Acórdão nº 09A197 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução31 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA intentou, em 28.4.2004, pelas Varas Cíveis da Comarca do Porto - com distribuição à 9ª Vara - acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra: BB; e, Banco C...P..., S.A.

Pedindo a condenação dos Réus no pagamento solidário da quantia de € 59.460,80, acrescida de juros de mora à taxa legal sobre a quantia de € 49.879,79, desde a data da propositura até integral pagamento.

Alega que a Ré utilizou um dos cheques do seu falecido pai, referente a uma conta de depósitos à ordem de que este era titular junto do Réu, nele escrevendo com o seu próprio punha a data, a quantia de 10.000.000$00 e o seu nome como beneficiária, bem como o nome daquele no local destinado à assinatura do sacador, procurando imitá-la, após o que o apresentou a pagamento numa das agências do Réu, logrando proceder ao levantamento da aludida quantia, que lhe não pertencia.

Diz, ainda, que a desconformidade da assinatura assim aposta, com a que consta da ficha de assinaturas da dita conta bancária é por demais manifesta e que, através do seu advogado, solicitou ao Réu a conservação de tal cheque para posterior realização de exame pericial, ao que o Réu não atendeu, tendo procedido à destruição de tal título ao abrigo do DL 279/2000, de 10/11.

O Réu contestou, excepcionando a prescrição e impugnando toda a alegação do Autor, com excepção do cheque e do respectivo pagamento pelo seu balcão.

Defendeu que a desconformidade das assinaturas é mínima e que o cheque foi destruído conjuntamente com todos os da mesma altura.

Não aceita que tenha havido negligência da sua parte, quer no pagamento do cheque, quer, no não acatamento do pedido do Advogado do Autor para não o destruir, e que a destruição não pode levar à inversão do ónus da prova.

A Ré também contestou, alegando que viveu em união de facto com o pai do Autor, desde 1990 até à data da sua morte, entendendo os dois que o dinheiro da aludida conta era propriedade de ambos, sendo certo que o cheque lhe foi entregue já preenchido por aquele, impugnando o restante, terminando por pedir a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e que se julgue procedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa.

O Autor replicou.

O processo foi saneado, aí se julgando improcedente a excepção de prescrição, invocada pelo Réu, tendo-se elaborado despacho de condensação.

*** Afinal foi proferida sentença que: A) Julgou a acção improcedente em relação à Ré BB, absolvendo-a do pedido contra ela formulado; e B) Julgou a acção procedente em relação ao Réu BCP, S.A., e condenou-o a pagar ao Autor a quantia de € 54.460,81, acrescida de juros de mora à taxa legal, sucessivamente em vigor, sobre € 49.879,79 desde a propositura da acção até pagamento integral.

*** Inconformados, recorreram o Autor e o Réu Banco, para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 11.9.2008 - fls. 664 a 686 - julgou improcedente a apelação do Autor e procedente a apelação do Réu Banco BCP S.A., revogando a condenação e absolvendo tal Réu do pedido.

*** Inconformado o Autor recorreu para este Supremo Tribunal e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1) - Embora o âmbito de intervenção e decisão do STJ se confine por regra à matéria de direito, não podendo sindicar as presunções judiciais que as instâncias possam (ou não) fazer, por se inserirem no âmbito da matéria de facto, no caso em apreço o Tribunal da Relação do Porto recusou conhecer de uma presunção judicial invocada pelo Autor, esgrimindo, para tal, um fundamento de direito - violação de lei processual civil.

2) - Determinar se os factos, tal qual o Autor pretendia ver provados, cabem ou não dentro dos limites do que foi por ele alegado e decidir-se se uma tal pretensão violava o disposto nos arts. 664º e 264º do Código de Processo Civil e como tal tinha de ser denegada (fundamentio da decisão do tribunal recorrido), constitui questão de direito que cabe no âmbito da intervenção do Tribunal de revista.

3) - Também quanto à ampliação da matéria de facto, pretendida, em via subsidiária, pelo Autor e que a Relação denegou, em face do disposto no art. 729º, n°s 2 e 3, do Código de Processo Civil, nada obsta a que o tribunal de revista dela conheça e determine a baixa dos autos para tal ampliação, se a considerar essencial à decisão da causa.

4) - Ao invés do que entendeu o Tribunal da Relação do Porto, o facto que é constituído pela seguinte afirmação - O cheque referido em c), da matéria assente, com o n°..., com conhecimento da mesma Ré BB foi preenchido e assinado por outrem que não o falecido CC - não extravasa o âmbito dos factos constantes dos arts. 6º a 8º da base instrutória, pois que ao alegar-se nestes que a assinatura em causa fora elaborada pelo punho da Ré BB, sustentaram-se, implícita mas inequivocamente, duas afirmações: a assinatura em causa não foi feita pelo punho do CC; a assinatura em causa foi feita pela BB.

