Acórdão nº 1202/11.0TBBRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

P.1202/11.0TBBRG.G1.S1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA intentou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB e mulher, CC, pedindo que os réus sejam condenados: . a pagar-lhe a quantia de €52.373,78., actualizada em função das flutuações do valor da moeda, “por forma a repor ao Autor a situação patrimonial que teria se não existissem os invocados danos”; . subsidiariamente, caso não se entenda ser devida a actualização monetária peticionada, que àquele quantia “sejam acrescidos juros à taxa legal” desde a data de entrega dos cheques até efectivo e integral pagamento; . a pagar-lhe a quantia de €5.000,00. de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

Para tal, alega que, em síntese, que depois de estabelecer contacto com o réu marido, por estar à procura de lotes de terreno para construção de uma casa, veio a negociar com ele a aquisição de um lote de terreno, tendo acordado o preço de venda e as condições de pagamento, assumindo-se e agindo aquele como dono desse lote. Concluídas as negociações, a 5 de Julho de 2004, foi assinado o contrato denominado de “contrato de promessa de cedência de posição contratual”, tendo a sociedade “DD, Lda.”, da qual o réu é sócio gerente, outorgado como primeira outorgante.

Aceitou celebrar o contrato nos termos descritos porque o réu lhe afirmou que era a sua sociedade quem detinha formalmente os poderes de venda do imóvel.

A 31 de Agosto de 2004, o autor e o réu acordaram na troca daquele lote n.º 41 pelo lote n.º 42, elaborando e assinando um novo contrato em tudo idêntico ao primeiro.

Entregou ao R. dois cheques de dez mil euros relativamente ao 1º contrato, valores que transitaram e integraram o sinal do segundo contrato, por acordo das partes; e, relativamente ao segundo contrato, entregou ainda ao réu mais três cheques de €25.000,00, €5.373,78 e de €2.000,00, valores que o R., e não a sociedade de que é sócio, fez integrar no seu património.

Porém, nem o réu, nem a sociedade de que é gerente, eram proprietários do lote prometido vender, nem tão pouco dispunham de poderes ou posição que lhes permitissem transmitir esse lote ao autor. Além do correspondente dano patrimonial por se encontrar desapossado das quantias entregues ao réu, sofreu também angústia, ansiedade e muitos incómodos.

O Réu contestou, defendendo-se por excepção e por impugnação. Por excepção, invocou a existência de caso julgado, em face da decisão proferida no processo comum colectivo n.º 2048/06.2TABRG da Vara Mista de Braga, onde foi absolvido do pedido de indemnização cível aí enxertado pelo aqui autor com base em responsabilidade civil extracontratual ou por factos ilícitos; e a ilegitimidade do autor para, por si só, estar em juízo, desacompanhado de sua mulher, que foi quem assinou três dos cheques e que os entregou à aludida sociedade, tendo igualmente subscrito os contratos promessa.

Foi proferido despacho saneador onde se decidiu: . julgar verificada a excepção de caso julgado, atentos os pedidos e a causa de pedir apresentados nesta acção e no âmbito do pedido cível deduzido no processo comum colectivo n.º 2048/06.2TABRG, aqui com base na responsabilidade civil pré-contratual, mas com a alegação da prática dos mesmos factos ilícitos; . considerar inepta a petição inicial no que respeita à demais matéria alegada, desde logo quanto à imputação ao réu, em nome individual, de actos violadores das regras da boa-fé negocial, e quanto à ré mulher, por ausência de imputação de quaisquer factos ou de quaisquer circunstâncias que permitam justificar a sua demanda, inexistindo quanto a ela causa de pedir.

O A. apelou de tal decisão, tendo a Relação concedido parcial provimento ao recurso, revogando o decidido na medida em que julgara procedente a excepção de caso julgado e absolvera o R. da instância por ineptidão da petição inicial – começando por fixar o seguinte quadro factual relevante: . Correu termos na Vara de Competência Mista de Braga uns autos de processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo com o nº 2048/06.2TABRG em que foi arguido o ora apelado, BB.

. Nos referidos autos o ora apelante deduziu pedido cível contra o referido BB nos termos de fls 142 a 144, alegando, designadamente o seguinte: 1º Dão-se aqui como reproduzidos todos os factos constantes da douta Acusação Pública.

2º Designadamente que entre o dia 3 de Julho o dia 3 de Setembro de 2004 fizeram entregas ao Requerido de diversas quantias que totalizaram 52.373,78 euros (…) 3º Esse dinheiro foi entregue para aquisição dum lote de terreno que, posteriormente, se veio a verificar não pertencer nem nunca ter pertencido ao Arguido.

4º Denunciada a burla o Arguido não tomou a iniciativa de devolver o dinheiro aos Requerentes, 5º E, no entanto estava o Arguido obrigado a devolver a quantia em causa desde, pelo menos, à data em que recebeu dos Ofendidos a última prestação.

6º Tal quantia vence juros à taxa legal, desde Setembro de 2004 até integral ressarcimento, somando nesta data os já vencidos a quantia de 8.652,00.

7º Além disso a atitude inqualificável do arguido tem vindo, ao longo destes quatro anos, a provocar aos requerentes inúmeros incómodos, preocupações e dificuldades de vária ordem.

8º Todos os dias dos requerentes sofrem a imensa preocupação de estarem desapossados daquela enorme quantia, 9º Sofrem a angústia de não saberem quando e como irão ser ressarcidos, 10º Sendo certo que têm compromissos assumidos que nunca poderão cumprir se o arguido não lhes devolver o dinheiro que indevidamente retém.

11º Por todas essas razões devem os requerentes ser ressarcidos pelos intensos danos não patrimoniais que têm vindo a sofrer com a atitude ilegítima do arguido cujo montante não deverá ser fixado em valor inferior a 5.000,00 euros.

Nestes termos deve o presente pedido cível ser julgado provado e procedente e por via dele o arguido ser condenado a pagar aos requerentes a quantia de 57.373,78, acrescida de juros à taxa legal sobre a quantia de 52.373,78 desde Setembro de 2004 até integral ressarcimento, somando já os vencidos a quantia de 8.652,00.” .Por acórdão de 11 de Dezembro de 2009 foi julgada improcedente a acusação e o arguido absolvido da pratica do crime de burla qualificado p.ep. pelos artºs 217º nº 1 e 218º nºs 1 e 2 alínea a), ambos do Código Penal e foi julgado improcedente o pedido cível.

.Lê-se no acórdão penal o seguinte: “Conforme resulta do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ 7/99, de 17/06/99 (DR I série, de 3/08/99), se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artº 377º nº 1 do CPP, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em acção cível se o pedido se fundar em responsabilidade contratual.

Decorre daqui que o tribunal se vê impedido de apreciar o pedido deduzido à face da responsabilidade contratual, ou seja, apenas pode o tribunal apreciar a matéria concernente à acção cível enxertada à face da responsabilidade extracontratual ou aquiliana – a responsabilidade civil emergente de factos ilícitos (e, em certos casos,a responsabilidade emergente de factos lícitos).

Ora, apreciando o pedido de indemnização à luz da responsabilidade civil extracontratual (artº 483º e seguintes do Código Civil), fácil é concluir pela sua improcedência. A solução da questão não passa pelo instituto da responsabilidade civil extracontratual, mas antes pela responsabilidade civil contratual (existiu um...

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