Acórdão nº 276/07.2TBPRG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução17 de Junho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I D e L, instauraram acção declarativa com processo ordinário contra A e M pedindo: - Se declare que sobre o seu prédio urbano para habitação, de três pisos, sito em X descrito no artigo 1.º da Petição Inicial, recai uma servidão de vistas a favor do prédio dos Réus sito no mesmo lugar, descrito no artigo 3.º do mesmo articulado, que se constituiu por usucapião e é materializada pelo parapeito a sul do terraço da casa destes, nos dois lados que deitam sobre a casa daqueles e que correspondem a dois vãos, com as áreas de 1,80 m2 e de 3.450 m2, respectivamente, gozando os Autores da faculdade de requererem a expropriação do referido direito de servidão de que gozam os Réus, enquanto titulares do prédio dominante.

- Consequentemente, mediante prévio pagamento aos Réus da quantia de 2.500,00 €, deverá decretar-se essa expropriação por utilidade particular, em benefício do prédio dos Autores, com vista a libertá-lo daquele ónus, através da declaração da extinção do direito em mérito.

Alegam para o efeito e em síntese que são proprietários do prédio urbano para habitação, de três pisos, sito em X, inscrito na matriz da freguesia de … sob os artigos … e descrito na Conservatória do Registo Predial de …. sob o n.º …., sobre o qual incide uma servidão de vistas a favor do prédio dos réus, sito no mesmo lugar e inscrito na matriz da mesma freguesia sob os artigos …., constituída por usucapião, como foi reconhecido por sentença proferida na acção n.º…..do 2.º Juízo daquele Tribunal, já transitada em julgado.

Tal servidão é materializada pelo parapeito de que é dotado o terraço da casa dos ali Autores, aqui Réus, nos dois lados que deitam para a casa dos Réus, aqui Autores, onerando esta em 1,80 m2 num vão e em 3,40 m2 noutro vão.

A execução daquela sentença, com o inerente recuo de 1,50 m nos dois vãos, importaria a destruição de vigamentos, placas, muros de suporte, paredes-mestras e das escadas que ligam o rés-do-chão ao 1.° andar, bem como a eliminação de dois quartos e de um quarto de banho, ficando a parte restante da casa reduzida a uns escassos 50 m2, sem condições de higiene, segurança e salubridade necessárias à concessão das respectivas licenças de construção e de habitabilidade.

As obras importariam em 40.000,00 €, valor muito superior ao valor do direito de servidão e mesmo ao valor da casa dos réus que continuariam com horizonte visual reduzido.

Para libertarem o seu prédio da servidão de vistas que o onera e obterem a extinção daquela servidão, requerem a expropriação por utilidade particular do respectivo direito, propondo-se pagar, a título de indemnização, o valor de 2.500,00 €. Os Réus contestaram, alegando, em síntese, que, com a presente acção, os Autores visam contrariar uma sentença transitada em julgado, sendo ineficazes todos os factos alegados, que também impugnam, porquanto só poderiam ser atendidos naquela acção declarativa como meio de defesa, sendo que a sentença então proferida já está em execução e contra a qual para além de não terem deduzido oposição os Autores até pediram prazo para cumprimento do decidido, não tendo assim qualquer viabilidade legal a pretensão formulada.

Concluíram pela improcedência da acção e pediram a condenação dos Autores como litigantes de má fé, em multa e indemnização Na réplica os Autores afirmaram não pretender repetir ou contrariar o que foi decidido na outra acção, que aceitam na íntegra e cujo direito nela reconhecido é pressuposto do pedido de expropriação feito nesta acção.

Foi proferida sentença a julgar a acção improcedente com a absolvição dos Réus dos pedidos, da qual, inconformados, apelaram os Autores, recurso esse que, igualmente, veio a ser julgado improcedente.

Travados de razões com o assim decidido, recorreram os Autores, agora de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - Não é lícito aos RR, do ponto de vista ético e moral, pugnarem pela implementação dos efeitos decorrentes da servidão de vistas que lhes foi reconhecido por sentença, podendo os recorrentes, ainda nesta altura e nesta sede, arrimar-se ao instituto do Abuso de Direito, para se oporem àquela pretensão.

- Na negativa, caso este Venerando Tribunal assim não o entenda nem decida, não deixará de ter-se como justa e possível a prolação de douto acórdão que declare ser lícito aos recorrentes pedirem a expropriação particular do direito de que os RR são legítimos titulares.

- Relativamente à 1ª conclusão, haverá de ter-se em conta que os AA sempre cumpriram com a lei, nos termos do respectivo projecto aprovado na …., do qual tinham os Rdos pleno conhecimento, através de editais, afixados no átrio da câmara e no local da obra, mesmo frente à casa destes, chegando o próprio marido a trabalhar ali, sem nunca ter levantado objecções.

- A execução da sentença passará pela destruição quase total do prédio dos AA, tendo o empreiteiro da obra confirmado aquilo de que se aperceberá quem domine as regras de vida nesta área, que, além de ficar danificada a parte “sobrante” da sua casa, haverá perigo de ruína do prédio dos próprios RR, para onde sempre resvalariam, no mínimo, os inertes mais pesados da demolição.

- Da al. g) dos factos assentes, além de apontar, notoriamente, para a desnecessidade da servidão em mérito, resulta, ainda, que a execução ou não execução da sentença em nada prejudicará ou beneficiará a situação real de que fruem os RR, pois o horizonte visual de que disporão através do terraço, mesmo ao nível do último piso, continuará a ser praticamente o mesmo.

- Observando-se em ambas as instâncias - é o que se nos antolha das respectivas entrelinhas - que se os AA tivessem invocado o Abuso de Direito na acção …-2°Juízo, tal poderia ter obstado à sua condenação, não será justo recusar a aplicação desse instituto nesta sede, com base no seu não exercício naquele processo.

-...

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