Acórdão nº 1394/04.4PCAMD.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução06 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

N.º 1394/04.4PCAMD.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA intentou no dia 2-4-2004 ação declarativa de condenação com processo ordinário contra o Município da Amadora deduzindo os seguintes pedidos: - Que se declare constituído por usucapião, como prédio distinto autónomo, dividido e demarcado, a parcela de terreno com a área de 1200m2 ocupada até há dois meses pela autora sita na Rua ..., n.º …, na ..., ... - ..., 2770-Amadora.

- Que se declare a autora legítima e exclusiva possuidora desse prédio, desanexando-o de facto e de direito, caso ainda não tenha descrição própria, do prédio que proveio por desanexação, livre de quaisquer ónus ou encargos que sobre o mesmo incidem.

- Que se condene o Município da Amadora a ver, reconhecer e acatar a constituição e existência de tal prédio como autónomo, distinto, dividido e demarcado, assim como o direito de propriedade da autora sobre esse prédio, nos termos aludidos, e abster-se de qualquer ato que perturbe ou impeça a existência e exercício, respetivamente desse prédio e direitos.

- Que se ordene que o Município da Amadora , ora réu, informe a descrição predial atual que corresponde ao prédio em que se integra a parcela de terreno correspondente ao n.º … , Rua ..., na ..., ..., ..., 2700-Amadora - Que se ordene a reposição do estado da moradia e terreno nas mesmas condições em que estava antes da demolição.

  1. Alegou a A. que ocupou em 1974 terreno abandonado onde construiu uma pequena habitação, construindo em 1976 uma moradia; a construção foi efetuada sem licença municipal e sem oposição por parte da Câmara Municipal; paga contribuição autárquica comprovando o pagamento respeitante ao ano 2000 respeitante ao artigo matricial ...; viveu na moradia desde 1974; tem posse da parcela de terreno desde 1974 que adquiriu por usucapião, encontrando-se tal parcela registada a favor do Município da Amadora, não estando, no entanto, identificada a descrição predial respetiva; a moradia foi entretanto demolida por imposição camarária.

  2. A ré contestou alegando que a A. declarou, no momento da sua inscrição no Programa Especial de Realojamento (PER) que residia na aludida barraca desde 1984, ocupando e mantendo ocupação em terreno que não lhe pertencia por tolerância da ré; na sequência do PER, abriu-se a possibilidade de erradicação de todos os bairros de barracas com o consequente realojamento dos agregados familiares aí residentes; a autora foi recenseada em 1993 para efeitos de realojamento, constatando-se que o agregado familiar em questão composto por ela e por BB havia sido realojado em 1-12-1974 pelo ex-Fundo do Fomento da Habitação na Rua ..., lote …/…/Zona I onde a autora reside; foi, por isso, iniciado processo de exclusão do aludido agregado do PER de cuja decisão foram aqueles notificados com a consequente demolição da construção implantada em terreno alheio ( cf. DL n.º 555/99, de 16 de setembro, artigo 106.º); o prazo de prescrição aquisitiva, tratando-se de terreno municipal, e igual aos que estiverem em vigor mais metade ( cf. Lei n.º 54 de 16-7-19193 em vigor; cf. DL n.º 47344, de 25 de novembro de 1966); assim, iniciada a posse em 1984, o prazo não decorreu.

  3. A ação foi julgada improcedente por sentença de 12-7-2012 que considerou o seguinte: - Que não se apurou nem se procurou apurar a quem pertencia o terreno, não se demandando o proprietário ou incertos.

    - Que, a ser terreno municipal não seria usucapível por ser do domínio público (artigo 204.º/2 do Código Civil).

    - Que, recenseada em 1993 ao abrigo do PER, nessa altura tomou conhecimento de que a autarquia se opunha à ocupação, não a considerando dona do terreno.

    - Que exerceu posse desde 1974, não titulada, de má fé e, por isso, em 1994 ainda não tinha decorrido o prazo de 20 anos para aquisição do imóvel por usucapião.

  4. O Tribunal da Relação negou provimento ao recurso interposto pela autora mas com fundamentação diferente.

  5. Considerou-se no acórdão o seguinte: - Que aparentemente a edilidade se apresentou como detentora da construção abarracada quando da sua demolição que ocorreu na sequência do processo administrativo camarário, mas não se demonstra que alguma vez se tenha apresentado como detentora ou possuidora ou proprietária do terreno com a área de 1200m2 cuja restituição a A. pretende obter, o que só por si inviabiliza essa parte do pedido.

    - Que a pretensão da autora de condenar o réu " a ver, reconhecer e acatar a constituição e existência de tal prédio como autónomo, distinto, dividido e demarcado" implica o reconhecimento de um loteamento proibido pelo artigo 1.º/1, alínea a) e n.º 2 do DL n.º 400/84, diploma aplicável por ter sido, na sua vigência, que a edificação terá sido concluída.

    - Que da conjugação desses nºs 1 e 2 " parece resultar a proibição de qualquer ação dentro ou fora de aglomerado urbano ( a lei não distingue) que tenha por objeto ou efeito a divisão em lotes, qualquer ato preparatório, qualquer elemento que indicie a divisão de lotes ou parcelas que não sejam efetuadas ao abrigo de uma operação previamente licenciada ou autorizada.

    - Que o destaque que a autora efetivou materialmente pela construção de uma moradia sem licenciamento municipal prévio em imóvel não loteado, destaque que a autora pretende ver reconhecido por via judicial é um ato que a lei não permite e que os Tribunais estão impedidos de praticar.

    Concluiu o acórdão recorrido nestes termos: "2. Estando em causa um loteamento ilegal e construções clandestinas, realizadas no lote fisicamente delimitado, com violação manifesta das regras urbanísticas, se o interessado não alegar e provar a expectativa razoável de uma legalização administrativa que previna os riscos de demolição coerciva não podem qualificar-se tais construções como benfeitorias úteis, nem invocar-se que o respetivo valor enriquece injustificadamente o conjunto dos consortes reivindicantes do prédio comum" 7.

    Interpôs a autora recurso de revista, concluindo a respetiva minuta nos termos que a seguir se transcrevem: "- Com o devido respeito que muito é mas consta dos autos da douta Sentença da 2ª Instância, como provada, que a autora desde 1974 que ocupa o prédio objeto...

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