Acórdão nº 116/07.2TBMCN.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução11 de Dezembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 116/07.2TBMCN.P1.S1[1] (Rel. 92)[2] Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 – AA instaurou, em 31.01.07, na comarca de Marco de Canavezes, acção declarativa de condenação, com processo comum e sob a forma ordinária, contra “BB – Obras e Construções, S. A.

”, “CC – R..., EP” e “Município do Marco de Canavezes”, pedindo a condenação dos RR. a: / a) – Reconhecer que o A. é dono e legítimo possuidor dos prédios que identifica no art. 1º da p. i.; b) – Reconhecer que a invasão e intervenção “obra nova” feita pela 1ª R., também da responsabilidade de ambas as outras 2ª e 3ª RR., violam o direito de propriedade do A. sobre os mencionados prédios; c) – Abster-se, de futuro, de interferir com tal direito de propriedade do A.; e d) – Indemnizá-lo dos danos patrimoniais e morais (sic) que se vierem a liquidar em execução de sentença.

Fundamentando a respectiva pretensão, alegou, em resumo e essência: / --- É dono e legítimo possuidor dos prédios que identifica na p. i.; --- Em 16.01.07, a R. “BB” entrou, sem autorização e contra a sua vontade, com máquinas e empregados, na sua “Quinta” integrada por aqueles prédios, aí iniciando a remoção de terras e derrube de videiras e outras árvores; --- Foi-lhe, então, R...ido que tais obras lhe haviam sido adjudicadas pela “R...”, após acordo com a Câmara Municipal do Marco, representante do Município-R; --- A descrita actuação causou prejuízos ao A.

Na contE...

, A R. “BB” impugnou parte dos sobreditos factos e alegou ter executado as obras em cumprimento de um contrato de empreitada que havia celebrado com “R..., EP” e, após solicitação do A. no sentido da suspensão dos trabalhos, das ordens por aquela dadas para continuar a obra.

Por sua vez, a R. “R...” excepcionou a ilegitimidade (activa) do A. e alegou que os terrenos lhe foram disponibilizados pela Câmara Municipal do Marco de Canavezes ao abrigo de um protocolo celebrado, em 08.04.02, entre aquele Município e o, ora, A., nos termos do qual este autorizou tal intervenção, pelo que actuou de boa fé.

Finalmente, o R. “Município do Marco de Canavezes” excepcionou a incompetência material do tribunal e a ilegitimidade (activa) do A.. Simultaneamente, impugnou parte da relevante factualidade aduzida pelo A., concluindo que, quer a sua actuação, quer a dos restantes RR. resultou do protocolo celebrado, em 08.04.02, entre si e o A., o qual actua em abuso do respectivo direito.

Na réplica, veio o A., entre o mais, responder às deduzidas excepções, tendo, por outro lado, procedido à ampliação dos pedidos deduzidos, pela forma seguinte: a) – Caso o tribunal considere o protocolo denunciado antes das intervenções dos RR., seja o mesmo julgado irrelevante e nulo, devendo os RR. ser condenados a “repristinar” a situação, reconstruindo os prédios e porções urbanas e indemnizando, patrimonialmente (sic), o A., por todos os danos insusceptíveis de restauração natural; b) – Sejam os RR. condenados a pagar ao A. condigna reparação pelos graves e contínuos danos morais que lhe vêm causando e que se vierem a liquidar em execução de sentença; c) – Sejam os RR. condenados em multa e condigna indemnização a favor do A., também a liquidar em execução de sentença, por litigarem de má fé. Houve tréplicas da “BB” e do Município.

Foi, então, proferida decisão que julgou procedente a invocada excepção de incompetência, em razão da matéria, do tribunal, convidando, por outro lado, o A. a fazer intervir a sua mulher do lado activo da relação jurídica processual.

Então, DD requereu a sua intervenção nos autos, ao lado do A.

, o que foi admitido.

Foi, após, interposto recurso da decisão que julgou o tribunal incompetente, em razão da matéria, vindo o correspondente agravo a obter provimento.

No despacho saneador, julgou-se sanada a deduzida excepção da ilegitimidade do A., por via da intervenção, nos autos, da sua mulher; julgou-se improcedente a arguida nulidade da citação, admitiu-se a requerida ampliação do pedido e elaborou-se a base instrutória (b. i.).

Prosseguindo os autos a sua tramitação, veio, a final, a ser proferida (em 12.10.10) sentença que, julgando, parcialmente, procedente a acção: / a) – Condenou os RR. a reconhecer que o A. é dono e legítimo possuidor dos prédios melhor identificados no art. 1º da p. i.; b) – Condenou os RR. a reconhecer que a invasão e intervenção “obra nova” feita pela 1ª R. em razão de contrato de empreitada outorgado com a 2ª R. e consignação dos terrenos a afectar pelo 3º R.-Município viola o direito de propriedade do A. sobre os identificados prédios; c) – Condenou o R., Município do Marco de Canavezes, a satisfazer ao A.-marido a quantia, a liquidar em incidente ulterior, necessária à compensação dos danos não patrimoniais referidos sob as als. TT a AAA) da matéria assente; d) - Condenou o mesmo R.-Município a satisfazer ao A.-marido a quantia que se vier a apurar/fixar em incidente ulterior, correspondente ao valor mesmo das videiras e outras árvores da “Quinta ...” destruídas e, bem assim, ao valor das porções urbanas ou edificações ali existentes e destruídas, conforme als. CC) e TT) da matéria assente; e) – Absolveu os RR. dos demais pedidos, sendo-o, ainda, as 1ª e 2ª RR. das pretensões indemnizatórias contra si deduzidas.

