscos do contrato, entendeu investir, pelo que não pode invocar ter sido traída a sua confiança por virtude de a recorrida denunciar o contrato no prazo convencionado; - não incentivou a recorrente a investir próximo da denúncia do contrato e o seu direito de denúncia não foi exercido em abuso do direito; - agiu com correcção, lisura e boa fé ao dar a conhecer à recorrente ir reestruturar a sua rede de distribuição e extinguir todos os contratos de concessionário Ford, pelo que não estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade pela confiança; - a iniciativa quanto aos investimentos foi da recorrida, limitando-se a recorrente a aprová-los e, em alguns casos, a incentivá-los; - a...

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