Acórdão nº 2024/05.2TBAGD.C1.C1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelTAVARES DE PAIVA
Data da Resolução22 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório AA , viúvo , em seu nome e em representação da sua filha menor, BB , intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária contra CC, DD , EE, FF e GG Ldª pedindo a condenação destes no pagamento da quantia de € 1.108.269,07 a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais , acrescidos dos juros à taxa legal contados desde a data da notificação do pedido de indemnização civil formulado no âmbito do processo crime nº 1248/98.1 JACBR, a correr termos no 1º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Águeda , que correu nas datas em que indicam em relação a cada um dos Réus, acrescido dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

Como fundamento do pedido, em síntese, refere que no dia 17 de Agosto de 1998, pelas 9 horas e 30 minutos, ocorreu uma explosão na casa do Autor, derivada da acumulação de gás na cave da mesma, tendo em consequência dessa explosão a mulher e mãe, respectivamente, dos Autores, sofrido queimaduras que vieram a provocar-lhe a morte, além de terem decorrido dessa explosão outros danos materiais.

Imputam a ocorrência dessa explosão à actuação negligente e inconsiderada dos Réus, entendendo que o Réu CC procedeu ilegalmente, por não se encontrar devidamente autorizado para o efeito pela Direcção Geral de Energia, e ainda assim ter procedido à instalação na cave da habitação de um ramal de instalação de gás, o que contraria a legislação em vigor e o projecto elaborado por técnico responsável e aprovado pela Câmara Municipal de Águeda, e que indevidamente tamponou com o recurso a uma rolha de cortiça; a Ré “GG, Lda.” porque aceitou proceder à instalação de gás apesar de não estar devidamente autorizada para o efeito pelo Ministério da Indústria e Energia tendo, para o efeito, enviado para casa do Autor os seu funcionário e também Réus DD e EE, e disponibilizado os seus instrumentos e ferramentas; o Réu FF, na qualidade de gerente da Ré “GG, Lda.”, que quis e deu instruções aos seus funcionários, e também Réus DD e EE, para procederem à instalação de gás como procederam; o Réu DD que, enquanto funcionário da “GG, Lda.”, procedeu ao acabamento da instalação de gás, aceitando, desde logo, efectuar tal trabalho sabendo que não havia no caso entidade instaladora, não tendo procedido ao adequado ensaio de estanquidade a que estava obrigado segundo a regulamentação e as leis em vigor, ou tendo realizado tal teste de forma deficiente; o Réu EE por ter, enquanto funcionário da “GG, Lda.”, executado com o Réu DD a instalação de gás à casa do Autor, aceitando efectuar tal trabalho sabendo que não havia no caso entidade instaladora, sem ter, todavia, procedido ao adequado ensaio de estanquidade a que estava obrigado segundo a regulamentação e as leis em vigor.

Contestaram os Réus FF, EE e GG, Lda, invocando a prescrição do direito dos Autores, nos termos do disposto no art.º 498.º, n.º 1 do C.C., impugnando os factos invocados e declinando a sua responsabilidade.

A este propósito, o Réu FF refere que nenhuma intervenção teve nos acontecimentos, e se a tivesse tido seria na qualidade de sócio gerente da sociedade GG, Lda.. Na altura do fornecimento de garrafas de gás ao Autor o Réu não estava no estabelecimento nem sequer na cidade de Águeda. O fornecimento e transporte de garrafas de gás até à casa do Autor não são adequados a produzir o evento e danos que lhe imputam. Mais adequado à verificação de tal evento será o facto de os Autores terem ido residir para aquela habitação sem a competente licença de habitabilidade.

O Réu EE refere que se limitou a transportar a garrafa de gás fornecida pela empresa GG, Lda desde as instalações desta até casa dos Autores, não colocando qualquer material ou ligado qualquer garrafa de gás uma vez que não é essa a sua função.

A Ré GG, Lda refere que apenas se limitou a fornecer aos Autores uma garrafa de gás de 45 Klg., não tendo qualquer intervenção na execução da instalação da rede de gás ou na sua conclusão, não podendo estabelecer-se qualquer nexo de causalidade adequada entre este fornecimento e o evento que produziu os danos invocados pelos Autores. Entende que o que foi adequado à verificação do evento foi o facto de o pai do Autor ter mandado fazer ao Réu CC uma derivação da canalização de gás para a cave quando não havia gás natural na Borralha e aquela canalização de gás e a sua derivação para a cave se destinavam a GPL, o que era proibido por lei, e de aquela derivação ter sido tamponada com uma rolha coberta com massa de reboco e ter omitido a toda a gente e principalmente a quem fez a ligação da garrafa de gás a existência de tal derivação para a cave sob a massa de reboco.

Impugnam todos estes Réus os danos invocados e os montantes peticionados.

