Acórdão nº 866/05.8TCGMR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução28 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 866/05.8TCGMR.G1.S1[1] (Rel. 115)[2] Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 – AA instaurou, em 14.09.05, na comarca de Guimarães (com distribuição à 1ª Vara Mista), acção declarativa de condenação, com processo comum e sob a forma ordinária, contra BB e CC e mulher, DD, pedindo a condenação destes a restituírem à A. o valor pecuniário correspondente ao que ao imóvel identificado na p. i.

vier a ser liquidado por arbitramento ou – a não ser entendido assim – em execução de sentença, tendo como mínimo o valor declarado na última transmissão referida (Esc. 4 000 000$00), acrescido de juros à taxa legal desde a citação.

Fundamentando a respectiva pretensão, alegou, em resumo e essência: / --- Em 10.10.88, arrematou em hasta pública o prédio id. na p. i., de que, então, era arrendatária habitacional; --- Em 23.05.89, acompanhou o 2º R., seu filho, a C... para outorgar, segundo informação deste, escritura de compra que era necessária, depois de exercida a preferência, e com intervenção do 1º R. como representante do Tribunal, por designação do senhor juiz; --- Porém, nessa escritura, o 1º R., amigo e colega de trabalho do 2º R., prestou-se ao papel de fingir a sobredita qualidade e vender-lhe esse prédio quando, ao invés, declarava, por tal escritura, que comprava o prédio para si próprio; --- Cinco meses depois, cumprindo, novamente, instruções do 2º R., declarou vender a este o mesmo prédio, por Esc. 3 000 000$00, em escritura celebrada em V...; --- A A. jamais teria assumido como suas as declarações feitas se não tivesse sido convencida de que outra era a realidade; --- A escritura de compra e venda, posteriormente, celebrada entre os 2º/s RR. e EE foi o único negócio efectivamente querido, realizado sem o seu conhecimento e consentimento e em seu prejuízo, servindo o propósito de aqueles embolsarem o preço; --- Instaurou, na 2ª Vara, uma acção em que foram declaradas nulas, por simulação, as escrituras públicas celebradas em C... e V...; --- Porém, devido à transmissão, validamente, efectuada ao EE, que registou em seu nome e antes da declaração de nulidade o mencionado prédio, não pode este ser-lhe (à A.) restituído pelos RR.; --- Mercê do ardiloso comportamento descrito, os RR. lograram enriquecer o seu património à custa de bem que só a si (A.) pertencia, devendo restituir-lhe aquilo com que, injustamente, se locupletaram, sendo que o valor do imóvel transmitido é, no mínimo, de Esc. 4 000 000$00.

Os 2º/s RR. contestaram, deduzindo o incidente de impugnação do valor da acção, a que, considerando o peticionado pela A., atribuem o valor de € 19 951,92.

Deduziram a excepção dilatória de caso julgado, a excepção peremptória inominada da subsidiariedade – aqui inverificada – da invocabilidade do instituto do enriquecimento sem causa como fundamento do accionado crédito da A. sobre os RR.. o qual, se reportado a tal fundamento, igualmente, se encontraria extinto por prescrição.

Quanto à matéria fáctica aduzida pela A., aceitam-na como verdadeira na exacta medida em que coincida com o que emergiu provado na acção nº 296/2002, da 2ª Vara Mista desta comarca, a cuja reprodução procederam.

Rememoram que ficou provado, naquela acção, que a A. quis, de livre vontade e por desígnio comum a si e aos contestantes, colocar na titularidade destes a propriedade do imóvel, o que concretizou mediante a celebração da escritura de C..., visando criar a aparência formal de que não se tratou de uma venda ou doação de mãe para filho.

Com a pretendida transferência de propriedade, a A. visou fazer uma liberalidade, a qual é causa justificativa do correspondente enriquecimento dos contestantes, sem ocasionar a si qualquer empobrecimento.

Salientam que, por alturas da arrematação, a A. apenas dispunha de Esc. 940 000$00, quantia que foi utilizada para a compra, sendo o restante entregue pelos contestantes.

Por volta do ano de 1992, a A. pediu-lhes que lhe efectuassem a entrega daquele montante, alegando que dele precisava para pagar direitos de ingresso no Lar da ..., ao que os RR. acederam.

Terminam pedindo a condenação da A., como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor não inferior a € 2 500,00, por ter, conscientemente, alterado a verdade dos factos.

A A. replicou, argumentando que a causa de pedir é a consequência da declaração de nulidade de dois actos simulados e da impossibilidade de essa declaração de nulidade poder levar à restituição do prédio; o pedido respeita ao pagamento do valor do prédio transmitido. Acrescenta que o direito reclamado neste processo é o que lhe foi reconhecido na acção precedente, cuja sentença transitou há menos de um ano.

O 1º R. não contestou.

Precedendo o despacho saneador, foi decidido o incidente de impugnação do valor da causa, vindo este a ser fixado em € 19 951,92.

Foi, de seguida, proferido despacho saneador que, além do mais, julgou procedente a deduzida excepção dilatória de caso julgado, absolvendo-se, em consequência, os RR. da instância.

