Acórdão nº 586/09.4TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra «BB, E.M. – Gestão de Bairros Municipais de Lisboa», alegando, em resumo útil, o seguinte: Em 8-2-2006, mediante a deliberação da Câmara Municipal de Lisboa, o A. foi eleito presidente do Conselho de Administração da R., por um mandato com termo em Dezembro de 2009. Na sequência da renúncia aos respectivos mandatos por parte de diversos vereadores daquela Câmara Municipal, no dia 15-7-2007 foram realizadas eleições intercalares, tendo sido eleito um novo executivo camarário, que tomou posse no dia 1-8-2007; contudo, o A. manteve-se em funções efectivas até ao dia 5-11-2007.

Ao abrigo do disposto no artº 26º, nº 3 do Estatuto do Gestor Público, o A. tem direito a uma indemnização pela cessação antecipada do seu mandato enquanto presidente do Conselho de Administração da R..

Pediu o A. a condenação da R. no pagamento da quantia de € 67.947,04, acrescida de juros de mora desde 29-11-2007 até efectivo pagamento.

Na contestação apresentada deduziu a R. a excepção da incompetência material do tribunal, e impugnou factos alegados.

O A. replicou e, na sequência, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – onde a acção havia sido primitivamente intentada como acção administrativa comum sob a forma de processo ordinário - declarou-se incompetente, em razão da matéria, para conhecer da acção e absolveu a R. da instância.

Tendo o processo sido remetido para as Varas Cíveis de Lisboa, ali seguiu os respectivos termos, vindo, a final, a ser proferida sentença que julgou a acção totalmente procedente e condenou a R. a pagar ao A. a quantia de € 67.947,04, acrescida de juros de mora à taxa legal prevista na Portaria nº 291/03, de 8-4, desde 29-11-2007 até integral pagamento.

Da sentença apelou a Ré, com sucesso, para o Tribunal da Relação de Lisboa que, julgando procedente a Apelação, revogou a sentença recorrida e, em consequência, julgou improcedente a acção e absolveu a Ré do pedido.

Inconformado, o Autor veio interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES A. O Recorrente foi nomeado em 08.02.2006 pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) para exercer as funções de Presidente do Conselho de Administração da BB E.M., pelo mandato com o termo no dia 31 de Dezembro de 2009, ou seja, o Recorrente tinha a efectiva expectativa de cumprir o seu mandato de Presidente do Conselho de Administração da Recorrida até ao fim do ano de 2009.

B. Os vereadores que constituíam o executivo camarário da CML decorrente das eleições autárquicas realizadas em 09/10/2005, renunciaram, na sua quase totalidade, aos respectivos mandatos, o que determinou a cessação de funções de todo o executivo autárquico e a respectiva exoneração em 9 de Maio de 2007.

C. Contrariamente ao defendido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no acórdão recorrido, o mandato dos membros do conselho de Administração da Recorrida não cessou, nem deveria ter cessado, aquando das referidas renúncias e exoneração. Ou seja, o mandato do Recorrente não cessou em virtude da eleição de novos titulares do executivo camarário, mas antes em virtude de impossibilidade superveniente verificada em consequência da nomeação de um novo conselho de administração da Recorrida, por deliberação n° 381/CM/2007, de 31.10 do executivo camarário resultante das eleições intercalares.

D. Efectivamente tiveram lugar a 15/07/2007 eleições intercalares para constituição de um novo executivo camarário em sequência da renúncia descrita supra, nos termos do disposto no artigo 59° da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro, na redacção introduzida pela Lei n° 5-A/2002, de 11 de Janeiro. No entanto, o referido executivo camarário foi eleito apenas e tão só para completar o mandato já em curso, conforme dispõe expressamente o n° 5 do artigo 59° da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro, na redacção introduzida pela Lei n° 5-A/2002, de 11 de Janeiro (cuja aplicabilidade ao presente caso concreto até foi expressamente invocada pela própria Recorrida), onde se pode ler “A câmara municipal que for eleita completa o mandato anterior".

E. A mencionada disposição legal é clara ao referir que, aquando da eleição de novos membros dos órgãos camarários em virtude de eleições intercalares, não se inicia um novo mandato camarário, mas apenas se conclui o anterior mandato até ao seu termo.

F. Conforme expressamente alegado pela Recorrida no artigo 51° da sua contestação "(...) as eleições realizadas em 15/07/2007 se possam considerar realizadas no âmbito do mesmo mandato autárquico".

