Acórdão nº 771/11.9TTVIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução08 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I Em 6 de Outubro de 2010, AA foi vítima de um acidente de trabalho, participado ao Tribunal de Trabalho de Viseu em 13 de Outubro de 2010.

Instaurado o processo respectivo, desencadeou o Ministério Público as diligências necessárias ao preenchimento dos objectivos da fase conciliatória, tendo-se realizado, em 22 de Fevereiro de 2012, exame médico em que, para além do mais, se considerou que o «sinistrado deverá manter terapia da fala, fisioterapia e terapia ocupacional por forma a manter alguma funcionalidade»; que sofre de uma «incapacidade permanente parcial de 96,48%» e que «as sequelas atrás descritas são causa de incapacidade permanente absoluta para toda e qualquer profissão» referindo ainda que o sinistrado necessita de «ajuda parcial de terceira pessoa para as actividades diárias».

Em 8 de Maio de 2012, realizou-se a tentativa de conciliação, em que as partes não se conciliaram, porque a Seguradora, BB – COMPANHIA DE SEGUROS, SA, embora tenha aceite «o acidente dos autos como de trabalho, o nexo de causalidade entre este e as lesões, bem como a retribuição indicada» entendeu que «o sinistrado se encontra curado com uma IPP de 60%, com IPATH, reservando para junta médica a necessidade de apoio de terceira pessoa e a terapia ocupacional», aceitando também o valor reclamado pelo sinistrado relativo a despesas de transportes e o «subsídio de elevada incapacidade na proporção de incapacidade que vier a ser fixada pela junta».

Veio então a Seguradora requerer a realização de «exame por junta médica de especialidade de neurocirurgia», nos termos do n.º 2 do artigo 138.º do Código de Processo de Trabalho, tendo apresentado os seguintes quesitos: «1.º Que sequelas afectam o sinistrado? 2.º Se essas lesões lhe dão I.P.A.T.H. porque usar o factor 1,5? 3.ª O sinistrado actualmente tem necessidade de prestação suplementar para ajuda parcial de 3.ª pessoa para as suas actividades? Se sim, qual o número de horas diárias? 4.º O sinistrado face às sequelas tem necessidade de terapia ocupacional?» Realizou-se a Junta Médica em que os peritos, por unanimidade, consideraram que o sinistrado «evidencia quadro deficitário dos membros direitos, de tipo espastico, com repercussão na marcha a que associa perturbação da linguagem de tipo expressivo com manutenção da compreensão»; responderam aos quesitos, em que se pronunciaram, para além do mais, no sentido de não atribuir o factor 1,5 «dado que a IPP atribuída é suficientemente elevada cuja majoração com o factor ultrapassa a unidade»; responderam ao quesito 3.º no sentido de que o sinistrado «tem necessidade de prestação suplementar para ajuda parcial de 3.ª pessoa para as suas actividades» pelas «horas necessárias para a realização da sua higiene pessoal» e que tem necessidade de terapia ocupacional.

A Junta fixou o coeficiente global de incapacidade do sinistrado em 0,79 com IPATH.

Seguidamente foi «proferida sentença que considerou o autor, por efeito do acidente dos autos, afectado de uma incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho – IPA – e condenou a ré a pagar ao autor as seguintes quantias: a) a quantia de € 40,00, relativa a despesas de transportes; b) uma pensão anual e vitalícia de € 8.550,40, com início em 24-11-2011, paga em 14 prestações mensais de igual montante cada, sendo os subsídios de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 da pensão anual pagos respectivamente nos meses de Junho e Novembro de cada ano, sendo tal pensão actualizável, pelo que em conformidade com o artigo 2º da Portaria nº 122/2012, de 03 de Maio (que fixou a percentagem de actualização das pensões de acidente de trabalho em 3,6%, com efeitos a 01-01-2012), tal pensão passa a ser de € 8.858,21 a partir de 01 de Janeiro de 2012; c) a quantia de € 5.030,64 a título de subsídio de elevada capacidade, ponderando o valor de IAS de 419,22 (12 x 419,22); d) a prestação suplementar para assistência a 3ª pessoa no montante mensal de € 461,14, devida a partir 24-11-2011 (dia seguinte ao da data da alta), anualmente actualizável na mesma percentagem em que o for o IAS. Mais foi a ré condenada a conceder ao autor terapia ocupacional, terapia da fala e fisioterapia».

Inconformada com esta decisão dela recorreu a Ré para o Tribunal da Relação de Coimbra, que veio a conhecer do recurso por acórdão de 5 de Dezembro de 2012, em que se decidiu considerar procedente a apelação e, em consequência, «altera-se a sentença da 1ª instância na parte relativa à prestação suplementar para assistência de terceira pessoa, condenando-se a ré nessa parte, em lugar do antes decidido, a pagar ao sinistrado a prestação suplementar para assistência a 3ª pessoa no montante mensal de € 115,28 (cento e quinze euros e vinte e oito cêntimos), devida a partir 24-11-2011 (dia seguinte ao da data da alta), anualmente actualizável na mesma percentagem em que o for o IAS».

