Acórdão nº 5223/05.3TBOER.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOAQUIM PIÇARA
Data da Resolução15 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – AA e BB intentaram, no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Oeiras, acção declarativa, sob a forma ordinária, contra CC, DD e a sociedade S...M...dos A... – Sociedade de Mediação Imobiliária Lda.

, alegando, em síntese, o seguinte: As Rés LL e DD são respectivamente dona e usufrutuária do prédio urbano sito na Rua ..., denominado Casa A, em Paços de Arcos, que é uma moradia geminada com a denominada Casa B, sita no nº ... da referida artéria.

Em finais de Março de 2001, manifestaram interesse em adquirir tal prédio, tendo todo processo negocial com vista à sua aquisição sido conduzido pela 3ª Ré, em nome daquelas.

Na altura em que visitaram o referido prédio, a denominada Casa B encontrava-se em obras de construção e remodelação e grande parte do terreno da Casa A estava a ser usado como estaleiro das obras da Casa B.

Não conseguiram, em virtude das obras, bem como de diversas construções existentes no terreno, através do exame visual, ter a noção exacta da área do prédio que pretendiam adquirir: A 3ª Ré forneceu-lhes plantas da Casa B, informando que eram idênticas e entregou-lhes cópia das certidões da Conservatória do Registo Predial e da caderneta predial, constando da primeira que a Casa A se compunha de uma casa com área coberta de 116 m2 e um logradouro com área descoberta de 485 m2.

Foi com base nestas informações sobre a área coberta e descoberta que apresentaram a sua proposta de aquisição do imóvel, sendo ambas relevantes e determinantes para a decisão de aquisição e proposta de preço.

Em 9 de Maio de 2001 assinaram com as Rés LL e DD contrato-promessa de compra e venda da denominada Casa A, tendo pago a quantia de 13.600.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento, ficando acordado que o contrato definitivo devia ser celebrado até 9 de Agosto de 2002.

Após a assinatura do contrato foram contactados pelo proprietário da casa B no sentido de comparticiparem em 50% das despesas com a reparação do muro existente entre a casa A e a Casa B e, convictos de que se tratava de um muro divisório das duas casa, acederam e enviaram a quantia pedida de 3 851,72 €. Subsequentemente deram início às diligências necessárias ao licenciamento e execução das obras de renovação e reconstrução do imóvel, entre as quais um levantamento topográfico e, perante este, constataram que o prédio tinha apenas a área de 501,1 m2, faltando 97,9 m2 de área descoberta.

Com tais fundamentos, pediram a anulação do contrato-promessa de compra e venda celebrado, pelo erro em que foram induzidos pelas Rés, e a condenação solidária destas a pagar-lhes a importância de 77 932,30 €, acrescida de juros vencidos, no montante de 17 849,75 €, e vincendos até integral pagamento.

As Rés LL e DD ofereceram contestação conjunta, arguindo a sua ilegitimidade e contrapondo versão factual diferente da delineada pelos Autores, pugnando, desse modo, pela sua absolvição da instância ou improcedência da acção e condenação destes em multa e indemnização a seu favor, por litigância de má fé.

Por sua vez, a Ré mediadora contestou autonomamente, apresentando versão factual similar à das outras Rés e refutando também que os Autores tenham sido induzidos em erro, pugnando, assim, pela improcedência da acção.

Os Autores responderam à excepção arguida pelas Rés LL e DD, batendo-se pela sua inverificação.

Foi proferido saneador a refutar a pretensa ilegitimidade dessas Rés e condensou-se a matéria de facto, com selecção da já assente e organização da base instrutória.

O processo seguiu seus termos e, a final, foi proferida sentença a julgar a acção totalmente improcedente, com a absolvição das Rés do pedido, e a não reconhecer a invocada litigância de má fé.

