Acórdão nº 07B2469 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução23 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA instaurou, no Tribunal Cível do Porto, uma acção pedindo a condenação da Companhia de Seguros Empresa-A , SA, no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros, como consequência de um acidente de viação de que foi vítima e que alega ter sido provocado por culpa exclusiva de BB, cuja responsabilidade lhe caberia por virtude de contrato de seguro celebrado entre a proprietária do veículo e a ré (cfr. doc. de fls. 60), assim discriminados: a) € 8.033,853, a título de danos patrimoniais emergentes; b) € 111.260,82, a título de danos patrimoniais decorrentes da IPP de que ficou a sofrer; c) € 37.409,842, a título de danos não patrimoniais; d) despesas médicas e medicamentosas, já feitas e futuras, sendo que € 23.942,4 se encontram liquidados, sendo o restante a liquidar em execução de sentença; e) juros de mora sobre todas as quantias pedidas, a contar desde a citação até ao pagamento integral.

Por sentença de 26 de Maio de 2006, de fls. 417, a acção foi julgada parcialmente procedente, sendo a ré condenada a pagar ao autor o seguinte: f) € 592,44, a título de danos patrimoniais emergentes; g) € 70.000,00, a título de danos patrimoniais decorrentes da IPP de que ficou a sofrer; h) € 7.500,00, a título de danos não patrimoniais; i) quantia correspondente à "necessidade de fazer exames clínicos com certa periodicidade ao joelho afectado, com vista a controlo médico" e despesas com medicamentos relacionadas com a mesma afecção, a liquidar; j) juros de mora relativos às diversas quantias referidas, a contar desde a citação até ao pagamento integral.

Desta sentença recorreram autor e ré, mas o recurso por esta interposto foi julgado deserto, por falta de alegações.

Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14 de Fevereiro de 2007, de fls. 485, foi concedido provimento parcial à apelação. A ré foi condenada a pagar € 87.945,77, acrescidos de juros, mantendo-se a sentença quanto ao mais.

Para chegar a este valor, a Relação corrigiu o montante atribuído aos danos patrimoniais emergentes, por considerar que a 1ª instância havia deduzido ao valor a que chegara, por duas vezes, a quantia de € 4.853,33 que o autor já tinha recebido da ré, modificando-o, consequentemente, para € 5.445,77; e alterou para € 12.500,00 a indemnização por danos não patrimoniais.

De novo recorreram autor e ré, agora para o Supremo Tribunal de Justiça. Os recursos foram admitidos como revista e com efeito meramente devolutivo, mas o recurso interposto pela ré veio novamente a ser julgado deserto, por falta de alegações (despacho de fls. 544).

  1. Nas alegações apresentadas, o autor formulou as seguintes conclusões: 1ª - Estando reconhecido pelo tribunal o direito à reparação integral do autor, decorrente das sequelas do acidente de viação, ele deve ser indemnizado das respectivas consequências na sua vida profissional, social, pessoal e afectiva; 2ª - Está provado que o autor tem sequela ou agravamento de sequela no joelho esquerdo (articulado superveniente), a qual deve ser considerada, pois está provado (com base em juízo pericial e juízo médico) que a mesma pode estar relacionada com a sequela do joelho direito; ora tendo em conta o princípio do nexo de causalidade, constante do artº 563º CC, com o entendimento da doutrina e jurisprudência sobre o seu alcance, este dano não deve considerar-se excluído do direito de reparação; 3ª - Quanto ao dano decorrente da sequela do joelho direito do autor, é entendimento do autor que a indemnização fixada deve ser reponderada, em atenção às razões aduzidas no ponto 6 da alegação; tendo assim em conta a natureza do mesmo, a sua incidência na profissão do autor, designadamente na progressão na carreira, e frustração de ganho, impõe-se a sua reavaliação, na medida em que não pode ficcionar-se (como decorre da douta sentença) que pelo facto de o autor não ter visto diminuído o seu salário (até à data do julgamento) aquele apenas se repercute num maior esforço de execução das tarefas; 4ª - A douta decisão recorrida atribuiu ao dano não patrimonial documentado na matéria provada um valor que não se julga compensatório.

    O autor não teve qualquer culpa no acidente e a sua condição social é modesta.

    Relevando a natureza, extensão e repercussão deste dano, em função da vida familiar, social e afectiva do autor, o mesmo deve ser valorado conforme se deixa discutido no ponto 7 da alegação.

    Tendo assim na devida conta a sua incidência, intensidade e durabilidade, em como a sua função compensatória, é conveniente a sua reavaliação.

    5ª - A douta decisão recorrida violou, entre o mais, por erro de interpretação e aplicação, conforme o sentido exposto, as normas decorrentes dos artºs 562, 563 e 496 do CC." Nas contra-alegações, a ré sustentou a manutenção do julgado. Afirmou, todavia, louvando-se no artigo 667º do Código de Processo Civil, que ocorreu um lapso manifesto, quer por parte do recorrente, quer quanto às instâncias, ao referirem que aquele ficou afectado com uma incapacidade parcial permanente de 20%, com um agravamento futuro de 5%: "a decisão da matéria de facto de fls. 413 e, bem assim, todos os exames periciais, mormente o de fls. 363, provam que, por causa do acidente de viação dos autos, o Autor ficou afectado de uma IPP de 10%, com um agravamento futuro de 5%". Daqui conclui que a decisão recorrida tem de sofrer "o ajustamento inevitável e correcção decorrente da efectiva e real incapacidade do Autor, que é de 10%, com um agravamento no futuro de 5% (...)".

  2. Cumpre antes do mais observar que não pode ser atendida a alegação, pela recorrida, de erro material, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 667º do Código de Processo Civil.

    Na verdade, o processo não revela, com a certeza que seria necessária a uma rectificação, que a sentença incorreu em "erro de escrita". Basta verificar que, no julgamento da matéria de facto, o tribunal afirmou (artigo 17º da base instrutória, a fls. 76, e resposta de fls. 411) e reafirmou (artigo 38º, a fls. 78, e resposta de fls. 412) que a incapacidade de que o autor ficou a sofrer era de 20%, com o agravamento futuro de 5% (artigo 18º, a fls. 76, e resposta a fls. 411); que a referência à incapacidade de 10%, definida pela prova pericial, aparece, não nas respostas à base instrutória, mas na fundamentação da matéria de facto; que, sendo a prova pericial livremente apreciada pelo julgador (artigo 389º do Código Civil), não estava o tribunal obrigado a dar como provada a incapacidade de 10%; que a sentença, que efectivamente tomou como assente a incapacidade de 20%, a aumentar em 5%, adoptou um critério final de equidade, o que tornaria impossível uma mera redução, se fosse líquido tratar-se de erro de escrita; que a autora, nas alegações na apelação, mostrou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
6 temas prácticos
6 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT