Acórdão nº 97P1316 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Outubro de 1997
Magistrado Responsável | ANDRADE SARAIVA |
Data da Resolução | 15 de Outubro de 1997 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam os juizes que compõem a secção criminal - 1. subsecção - do Supremo Tribunal de Justiça: O Tribunal Colectivo da 7. Vara Criminal da comarca de Lisboa proferiu douto acórdão em 23 de Setembro de 1996, decidindo: a) absolver os Arguidos A, B e C da prática dos crimes por que vinham acusados; b) condenar os Arguidos D, casado, gestor de empresas, nascido a 22 de Junho de 1928, E, casado, reformado, nascido a 1 de Fevereiro de 1926, F, engenheiro mecânico, nascido a 24 de Outubro de 1954, G, casado, engenheiro mecânico, nascido a 18 de Novembro de 1955, e H, viúvo, engenheiro electrónico, nascido a 13 de Março de 1952, cada um, na pena de quatro anos e seis meses de prisão, pela autoria material de um crime do artigo 36, ns. 1 alíneas a e b), 2 e 5 alínea a) do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro; c) condenar a Arguida I, na pena de cento e cinquenta dias de multa à taxa diária de 100000 escudos, pela autoria de um crime dos artigos 3, 7 e 36, ns. 1 alíneas a) e b), 2 e 5 alínea a) do Decreto-Lei 28/84 de 20 de Janeiro; d) não admitir o pedido de indemnização civil deduzido pela União Europeia, por extemporâneo; e) declarar perdoado a cada um dos Arguidos um ano de prisão, e à Arguida I a quantia de 500000 escudos da pena de multa, nos termos do disposto no artigo 14 da Lei 23/91, de 4 de Julho; f) ordenar a publicidade da decisão, nos termos do disposto nos artigos 8, n. 1, 19, ns. 1 e 3 e 36, n. 4 do Decreto-Lei 28/84. Desta decisão interpuseram recurso o Ministério Público, os Arguidos D, E, G, F, G, a requerente União Europeia e a Arguida I. O Arguido F interpôs ainda recurso do despacho que admitiu a junção de documentos requerida pela Arguida I. Todos os recursos foram admitidos para subir nos autos, com subida e efeito próprios. Os recorrentes motivaram concluindo: Ministério Público: 1. provado ficou que os Arguidos prestaram informações desconformes à realidade para conseguirem o processamento do subsídio e, obtido este, gastaram-no em fim diferente daquele para que foi concedido, em 1987; 2. quem obtiver do F.S.E. e I.G.F.S.S. subsídio para formação no montante de 22359539 escudos, fornecendo informações inexactas ou incompletas sobre si ou terceiros e relativamente a "factos importantes" à concessão daquele, utilizando documentos falsos, comete um crime previsto e punido no artigo 36, ns. 1 alíneas a) e b), 2, 5 alínea a) e 8 alíneas a) e b) do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro; 3. só aquando da aprovação do pedido de pagamento de saldo é que o subsídio é atribuído, porquanto todas as normas legislativas aplicáveis às acções de formação referidas em 2 denominam os pagamentos anteriormente efectuados de "adiantamentos"; 4. a documentação apresentada com o pedido de pagamento de saldo é que condicionou a decisão sobre a atribuição ou não do subsídio, caso contrário não faria diferença apresentar um pedido de pagamento de saldo; 5. quem utilizar a quantia referida em 2 a título de subsídio para fins (diversos) daqueles a que legalmente se destina comete o crime do artigo 37, ns. 1 e 3 do Decreto-Lei 28/84; 6. os Arguidos cometeram factos integrantes de previsão dos tipos referidos nos ns. 2 e 5; 7. os bens jurídicos protegidos pelos artigos 36 e 37 do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro, são diferentes: o artigo 36 zela pela fé pública dos documentos apresentados para se obter um subsídio ou subvenção e transferência dos respectivos pedidos; o artigo 37 por seu turno cuida da correcta aplicação dos dinheiros públicos; 8. os factos provados consubstanciam a prática, pelos Arguidos D, E, F, G e H, em concurso real de um crime de fraude na obtenção de subsídio previsto e punido nos artigos 36, ns. 1 alíneas a) e b), 2 e 5 alínea a) do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro, e um crime de desvio previsto e punido no artigo 37, ns. 1 e 3 do mesmo diploma; 9. os mesmos factos consubstanciam a prática pela Arguida I de um crime previsto e punido nos artigos 3, 7, 36, ns. 1 alíneas a) e b), 2 e 5 alínea a) do Decreto-Lei 28/84, e outro previsto e punido nos artigos 3, 7 e 37, ns. 1 e 3 do mesmo diploma, em concurso real; 10. ao entender que os Arguidos referidos em 8 e 9 cometeram os crimes aí aludidos em concurso aparente, sendo as condutas puníveis unicamente nos termos do artigo 36, ns. 1 alíneas a) e b) 2 e 5 alínea a) e 37 do Decreto-Lei 28/84, desrespeitou as normas insítas nos artigos 3, 7, 36 e 37 do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro, e 30 do Código Penal; 11. entendeu-se no douto acórdão recorrido a verificação de concurso aparente, mas deveria dar por verificada a situação de concurso real entre as normas dos artigos 36 e 37 acima referidas; 12. considerando o disposto no artigo 71 do Código Penal e atento os factos dos ns. 32, 33, 37, 38, 39 e 40 da matéria provada, deveriam ser punidos pela prática de um crime de desvio de subsídio, em autoria material, previsto e punido