Os Autores apelaram, mas a Relação de Lisboa confirmou essa decisão e, de novo inconformados, interpuseram recurso de revista, rematando a sua alegação, com as seguintes conclusões: 1. Encontra-se demonstrada a essencialidade para os declarantes, ora Recorrentes, do elemento sobre o qual recaiu o erro; 2. A lei não exige o conhecimento ou a cognoscibilidade do erro por parte do declaratário, bastando-se com o conhecimento ou cognoscibilidade da essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro; 3. As Recorridas declaratárias deviam saber - intui-se facilmente por critérios de normalidade social objectivos - que perante as repetidas solicitações e prestações de informação relacionadas com a área ou dimensão do imóvel que este era um elemento essencial da definição identitária do imóvel para os declarantes, ora Recorrentes; 4. Em face de uma tão significativa diferença de área de um prédio destinado à habitação, que se traduz em cerca de menos 97 m2 de área descoberta do que aquela que havia sido informada aos declarantes, ora Recorrentes, representando uma percentagem de cerca de 20% menor relativamente à área da realidade espacial definida no contrato-promessa, não podiam as Recorridas declaratárias deixar de reconhecer o carácter essencial para os declarantes da percepção da verdadeira área do terreno; 5. Os Recorrentes lograram provar (ponto 30 dos factos considerados provados) que a proposta contratual apresentada às Recorridas se fundou na área do prédio e que este factor influiu no próprio preço proposto (enquanto elemento essencial do contrato promessa e do contrato prometido - cfr. artigos 410° n° 1 e 874°, ambos do Código Civil); 6. As Recorridas, não obstante poderem ignorar a discrepância de áreas (o elemento em que assenta o erro), conheciam ou não podiam ignorar a essencialidade deste elemento para os Recorrentes na emissão da respectiva declaração negocial, até pela diferença de área verificada; 7. A 3ª R. actuou como representante das 1ª e 2ª RR. pelo que os actos jurídicos praticados por aquela em nome destas produzem os seus efeitos na esfera jurídica das representadas; 8. De modo que, o acto de conhecimento ou cognoscibilidade da essencialidade do elemento sobre que recaiu o erro pela 3ª R., produz os seus efeitos na esfera jurídica das 1ª e 2ª RR. suas representadas; 9. Salvo melhor opinião, não subsistem dúvidas de que se está perante um erro sobre as qualidades do objecto (cfr. artigo 251° do Código Civil), cuja essencialidade para os declarantes (ora Recorrentes) as declaratárias (Recorridas) não podiam ignorar.

  1. Este erro torna o contrato-promessa de compra e venda celebrado retroactivamente anulável, devendo ser restituído aos Recorrentes pelas Recorridas o sinal por aqueles prestado ao abrigo do aludido contrato, no valor de EUR 67.836,51 (equivalente a ESC 13.600.000$00) bem como as despesas que os ora Recorrentes suportaram com o levantamento topográfico que levou à rectificação da área do imóvel, e com a comparticipação na construção do muro divisório do imóvel prometido vender, no valor, respectivamente, de € 6.234,97 e € 3.851,72.

  2. Em qualquer caso, sem conceder, ainda que não se mostrassem preenchidos os requisitos do erro sobre o objecto, sempre os Recorrentes teriam direito à devolução por parte das 1ª e 2ª RR., ora Recorridas, dos valores que despenderam com o levantamento topográfico que levou à rectificação da área do imóvel e na construção do aludido muro, por aplicação subsidiária do instituto do enriquecimento sem causa (cfr. artigo 473° do Código Civil); 12.

    O acórdão recorrido fez uma incorrecta interpretação do artigo 247° do Código Civil (aplicável ex vi artigo 251° do Código Civil), sobretudo face à factualidade dada como provada e que não foi atendida, como devia, pelo julgador.

    Pedem, em consequência, a revogação do acórdão recorrido e a subsequente condenação das Rés no pedido.

    Foram oferecidas contra-alegações que, posteriormente, vieram a ser desentranhadas.

    Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

    II - Fundamentação de facto A factualidade dada como provada, nas instâncias, é a seguinte: 1. A 1ª R. CC é a proprietária do prédio urbano, sito na Rua ..., denominado “Casa A”, freguesia de Paço de Arcos, concelho de Oeiras, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob o nº 03148, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o nº 1387.

  3. A 2ª R. DD é a usufrutuária de prédio indicado no número anterior.

  4. A 3ª R. “S...M...dos A... – Sociedade de Mediação Imobiliária, Ldª” é uma empresa de mediação imobiliária.

  5. Todo o processo negocial com vista à aquisição pelos AA. do imóvel...

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