5) - Assim, a afirmação de que a assinatura em causa foi feita por alguém (que não o falecido) com conhecimento da Ré BB é um minus em relação àquele facto alegado, de que fora a Ré Teresa a autora material da falsificação.

6) - Haverá, pois, de determinar-se que os autos baixem ao Tribunal da Relação do Porto para conhecer da presunção judicial invocada pelo Autor nas alegações de recurso de apelação e que, com base num fundamento de direito - violação do disposto nos arts. 664º e 264º do Código de Processo Civil - o Tribunal recorrido recusou conhecer.

Sem prescindir: 7) - Caso se entenda que a factualidade contida nos artigos 6º a 8º da base instrutória não tem amplitude suficiente para neles englobar a possibilidade do tribunal considerar provado aquele outro facto (que a assinatura aposta no cheque em causa com o nome do falecido CC não foi feita por este - com ou sem conhecimento da Ré BB, "pormenor" que, quando muito, na pior das hipóteses para o Autor, apenas poderia relevar em termos de decisão final quanto a essa Ré e não quanto ao co-réu Millenium BCP) então, ao abrigo do disposto no art. 729º, n°3, do Código de Processo Civil, impõe-se que este Tribunal mande baixar os autos para ampliação da matéria de facto, para que se insira no âmbito da discussão da causa os seguintes factos: A assinatura constante do cheque referido na alínea c) da base instrutória não é do punho do falecido CC? E ainda: À data que consta nesse cheque como sendo da sua emissão - 29/11/2000 - embora o CC estivesse doente e internado no hospital, não era previsível a sua morte? 8) - Ou, pelo menos, o primeiro deles: A assinatura constante do cheque referido na alínea c) da base instrutória não é do punho do falecido CC? 9) - O relevo do mesmo para a decisão da causa é evidente: a obrigação de indemnizar que, "in casu", se traduziria na restituição do valor desse cheque que o Réu Millienium retirou da conta à ordem do falecido emerge precisamente do facto de ter aceite a ordem de pagamento desse cheque que não foi dada pelo titular da conta.

10) - Tal facto foi afirmado pelo Autor no art. 17º da petição inicial, onde se disse: "Como quer que seja, a impossibilidade de tal exame não impede a conclusão de que a assinatura aposta não é do punho do falecido, na medida em que a simples análise visual da cópia permite sem mais, e com uma certeza total, obter-se tal conclusão" 11) Para além disso, agora de forma implícita, aquele facto voltou a ser alegado pelo Autor nos arts. 14º ("...que o cheque em causa fora falsificado...") da petição inicial e 17º da réplica.

Sem prescindir: 12) - Os factos tal qual ficaram provados pela 1ª instância bastam para a condenação do banco Réu (que não da Ré BB) no pedido, porque sobre ele recaía o ónus da prova de que a assinatura constante do cheque em causa com o nome de CC era do punho deste.

13) - Desde logo por inversão do ónus da prova - se se entendesse que ao Autor incumbia a prova da falsidade da assinatura, como elemento integrante da causa de pedir - decorrente do facto de o Réu Millenium ter destruído o original do cheque.

14) - Tal destruição ocorreu numa altura em que o mesmo Réu bem sabia da necessidade de preservar o original, face a reclamação que o Autor lhe apresentara.

15) - A norma legal com base na qual o Banco Réu procedeu a tal destruição não a impunha, antes concedia uma mera faculdade que aquele usaria ou não.

16) - Naquele circunstancialismo, era exigível ao Banco que, tendo conhecimento da reclamação e sabendo ou devendo saber dos direitos e obrigações inerentes à convenção de cheque e ao depósito bancário, guardasse esse mesmo cheque essencial à prova da falsidade que o Autor invocara perante ele.

17) - Tal conduta inviabilizou e "tornou impossível", no caso concreto, a prova da falsidade, um vez que, estando em causa uma falsificação da assinatura (levada a cabo seguramente sem a presença de terceiros que a pudessem denunciar) de alguém que, dois ou três dias após a data em que se fez constar desse cheque como data da emissão, acaba por falecer, revelava-se determinante à decisão a realização de exame pericial.

18) - E por causa da falta do original, esse exame não pode determinar com um grau de certeza que pudesse conduzir o tribunal à resposta afirmativa à questão da falsificação, que a assinatura em causa era do punho da Ré BB ou, pelo menos, não era do falecido.

19) - Para além e independentemente disso, como se sustentou no pedido de ampliação de recurso, na resposta às alegações da apelação do Banco Millenium, dos factos provados conclui-se que ocorreu incumprimento da convenção de cheque por parte do Banco réu, que não conferiu a assinatura do sacador no cheque em causa e que era diferente da que constava da ficha de abertura de conta.

20) - Mas, além desse incumprimento, o Autor alegou e provou a existência de um contrato de depósito bancário, vigente entre seu falecido pai e o Banco Réu, e demonstrou também qual o saldo, à data da morte, da respectiva conta aberta na sequência desse...

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