Acórdão nº 1043/10.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução20 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AA, LDA veio intentar a presente acção, com processo ordinário, contra BB e mulher CC e DD, pedindo: a) que seja reconhecido à autora o direito de preferência na compra e venda outorgada em 12 de Abril de 2010, entre os primeiros réus como vendedores e o 2º réu, como comprador, tendo por objecto a fracção autónoma melhor identificada na p. i.; b) que seja o direito de propriedade de tal fracção autónoma declarado pertencer à autora e que seja ordenado o cancelamento dos registos de aquisição na CRP de Lisboa, a favor do 2.º réu; c) que seja o 2.º réu condenado a restituir à autora todas as rendas que venham a entregar-lhe, desde a vencida em 1/5/2010, até ao trânsito em julgado da sentença.

Alegando, para tanto, e em síntese: É arrendatária da fracção urbana em causa nos autos, desde 10/2/67, que os primeiros réus venderam ao 2.º, que lha comprou, pelo preço de € 50 000,00.

Não foi comunicado à autora o projecto da venda realizada, com indicação do preço, prazo para a sua concretização, condições de pagamento e identificação do terceiro interessado em adquirir.

A autora, como arrendatária, pretende exercer o seu direito de preferência.

Citados os réus, vieram os primeiros contestar, pugnando pela sua absolvição do pedido.

Alegando, também em síntese: Nunca tiveram intenção de vender o imóvel fracção a fracção, mas sim a sua totalidade.

Comunicaram à autora, enquanto arrendatária da loja, tal propósito, pelo valor total de € 810 000,00.

Sem que a mesma tivesse respondido.

Pelo que venderam o prédio.

Também o segundo réu veio contestar, alegando, ainda em suma: Caducou o direito da autora à acção de preferência.

Se assim não for entendido, deve a acção improceder.

Deduziu, ainda, pedido reconvencional, pedindo a condenação da autora a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 565 000,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora até integral pagamento.

Mais pediu a condenação da autora como litigante de má fé, pois a mesma bem sabe que ele adquiriu a totalidade do prédio, não tendo respondido à comunicação que lhe foi feita para o exercício do seu direito de preferência.

Replicou a autora, pedindo a improcedência da excepção da caducidade, a inadmissibilidade do pedido reconvencional e a improcedência do pedido de condenação por litigância de má fé.

Mais pedindo, agora ela, a condenação do 2.º réu como litigante de má fé.

Foi proferido o despacho saneador, que, alem do mais, julgou improcedente a arguição da excepção da caducidade e inadmissível o pedido reconvencional deduzido.

Foram fixados os factos tidos por assentes, tendo sido organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 666 a 669 consta.

Foi proferida a sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu os réus dos pedidos formulados. De igual modo, julgando improcedentes os pedidos de condenação por litigância de má fé.

Inconformada, veio a autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão de fls 872 a 898, na procedência do mesmo e na revogação da sentença recorrida, se declarou o direito da apelante a preferir na venda da fracção de que é arrendatária e ao recebimento das rendas, desde a vencida em 1/5/2010, nos termos peticionados. Condenando os apelados em conformidade.

Agora irresignado, veio o réu DD pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - À impugnação da resposta ao ponto n.º 4 da Base Instrutória com fundamento em que a mesma violava o disposto no artigo 374.°, n.º 2 do Código Civil, no Recurso de Apelação, o Tribunal da Relação de Lisboa pronunciou-se favoravelmente, uma vez que atenta a impugnação do documento, incumbia aos Réus a prova da sua veracidade, não podendo o Tribunal a quo dar como provada a veracidade do contrato-promessa de compra e venda com o próprio documento.

2ª -Todavia, o Recorrente apresentou prova da veracidade do contrato-promessa de compra e venda, em conformidade com o disposto no artigo 374.°, n.º 2 do Código Civil, isto é, apresentou cinco depoimentos de testemunhas que, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, confirmaram a existência do contrato-promessa de compra e venda, respectivo conteúdo e veracidade das suas assinaturas, prova essa que foi ignorada.

3ª - Em face desses depoimentos, atrás transcritos, e uma vez que o ónus da prova da veracidade do contrato recai sobre os apresentantes do documento, retirando ao Juiz o poder de dar como provado tal facto, o Tribunal da Relação de Lisboa não podia ignorar esta prova produzida pelo Recorrente, sabendo-se que tal meio de prova, testemunhal, é admissível. Neste sentido, citem-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.10.1989, (AJ, 2.°/89, pág. 13) e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 09.07.1996, (BMJ, 459.°- 618), a título meramente ilustrativo, dado que a questão da admissibilidade da prova testemunhal, para situações compreendidas no âmbito do artigo 374.°, n.º 2 do Código Civil, até é pacífica na Jurisprudência e na Doutrina.