Não se conformado com esta decisão dela interpôs o sinistrado, com o patrocínio do Ministério Público, o presente recurso de revista, tendo igualmente arguido nulidades de acórdão, nos termos do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, e formulado nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «Da arguição de nulidade do douto acórdão (subsidiariamente, esclarecimento/reforma do mesmo).

A - 1- A douta sentença da l.ª instância, ao condenar a Ré Seguradora a pagar ao sinistrado "a prestação suplementar para assistência de terceira pessoa no montante mensal de €:461,14, considerou que o sinistrado carecia do auxílio de terceira pessoa a tempo completo, isto é, de pelo menos 8H/dia.

2 - O douto acórdão, ao decidir que para os seus cuidados de higiene pessoal o A./Sinistrado carece do auxílio de terceira pessoa durante duas horas por dia, alterou ou aditou a matéria de facto considerada na 1.ª instância.

3- Porém, tal decisão de facto aparece desprendida de qualquer suporte probatório, ocorrendo a nulidade prevista no art.° 668.°, n.° 1, al. b), do CPCivil. Com efeito, 4 - A invocação da presunção judicial e das regras da experiência comum, não têm, no caso em análise, qualquer conteúdo real, sendo meras afirmações abstractas, o que equivale à ausência de qualquer suporte probatório para a alteração da decisão de facto.

5- Com efeito, o Tribunal da Relação só podia alterar a referida decisão de facto, decidindo o que decidiu, se, nessa matéria, os autos contivessem meios de prova que permitissem saber, perante as graves sequelas do sinistrado, quais os actos de que carece ajuda ao longo do dia (24,00H, parte diurna e nocturna), tempo médio da sua duração, e tempo total resultante da sua soma.

6 - Ora, os autos não continham elementos que permitissem ao Tribunal alterar a decisão da 1.ª instância, mormente, quanto ao referido segmento de facto, isto é, que o A./sinistrado apenas carecia da assistência de terceira pessoa durante 2h/dia.

7 - Perante a ausência das referidas informações e provas não podia o Tribunal da Relação dar como assente que a assistência de terceira pessoa se cingia a duas horas/dia.

8 - Tanto mais que a realidade do sinistrado, por força da incapacidade resultante do acidente é a seguinte: - O A./sinistrado levanta-se, em geral, cerca das 09,00H-09,30H; - Com a ajuda de terceira pessoa, senta-se na sanita, para satisfazer as suas necessidades fisiológicas, sempre com a supervisão de terceira pessoa; - Depois, essa terceira pessoa lava o A/sinistrado, faz-lhe a barba, penteia-o e após o que o veste e calça; - Nos actos referidos essa pessoa disponibiliza-lhe não menos de 2 horas/dia; - Ao longo do dia, é uma terceira pessoa que lava os dentes ao A./sinistrado, após as refeições, durando, cada acto, não menos de 15 minutos (4x 15m =60 m =1H) - Durante todas as refeições diárias, o A./sinistrado tem de ser ajudado por terceira pessoa, que lhe limpa boca com um guardanapo, por o A./Sinistrado não conseguir fazê-lo. As 4 refeições diárias (pequeno almoço, almoço, lanche e jantar) e necessidade de limpeza da boca, duram cerca de 3 horas (0,5+1+0,5+1); - Ao longo do dia (antes de se deitar), o A./sinistrado vai à casa de banho várias vezes, em número não inferior a 6, para satisfazer as suas necessidades fisiológicas, no que é ajudado por terceira pessoa que, após esse acto, essa pessoa o lava, por o A./sinistrado não conseguir fazê-lo, mesmo quando se limita a urinar, durando cada acto não menos de 10 minutos (6x10 m=lH); - Durante a noite, o A./sinistrado vai à casa de banho cerca de 6 vezes, para urinar, no que é ajudado por terceira pessoa, que o lava sempre, por o A./sinistrado não conseguir fazê-lo (6x10 m=lH); - Em cada acto de lavagem, a pessoa que ajuda o sinistrado gasta pelo menos 10 minutos; - O A./sinistrado, com a ajuda de terceira pessoa, por não conseguir fazê-lo sozinho, toma banho pelo menos quatro vezes por semana, gastando pelo menos uma hora em cada banho; - Frise-se que o A. sinistrado, por força da incapacidade resultante do acidente, não fala nem escreve, pelo que tem de ter junto a si, permanentemente, alguém que interprete a sua vontade, manifestada por simples gestos, no sentido de fazer as suas necessidades de higiene, fisiológicas ou alimentares.

- Como resulta do exposto, o A./sinistrado, ao longo do dia e da noite, tem de ter junto a si sempre alguém que, no momento certo, lhe disponibilize a imprescindível ajuda para os actos de higiene pessoal mais elementares, que, infelizmente, por si só não consegue efectivar.

- E na realização dos actos de higiene pessoal precisa o A. da ajuda de terceira pessoa em tempo cujo total ultrapassa 08,00H/dia.

Ocorre, pois, a nulidade prevista no art.º 668.°, n.° 1, al. c), que expressamente se invoca, devendo manter-se na íntegra a douta decisão da l.ª instância.

B- 9 - Caso assim se não entenda, isto é, caso se entenda que a matéria de facto fixada na 1.ª instância era insuficiente para a decisão de direito, então, ao abrigo do disposto no art.° 712.°, n.° 4, do CPCivil, deveria o...

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