Acórdão nº 71/12.7YRPRT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2012
Magistrado Responsável | ANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA |
Data da Resolução | 18 de Dezembro de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – O Ministério Público instaurou acção com processo especial de revisão de sentença estrangeira contra AA, solteiro, com residência em Calle ...S/Nº , ... – ... – ..., pretendendo ver revista e confirmada, para que produza os seus efeitos em Portugal, a sentença proferida pelo Juzgado de 1ª instância e Instrucción número uno de Astorga, Espanha, no dia 07 de Julho de 2011, em que foi decretada a incapacidade do requerido, o que corresponde ou equivale à sua interdição.
O Exm.º Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto a quem o processo foi distribuído indeferiu liminarmente a petição, com fundamento em incompetência absoluta do tribunal, em razão da hierarquia.
Inconformado com a decisão, o Ministério Público entendeu submetê-la à conferência que proferiu acórdão confirmativo do despacho de indeferimento liminar e, persistindo irresignado, interpôs o presente recurso de revista, rematando a respectiva alegação, com as conclusões seguintes: 1. Não é aqui aplicável o Regulamento (CE) n.° 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003 uma vez que ele se aplica, tão-somente, à tutela de menores[1]; 2. Com efeito, a tutela de maiores, decretada em sentença estrangeira, tem que ser revista e confirmada através da acção de "Revisão de Sentença Estrangeira" para a qual é competente o Tribunal da Relação, conforme dispõem os artigos 1094°, n° 1, e 1095°, ambos do CPC; 3. É o que resulta do seu considerando 5º, ao dizer que para se "garantir a igualdade de tratamento de todas as crianças, o presente regulamento abrange todas as decisões em matéria de responsabilidade parental, incluindo as medidas de protecção da criança, independentemente da eventual conexão com um processo matrimonial"; 4. Por outro lado, no seu artigo 1º, n°s 1 e 2, consta que o Regulamento (CE) n° 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, é aplicável, independentemente da natureza do tribunal, às matérias civis relativas: i. Ao divórcio, à separação e à anulação do casamento; ii. À atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental.
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Acresce que as matérias referidas na alínea b) do n° 1 dizem, nomeadamente, respeito: 1. À tutela, à curatela e a outras instituições análogas.
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Ora, no artigo 2º, n° 4, do Regulamento, define-se "decisão" como sendo "qualquer decisão de divórcio, separação ou anulação do casamento, bem como qualquer decisão relativa à responsabilidade parental proferida por um tribunal de um Estado-Membro, independentemente da sua designação (...)"; 7. Por sua vez, entende-se por Responsabilidade Parental "o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou colectiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens da criança" [n.° 7] e por Titular da Responsabilidade Parental "qualquer pessoa que exerça a responsabilidade parental em relação a uma criança" [n.° 8]; 8. Acresce que o Regulamento (CE) n° 2201/2003, quanto à competência, está dividido em duas secções: a) Divórcio, separação e anulação do casamento [seus artigos 3º a 7°]', b) Responsabilidade parental [seus artigos 8º a 15°].
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Do exposto resulta que a tutela referida no artigo 1º n° 1, alínea b), e 2º alínea b), do Regulamento, é a tutela respeitante a crianças e não a decretada a maiores; 10. Ora, o facto de à tutela de maiores se aplicarem as disposições do Código Civil, que fixam para os menores os meios de suprir o poder parental através do instituto da tutela, e de essas regras se aplicarem, também, à interdição, não significa que, relativamente à interdição (maiores), se aplique, igualmente, o Regulamento (CE) n° 2201/2003 uma vez que este não permite efectuar essa interpretação extensiva [seu artigo 1º, n.° 2, alínea c)].
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Na verdade, da letra do Regulamento n.° 2201/2003, não existem quaisquer elementos que nos permitam concluir que se pretende a sua aplicação, também, à interdição; 12. Pelo contrário, dele resulta, inequivocamente, que só se aplica, independentemente da natureza do tribunal, às matérias civis relativas "à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental"; 13. É, deste modo, inaplicável à incapacidade decretada ao requerido - equivalente à nossa interdição - o Regulamento (CE) n.° 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, uma vez que este se aplica, tão-somente, à tutela e à curatela de crianças; 14. Deve, assim, conceder-se a revista e alterar-se o acórdão recorrido, ordenando-se a citação do requerido, nos termos e para os efeitos do artigo 1098°, do CPC, seguindo-se, após, o demais ritualismo legal.
Não foi oferecida contra-alegação e, colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação de facto Além dos passos processuais antes...
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