O Réu DD contestou referindo que apenas transportou e entregou na casa dos Autores uma garrafa de gás de 45 Klg., impugnando todos os demais factos, e imputa também a responsabilidade pelo evento ao facto de os Autores terem ido morar para aquela habitação sem a respectiva licença de habitabilidade, assim como à derivação da canalização para a cave mandada fazer pelo pai do Autor, quando a canalização em causa se destinava a gás GPL, tendo omitido a quem fez a instalação da garrafa de gás a existência daquela derivação. Impugna ainda os danos invocados e os montantes peticionados.

Contestou o Réu CC, por impugnação, declinando a sua responsabilidade no acidente ocorrido. A tal propósito refere que lhe foi pedido que, além do que constava no projecto, deixasse um tubo para posterior ligação de uma caldeira mural de aquecimento, cujo local lhe foi mostrado, na cave, onde já estava feita a restante instalação, faltando apenas a do gás, tendo o Réu ficado convencido de que tais alterações eram do conhecimento do Engenheiro responsável. Apresentou uma proposta/orçamento de realização da obra de instalação do gás em duas fases distintas, consistindo a primeira apenas na colocação de tubos e respectivos pateres terminais e a segunda, a realizar posteriormente, quando estivessem concluídas as restantes obras na casa, nas ligações finais, com a colocação de válvulas, redutores e todo o restante material.

A primeira fase daquela obra foi realizada nos dias 6 e 7 de Fevereiro de 1996 em conjunto com o técnico de gás devidamente credenciado para o efeito, HH, não tendo realizado a segunda fase da obra. O Réu limitou-se a colocar os tubos e os pateres terminais, faltando as torneiras de corte aos aparelhos, os redutores, torneira de corte geral, as liras e as ligações finais aos aparelhos. A colocação desses tubos de cobre e respectivos pateres nunca poderia provocar, só por si, qualquer acidente e nomeadamente o referido nos autos nem tal seria previsível em circunstâncias normais. Além disso, nem sequer o tubo de abastecimento à referida caldeira de aquecimento central era o mesmo que abastecia os restantes aparelhos, tendo antes ficado independente da outra tubagem, só se juntando a ela através de um T soldado que ficou instalado junto à fonte abastecedora de gás numa cavidade aberta na parede, à vista, para posteriormente ser protegida com uma tampa ou caixa, dando assim acesso fácil ao mesmo, como é imposto por lei. A partir desse T é que seria depois feita a ligação à fonte abastecedora de gás. Seria por isso fácil verificar a situação e neutralizar o tubo que ia para a cave, caso se optasse pelo gás propano (GPL) e não pelo gás natural como estava previsto. O Réu e o técnico de gás referido fizeram um teste de resistência mecânica aos tubos colocados, colocaram tampas de plástico nas bocas dos pateres para protecção dos mesmos, como é normal fazer por forma a evitar que sejam danificados, e deram por concluída a 1ª fase da obra.

Refere ainda que a instalação de gás da casa do Autor não era para gás propano mas sim para gás natural como se demonstra pelo facto de terem sido colocados tubos de cobre com diâmetro de 22 mm quando, se estivesse em causa gás propano, bastariam tubos com diâmetro de apenas 12 ou 15 mm, registando que nas caves é proibido por lei o armazenamento ou uso de GPL mas não de Gás Natural, desde que estejam criadas determinadas condições de ventilação. Por isso, o ramal instalado na cave da habitação enquanto tal não contraria as normas legais dado tratar-se de uma instalação a ser alimentada por gás natural.

O projecto apresentado ao Réu não era para gás propano mas sim para gás natural, pelo que a colocação do aludido tubo, apesar de não constar do projecto, não contrariava a lei, estando tal procedimento previsto no art.º 16.º da Portaria nº 361/98, de 26 de Junho, sendo necessário no final da obra fazer a respectiva anotação e alteração ao projecto.

Refere ainda que o Autor foi habitar a casa sem a respectiva licença de habitabilidade, que não é possível emitir se não existir, entre outros documentos, um termo de responsabilidade referente à instalação de gás.

Os Autores replicaram, pronunciando-se sobre a prescrição invocada pelos Réus FF, EE e GG, Lda e impugnaram as versões de todos os Réus.

Vieram todos os Réus insurgir-se contra a apresentação do articulado de Réplica dos Autores, arguido a sua nulidade por considerarem que o mesmo é legalmente inadmissível.

Em despacho prévio ao despacho saneador foi em parte declarado não escrito o articulado de Réplica dos Autores.

Foi proferido despacho saneador em que se apreciou a excepção de prescrição invocada, que se julgou improcedente e seleccionou-se a matéria assente e controvertida com relevo à decisão.

Oportunamente, foi proferida decisão que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência: A) - absolveu o Réu FF do pedido; B) - condenou solidariamente os Réus CC, DD, EE e GG, Lda, a pagarem aos Autores a quantia global de €332,123 (trezentos e trinta e dois mil, mil, cento e vinte e três euros), correspondendo: - a quantia de €82.000 (oitenta e dois mil euros) à Autora BB, a título de compensação por danos morais, acrescida de juros de...

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