no artigo 37, ns. 1 e 3 do Decreto-Lei 28/84 os Arguidos D, E, F, H e G, cada um deles, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão e 150 dias de multa à taxa diária de 5000 escudos ou, em alternativa, 100 dias de prisão; pela prática do mesmo ilícito previsto e punido nos artigos 3, 7 e 37, ns. 1 e 3 do mesmo diploma à Arguida I deveria ser imposta a pena de 150 dias de multa à taxa diária de 100000 escudos; 13. nos termos do artigo 77 do Código Penal deverá ser imposto a cada um dos Arguidos D, E, F, H e G, a pena única de 6 anos de prisão e 150 dias de multa à taxa diária de 5000 escudos, em alternativa, 100 dias de prisão; nos mesmos termos, deverá a Arguida I ser imposta a pena única de 250 dias de multa à taxa diária de 100000 escudos; 14. nos termos dos artigos 14, ns. 1 alíneas b) e c), 3 e 4 da lei 23/91, de 4 de Julho, deve declarar-se perdoado a cada um dos Arguidos 1 ano de prisão e metade da pena de multa, bem como a respectiva prisão alternativa; 15. nos termos do artigo 14, ns. 1 alínea c) e 4 da lei 23/91, deve declarar-se perdoado à Arguida I 500000 escudos da pena de multa. Arguido D: 1. a matéria dada como provada e constante do texto da decisão recorrida é insuficiente para se considerar verificado por parte do ora recorrente a prática do crime ou crimes por que foi acusado e condenado; 2. a decisão recorrida violou assim o disposto no artigo 410, n. 2 alínea b) do Código de Processo Penal, devendo por isso ser anulada; 3. a decisão recorrida tipificou como crimes previstos nos artigos 36 alíneas a e b), ns. 2 e 5 e 37, n. 3 do Decreto-Lei 28/84, os factos que considerou provados relativamente ao ora recorrente. Tais factos são insuficientes para integrar aqueles tipos legais de crime, sendo que se está perante a sua prática sob forma dolosa; 4. as normas referidas do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro, são verdadeiras normas penais em branco, que carecem de recurso a conceitos e normas legais e regulamentares que nela estão especificadas para se poder concluir pelo preenchimento do respectivo tipo legal, pelo que uma decisão que não se preocupa em definir tais conceitos e normas desrespeita o princípio da legalidade - tipicidade expressamente consagrado no artigo 29 da Constituição da República e artigo 1 do Código Penal. Tal decisão configura uma aplicação inconstitucional do direito por parte do tribunal; 5. a decisão recorrida viola o princípio da legalidade e da tipicidade das normas penais; 6. todo o processo se desenrolou com uma autêntica inserção do ónus da prova, como se devesse ser o Arguido e ora recorrente a provar a sua inocência e não o Ministério Público a provar a culpa; esta inversão configura uma grave violação das garantias do cidadão num Estado de Direito. Ao decidir num processo em que se verificou essa violação de princípios fundamentais o tribunal proferiu uma decisão inconstitucional; 7. a decisão recorrida, com manifesta e absoluta violação do disposto nos artigos 71 e 72 do Código Penal, não fundamenta a decisão quanto à pena e respectiva medida concreta; 8. independentemente dos alegados vícios de sentença, tendo em conta os princípios da subsidariedade do direito penal e da proporcionalidade e adequação das penas tanto do ponto de vista da prevenção especial como geral, jamais deveria o tribunal decidir como decidiu pela aplicação ao ora recorrente de uma pena de privação da liberdade insusceptível de suspensão; 9. mesmo que se admitisse que o ora recorrente praticou os factos que foram imputados preenchendo o respectivo tipo legal nunca a consideração destes princípios permitiria a aplicação de tão pesada pena de prisão; 10. o acórdão recorrido interpretou mal a lei 15/94, de 11 de Maio, que conforme o seu artigo 8, n. 4 considera comulável com anteriores perdões o estabelecido nesse artigo. Deveria assim ter perdoado 2 anos de prisão por aplicação cumulativa desta lei com a 23/91, de 4 de Julho; 11. o acórdão recorrido violou o artigo 29 da C.R.P., artigo 1 do Código Penal, artigo 14 do Código Penal de 1995, artigos 36, ns. 1 alíneas a) e b), 2, 5, 8 e 37, n. 3 do Decreto-Lei 28/84, de 20 de Janeiro, por ter considerado verificados factos integrantes de tipos legais de crimes dolosos, violando assim o princípio da legalidade/tipicidade. O tribunal deveria ter interpretado esses artigos no sentido da absolvição do ora recorrente; 12. o acórdão recorrido violou também os artigos 70 e 71 do Código Penal de 1995 (artigos 71 e 72 do de 1982) ao não fundamentar a escolha e medida da pena. A correcta aplicação dessas disposições legais deveria ter levado à escolha de pena não privativa de liberdade, atendendo aos fins das penas e ao princípio da actuação e proporcionalidade das mesmas e, caso assim se não entendesse quanto à medida concreta, uma pena muito inferior e em qualquer caso suspensa. Arguido E: A) os pressupostos da aplicação da pena têm que estar fixados em lei anterior, como prescreve o n. 1 do artigo 29 da Constituição; B) a adesão de Portugal ao tratado de Roma ocorreu em 12 de Junho de 1985; C) o Fundo Social Europeu é criação das estruturas comunitárias...
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