Todavia, vindo a obter provimento o agravo interposto, pela A., de tal decisão, foi esta objecto de revogação.

Prosseguindo-se, por isso, na elaboração do despacho saneador, foi julgada improcedente a deduzida excepção peremptória da prescrição do direito accionado pela A., saneando-se, no mais e tabelarmente, os autos.

Simultaneamente, com arrimo na factualidade havida por provada no mencionado Proc. nº 296/2002 e que se deu por assente, passou a decidir-se de mérito quanto à pretensão deduzida contra o R., BB, o qual foi absolvido do pedido, com subsequente enunciação da matéria de facto tida por assente e organização da pertinente base instrutória (b. i.), na parte remanescente e subsistente do objecto do processo, ou seja, do pedido formulado contra os RR. CC e mulher (Fls. 321 a 328vº). Desta decisão interpôs novo recurso a A., por si qualificado de agravo, o qual, todavia, com restrição à decretada absolvição do pedido, foi admitido como apelação, com subida, a final, e com efeito meramente devolutivo.

Prosseguindo os autos a sua tramitação, foi proferida sentença, em 08.04.08, em que se decidiu: A) – Julgando a acção parcialmente provada e procedente, o Tribunal condena os RR., CC e mulher, DD, a restituir à A., AA, a quantia de € 199,52, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde 02.11.05 até integral pagamento; B) – Julgando o incidente de litigância de má fé provado e procedente, o Tribunal condena a A., AA, na multa de cinco (5) UCs.

Da mesma interpôs apelação a A., com esta subindo, conjuntamente, a apelação anteriormente admitida.

Por acórdão de 05.02.09 (Fls. 402 a 430), a Relação de Guimarães decidiu: “…acorda-se em julgar procedente a apelação…,anulando-se o julgamento realizado e revogando-se a sentença proferida, o despacho saneador-sentença e o despacho de selecção da matéria de facto assente e de elaboração da base instrutória, devendo o M. mo Juiz «a quo» proceder à selecção da matéria de facto assente e elaborar a base instrutória da acção…dando regular prosseguimento à acção”.

Baixados, de novo, os autos, procedeu-se a nova e irreclamada enunciação da matéria de facto tida por assente e organização da pertinente b. i.

Prosseguindo os autos a sua tramitação, veio, a final, a ser proferida (em 08.11.10) sentença com o seguinte segmento decisório: “Em face do exposto, o Tribunal: A) – Julgando a acção parcialmente provada e procedente: a) – Absolve o R. BB do pedido formulado pela A., AA; b) – Condena os RR., CC e mulher, DD a restituir à A., AA, o que vier a ser liquidado com referência ao valor do imóvel em 23.05.89, deduzido dos montantes que os primeiros entregaram à segunda para que esta pudesse exercer o direito de preferência, bem como das contribuições fiscais, seguros e reparações várias que suportaram; B) – Julga o incidente de litigância de má fé não provado e improcedente.

Tendo apelado a A. e os 2º/s RR.

, a Relação de Guimarães, por acórdão de 10.04.12 (Fls. 733 a 739), julgou improcedente o recurso da A.

e procedente a apelação dos 2º/s RR.

, em consequência do que, revogando a sentença recorrida e na improcedência da acção, absolveu os RR.-apelantes dos pedidos, tendo, ainda, condenado a A., como litigante de má fé, na multa de 5 UCs e na indemnização de 5 UCs a favor dos 2º/s RR., a título de reembolso com despesas de honorários.

Daí a presente revista interposta pela A.

, visando a revogação do acórdão impugnado, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes conclusões: / 1ª – O acórdão recorrido revogou a sentença da 1ª instância, julgando procedente o recurso dos 2º/s RR. e improcedente o recurso da A., porque, apesar de declarada com trânsito em julgado a simulação de dois negócios de transmissão de um imóvel e de também estar reconhecido que por o prédio ter, depois, sido transmitido a terceiro de boa fé, não podia o mesmo reverter para o património da A., mas apenas o seu valor, não podia o tribunal condenar esses RR. no pagamento desse valor porque esse direito estava a ser exercido de forma abusiva, porque "as simulações estão de acordo com a vontade real" dos simuladores, de onde concluiu também que a A., ao formular esse pedido, litigava de má fé, que o conhecimento das “restantes questões de recorrer” (sic) “da autora” está prejudicado por essa decisão, e que o 1º R. foi correctamente absolvido; 2ª – A decisão é inaceitável, enfermando, aliás, de nulidades várias, desde logo por não demonstrar conhecer as anteriores decisões do Tribunal da Relação de Guimarães a que nem no relatório se faz a menor menção (autos a fls. 149, 171, 250, 265, 332, 347, 419), porque não foi demonstrado – nem isso legalmente relevaria, aliás – que o resultado final dos actos simulados fosse comum aos simuladores (a A. sustentava uma compra e venda, enquanto os 2º/s RR. sustentavam uma dação em cumprimento – e não se provou uma nem outra, mas apenas o propósito de operar a transmissão do imóvel), a A. não litigou de má fé (como, de resto, já a...

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