G. Acresce que, perante a questão acerca de quais as consequências, para o mandato dos titulares dos membros dos órgãos sociais da BB, designadamente quanto à sua continuidade ou não, face à renúncia ao exercício de funções por parte dos diversos membros da CML em efectividade de funções, esclareceu CC que " nos termos do artigo 75° n°s 1 e 2 da lei n° 169/99, de 18 de Setembro, (alterada pela lei n° 5-A/2002, de 11 de Janeiro), "os membros dos órgãos das autarquias locais são titulares de um único mandato", que "é de quatro anos"; "Especificamente, no que diz respeito à câmara municipal, o art. 59.°/2 da Lei n° 169/99 prevê que, esgotada em definitivo a possibilidade de funcionamento da mesma nos termos legais, (vg, por renúncia do mandato pelos respectivos titulares), o governador civil deverá proceder à "marcação do dia de realização das eleições intercalares" - sendo que "a câmara municipal que for eleita [apenas] completa o mandato anterior" conforme expressamente disposto no art. 59.°/5 da Lei n.° 169/99.

H. É por demais evidente que a renúncia ao exercício de funções por parte dos diversos membros da Câmara Municipal de Lisboa em efectividade de funções, bem como dos cidadãos que lhes seguiam nas listas a que pertenciam, e a entrada desse órgão camarário em estado de gestão corrente, "não tem quaisquer consequências sobre a continuidade (e a duração) do mandato dos titulares dos membros dos órgãos sociais da Consulente [BB], nem sequer tais factos afectam os poderes de gestão atribuídos por lei ou por estatuto a esses órgãos sociais, que permanecem como antes".

I. Entendeu bem o Tribunal de 1ª Instância, ao estabelecer que, não obstante as referidas eleições intercalares, o mandato do Recorrente não cessou em Maio de 2007, apenas cessando no seu termo, ou seja, a 31 de Dezembro de 2009.

J. Mesmo que assim não se entendesse - o que se considera por mera cautela de patrocínio, sem conceder - sempre teria que existir uma verdadeira paridade entre o executivo camarário e os membros dos órgãos sociais da Recorrida, ou seja, o executivo municipal eleito em 15/07/2007 seria eleito pelo período de 4 (quatro) anos e não apenas até ao final do mandato do anterior executivo, isto é, Dezembro de 2009, conforme ocorreu efectivamente neste caso concreto.

K. Salvo melhor opinião, não nos parece aceitável que o Tribunal da Relação de Lisboa entenda que, por um lado os novos titulares dos órgãos autárquicos apenas completam o mandato anterior (ou seja, não iniciam um novo mandato mas são apenas chamados a substituir os anteriores titulares, até que seja concluído o mandato), para logo em seguida dizer que, "para os efeitos do artº. 5 dos Estatutos da R.", tal situação não se verifica uma vez que são "diferentes titulares".

L. É evidente que os novos titulares são "diferentes titulares", caso contrário não seriam "novos". No entanto, a questão sub judice não se prende com a identificação sobre se os novos titulares dos órgãos autárquicos são diferentes titulares ou não, mas apenas e tão só em saber se os mesmos iniciam um novo mandato (a partir das eleições intercalares) ou se completa o mesmo mandato que já se tinha iniciado e que se mantém inalterado qualquer que seja o concreto titular do órgão.

M. Quanto à questão acima referida - i.e., quanto à questão verdadeiramente relevante para efeitos dos presentes autos - não existem quaisquer dúvidas (conforme, aliás, é reconhecido pelo acórdão recorrido) que, nos termos do disposto no n° 5 do artigo 59° da Lei n° 169/99, de 18 de Setembro, na redacção introduzida pela Lei n° 5-A/2002, de 11 de Janeiro, "A câmara municipal que for eleita completa o mandato anterior", ou seja, os membros dos órgãos das autarquias locais são titulares de um único mandato que é de quarto anos, mesmo que tal mandato, por qualquer motivo, venha a ser titulado durante os referidos quatro anos por diferentes pessoas.

N. E não se diga - conforme é referido no acórdão recorrido - que o artigo 5 dos Estatutos da Recorrida não faz a correspondência entre o mandato autárquico e o mandato dos membros dos seus órgãos sociais por referir "é coincidente com o dos titulares dos órgãos autárquicos". Com efeito, não podem existir dúvidas que ao referir "o dos titulares dos órgãos autárquicos", a disposição estatutária em causa está a referir-se ao "mandato", ou seja, a coincidência a que se refere o artigo 5 dos Estatutos da Recorrida não é a uma coincidência de titulares mas sim a uma coincidência de mandatos.

O. Nestes termos, resulta evidente que o Tribunal da Relação de Lisboa julgou incorrectamente o presente processo, porquanto não considerou que o artigo 5 dos Estatutos da Recorrida se referissem ao mandato dos órgãos autárquicos mas antes ao período de exercício desse mesmo mandato por determinados titulares.

P. O argumento da "confiança" utilizado pelo Tribunal a quo na sua sentença (também já utilizado anteriormente pela Recorrida para defender a sua tese nos presentes autos) não pode ser procedente, uma vez que no caso de substituição dos titulares dos órgãos autárquicos por via de eleições intercalares, conforme ocorreu no caso dos presentes autos, até os próprios membros da Assembleia...

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