Acórdão nº 08A966 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelALVES VELHO
Data da Resolução06 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - "V....., L....., Limitada" intentou acção declarativa contra "R..... - S..... C..... de V..... e A...., Ldª" e "Banco C.... P...., S.A.", pedindo a condenação solidária dos RR. no pagamento da quantia de Esc. 4 800 000$00, sendo a 1ª R. ainda condenada a pagar ao A. a quantia de Esc. 18 734 725$00, acrescida de juros desde a citação até integral pagamento, bem como a devolver à A. toda a documentação, sinalização e literatura sobre os produtos de marca "V...." em seu poder, e juros legais desde a citação.

Alegou, para tanto, e em síntese, que a A. e a 1.ª R. celebraram um contrato de fornecimento de óleos, nos termos do qual a primeira se obrigou a adquirir à segunda 50.000 litros de produtos "V.....", durante os cinco anos de duração do contrato, na quantidade anual mínima de 10.000 litros, e que, por a 1ª R. não ter adquirido as quantidades a que se obrigou, resolveu o contrato. Do incumprimento resultou para a A. um prejuízo de esc. 16 334 725$00, correspondente ao valor dos produtos que a R. projectara vender e não vendeu, sendo que foi ainda estabelecida uma cláusula penal aplicável à 1ª R. no montante de esc. 1.200.000$00 por cada ano ou fracção em falta do contrato, caso este fosse resolvido pela A. por incumprimento contratual da 2ª R., faltando à data de resolução um ano e dois meses para o fim do contrato, sendo de esc. 2.400.000$00 o valor da cláusula penal a pagar-lhe A 2ª Ré emitiu a favor da A. uma garantia bancária relativa ao pagamento de quaisquer quantias devidas à A. emergentes do contrato celebrado com a 1ª R., reduzida a 4 800 000$00 à data da resolução.

As RR. contestaram.

A primeira alegou impossibilidade de cumprimento do contrato por lhe ter sido retirada uma concessão de comercialização de veículos.

A segunda, invocando a natureza de fiança da garantia prestada, já reduzida a esc. 1 500 000$00 e a falta de fundamento para a resolução do contrato, que deveria, antes, ser prorrogado.

A A. ampliou o pedido para esc. 6.000.000$00, relativamente à Ré "B...C...P...., SA".

Após completa tramitação da acção, na sentença final julgou-se existir ineptidão da petição inicial por cumulação de pedidos e causas de pedir substancialmente incompatíveis, foi declarado nulo todo o processo e as RR. absolvidas da instância.

Mediante recurso da A., a Relação julgou apta a petição inicial e, conhecendo do mérito da causa, julgou a acção parcialmente procedente, condenando solidariamente as RR. a pagarem à A. o montante de € 11.971,15 (equivalentes a esc. 2 400 000$00), acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, "sendo o B.... C... P...., S.A. até ao montante de € 29.927,87, absolvendo-se a Apelada R.... do restante peticionado".

A Ré "B.... C.... P....., S.A." interpõe agora recurso de revista para pedir a reposição da sentença da 1ª Instância e, subsidiariamente, a retirada da sua condenação até ao montante de € 29,927,87, ficando apenas a condenação solidária com a 1ª Ré.

Para tanto, terminou a sua alegação com as "conclusões" que se transcrevem: "1- O douto acórdão viola quer a lei substantiva, quer a lei processual civil.

2- A nulidade gerada por ineptidão da petição inicial por cumulação de causas de pedir e de pedidos substancialmente incompatíveis, contrariamente ao entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa pode e deve ser conhecida pelo Juiz na sentença final e não apenas até ao despacho saneador ou até à sentença se àquele não tiver havido lugar.

3- De contrário, o juiz seria obrigado a proferir uma decisão sobre pedidos que não estão em condições formais e materiais de serem decididos.

4- Tal interpretação, para além de ser restritiva dos poderes de apreciação do Tribunal, o que só por si viola os princípios da justiça material e da justa composição da lide, contraria a letra e o espírito do artigo 660º n.º 1 do CPC.

5- O artigo 206º do CPC deve ser interpretado e aplicado de modo integrado com o restante normativo processual, donde se o legislador quisesse reduzir o poder de apreciação das nulidades processuais pelo Tribunal a quo a dois únicos momentos processuais teria introduzido na redacção e na epígrafe do artigo 206º do CPC a preposição "até", à semelhança do critério utilizado no artigo 204º do CPC.

6- A confirmar o entendimento que o juíz pode até à sentença conhecer da nulidade resultante da ineptidão da petição inicial, existe o artigo 660º n.º 1 do CPC que expressa que "a sentença conhece em primeiro lugar das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica." 7- Conforme disposto no artigo 493º do CPC, determinam a absolvição da instância as excepções dilatórias, que são aquelas que obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa.

8- O artigo 494º do CPC, embora meramente indicativo, elabora uma lista de excepções dilatórias, entre elas a prevista no artigo 494º alínea b): nulidade de todo o processo.

9- Nos termos do artigo 193º n.º 1 do CPC a ineptidão da petição inicial implica a nulidade de todo o processo.

10- Pelo exposto, o tribunal a quo por força da aplicação do artigo 660º n.º 1 do CPC tem oportunidade de conhecer da ineptidão inicial até à sentença, mesmo que nos autos tenha havido despacho saneador e no mesmo não tenha sido detectado qualquer vício 11-0 douto acórdão ao ter decidido que tendo havido despacho saneador o tribunal a quo esgotou o seu poder de cognição da nulidade por cumulação de causas de pedir e de pedidos substancialmente incompatíveis, negando a possibilidade de em sentença a conhecer, violou o disposto no artigo 660º n.º 1 do CPC.

12- O Tribunal a quo considerou que a causa de pedir do primeiro pedido, o de funcionamento da cláusula penal, foi a resolução do contrato e quanto ao segundo pedido, indemnização pelos prejuízos sofridos pelo não cumprimento do contrato, porque este pressupõe que não tenha havido resolução, não houve causa de pedir.

13-Sendo a causa de pedir o facto jurídico de onde emerge o direito do autor e este fundamenta a sua pretensão, não há dúvidas que a A. deduziu duas causas de pedir diferentes e incompatíveis entre si: por um lado a resolução do contrato e por outro os lucros emergentes que teria auferido se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido.

14-A causa de pedir de onde emerge um dos pedido é precisamente contrária e inconciliável com a causa de pedir do outro pedido, pois a primeira implica a...

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