Apelaram os AA.

e o R.-Município, tendo a Relação do Porto, por acórdão de 27.02.12 (Fls. 1221 a 1307), julgado improcedente o recurso deste último e, na parcial procedência do recurso daqueles, decidido “condenar, ainda, o R. Município de Marco de Canavezes a satisfazer ao A.-marido a quantia que se vier a apurar/liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor do terreno da Quinta ... ocupado com as obras por aquele realizadas”.

Daí a presente revista interposta pelo R.-Município, visando a revogação do acórdão impugnado, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes e numerosas conclusões: / 1ª – O recorrente manifesta expressa discordância quanto à linha propugnada pelo acórdão recorrido, desconsiderando a natureza do Protocolo referido e descrito expressamente no facto I); 2ª – O recorrente reconhece, naturalmente, a inexistência de direito real, a seu favor, que possa resultar do Protocolo; 3ª – Mas tal não poderá, de forma alguma, conduzir à conclusão propugnada pelo acórdão recorrido; 4ª – Nos efeitos obrigacionais do dito Protocolo não pode deixar de estar incluído o direito do recorrente Município de ocupar a parcela de terreno cedida, no mesmo Protocolo, pelos AA.; 5ª – Parcela aí também identificada de forma específica e concreta, 6ª – Para aí realizar as intervenções que o mesmo Protocolo prevê e estabelece: "construção dos arruamentos, rotundas, baías de estacionamento e passeios" – vide facto provado I), na cláusula 1ª do Protocolo; 7ª – Se assim não se entender, então o Protocolo não só deixa de ter sentido jurídico útil, como deixa mesmo de ter razão de ser na sua própria letra; 8ª – Nem sequer se entende quais serão então os outros efeitos obrigacionais que o acórdão recorrido aceita e reconhece que existem, se não for precisamente o direito de ocupar a parcela de terreno, directamente resultante da cedência de tal parcela expressa na cláusula 1ª do Protocolo; 9ª – As declarações de vontade ínsitas no Protocolo têm indiscutível natureza contratual e de tal contrato resulta, como seu efeito (ainda que meramente obrigacional), o direito do Município de ocupar a parcela de terreno cedida para aí realizar as intervenções previstas no mesmo Protocolo; 10ª – Assim sendo, releva decisivamente - ao contrário do propugnado pelo acórdão recorrido - o problema das consequências jurídicas da resolução operada pelos AA. (comunicação referida em K) da matéria assente); 11ª – Nem parece possível pretender resolver o problema em causa sem considerar a resolução operada pelos AA. e as respectivas consequências; 12ª – É afinal nessa resolução que os próprios AA. fizeram assentar o seu direito, essa resolução é verdadeiramente estruturante da acção e da própria condenação do recorrente Município; 13ª – Admitindo a qualificação de tal Protocolo como verdadeiro contrato, de conteúdo meramente obrigacional, 14ª – E admitindo também que a comunicação referida em K) nunca poderia, tecnicamente, constituir uma denúncia, 15ª – Também se discorda da qualificação daquela comunicação como comunicação de resolução contratual; 16ª – Uma comunicação que requer/considera nulo e sem qualquer efeito um determinado contrato (aquele contrato em concreto), como é aquela que consta do documento de fls. 220 e 220 verso dos autos, não tem qualquer aptidão para fazer cessar ou pôr termo ao mesmo, muito menos para prevalecer sobre o princípio do cumprimento pontual dos contratos, previsto e estabelecido no artigo 406° do Código Civil; 17ª – Mas, mesmo que tal comunicação constituísse declaração de resolução contratual (como considerou a sentença da primeira instância), ainda assim a consequência teria que ser necessariamente diversa da ali propugnada; 18ª – Teria que ser aquela que, afinal, a sentença da primeira instância considerou como a alternativa mais indicada no plano dos princípios (vd. fls. 21 da sentença), ou seja, a manutenção do contrato; 19ª – E isto porque, como muito bem ali também se diz, a resolução sem fundamento (sem qualquer fundamento, dir-se-á, no caso, em face do documento de fls. 220 e 220 verso dos autos) traduz um exercício ilícito do respectivo direito; 20ª – A não manutenção do contrato, como também conclui a sentença, "compensa o crime", uma vez que se consegue obter o resultado pretendido em violação da lei; 21ª – Ora, nenhuma razão existe, na perspectiva do recorrente, para concluir, de modo diverso, pela extinção do contrato; 22ª – Aliás, e como defende Pedro Romano Martinez ("Da Cessação do Contrato", 2ª Edição, Almedina, páginas 221 e seguintes), em caso de resolução ilícita ou injustificada, o autor da declaração deve responder pelo prejuízo causado à contraparte, sendo que o princípio geral da obrigação de indemnizar...

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