4ª - Mais, o Tribunal da Relação de Lisboa, reconhece a existência dessa prova, citando no seu Acórdão: "Apesar de tais depoimentos e atento o seu conteúdo, o tribunal a quo deu como provado o ponto 4 com base no próprio documento impugnado nos seguintes termos (. . .) ou seja, o tribunal a quo deu como provada a veracidade do documento com o próprio documento, o que lhe estava vedado pelo disposto no artigo 374.º, nº 2 do Código Civil, o qual, ao lançar sobre os apresentantes desse documento o ónus da prova da sua veracidade, retirou ao juiz o poder de dar como provado tal facto, com fundamento no princípio da livre apreciação da prova", todavia, ignorou a prova apresentada pelo 2.° Réu na sua decisão, quando o Tribunal da Relação de Lisboa deveria ter corrigido o lapso operado pelo Tribunal a quo, substituindo a fundamentação da prova no próprio documento pela prova testemunhal apresentada, pois nos poderes do Tribunal da Relação, quanto à matéria de facto, está incluído também o poder de a alterar, na parte impugnada, ampliando-a, quando não contrarie as respostas dadas aos quesitos.

5ª - Ao omitir a prova produzida, o Tribunal da Relação contraria as numerosas respostas objectivas dadas aos quesitos 1.°, 4.° e 10.° pelas diferentes testemunhas ouvidas na Audiência de Discussão e Julgamento e demais provas ao longo do processo.

6ª - É óbvio que a razão de ser das respostas negativas é a ausência de prova, o que não se verifica nesta situação. O Tribunal da Relação de Lisboa tem que atender a toda a prova produzida, nomeadamente a testemunhal, neste sentido veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 15.02.2007, (processo n.º 1858/06.3.dgsi.net), entre outros.

7ª - Termos em que deverá ser considerada a resposta ao ponto controvertido n.º 4 como "provado", com base nos depoimentos das testemunhas P...P..., C...E..., P...L..., Dra. A...C... e S...M....

8ª - A omissão da apreciação da prova testemunhal pelo Tribunal da Relação de Lisboa implica a nulidade da decisão, com fundamento no disposto no artigo 668.°, número 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

9ª - Por outro lado, o Tribunal da Relação de Lisboa não poderia aceitar a impugnação do contrato-promessa de compra e venda outorgado entre os Réus, por parte da Apelante, com fundamento no incumprimento de uma formalidade no dito contrato-promessa, no caso em apreço a ausência de reconhecimento das assinaturas, uma vez que a Apelante é terceira nessa relação contratual.

10ª- Ainda que fosse possível duvidar da autenticidade das assinaturas do contrato-promessa de compra e venda, por uma questão de princípio, nos moldes apresentados pela Apelante nas suas Alegações, o artigo 410.°, n.º 3 do Código Civil, na actual redacção, não consagra, na inobservância do reconhecimento presencial de assinatura, um regime de nulidade ou de anulabilidade típicas, mas sim de invalidade mista, não invocável por terceiros, nem oficiosamente cognoscível ou sanável pelo tempo.

11ª- Decidindo neste sentido, citem-se a título ilustrativo e meramente exemplificativo os seguintes Acórdãos: Acórdão da Relação de Lisboa, de 30.04.1998, (BMJ, 476. °- 475); Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.11.93, (BMJ, 431.°- 453); Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.01.93, (CJ/ST J, 1993, 1.°-30); Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.01.93, (BMJ, 423.°- 464); Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.92, (BMJ, 415.°-623.°); Acórdão da Relação do Porto de 30.06.92, (BMJ, 418.°- 856).

12ª- Consequentemente, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa na sua decisão violou uma norma de direito substantivo, em concreto o disposto no artigo 410.°, n.º 3 do Código Civil, ao reconhecer a possibilidade de impugnação, por parte da Apelante, das assinaturas do contrato-promessa de compra e venda, outorgado entre os Réus, por terceiro não interveniente na relação contratual.

13ª- À impugnação das respostas aos pontos n.ºs 1 e 10 da Base Instrutória com fundamento em que as mesmas violavam o disposto no artigo 653.°, n.º 2 do Código de Processo Civil, no Recurso de Apelação, o Tribunal da Relação de Lisboa pronunciou-se favoravelmente, uma vez que no seu entender pressupõem a prova da celebração entre os Réus do contrato-promessa de compra e venda.

14ª- Cumpria ao Tribunal da Relação de Lisboa considerar a prova testemunhal apresentada pelos Réus para prova dos pontos controvertidos números 1 e 10 da Base Instrutória, à qual também se omitiu de apreciar.

15ª- Neste sentido, veja-se a argumentação apresentada nas conclusões números 2 a 8 das presentes Alegações de Recurso, a qual se aplica também à análise das respostas aos pontos controvertidos nºs 1 e 10 da Base Instrutória. O Tribunal da Relação de Lisboa, nesta sede, não...

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