Acórdão nº 1453/06.9TJVNF.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelNUNO CAMEIRA
Data da Resolução25 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório AA, S.A.

, propôs uma acção ordinária contra BB – …, Ldª, pedindo que se declarasse anulado o contrato que celebrou com a ré na parte respeitante ao fornecimento de treze peças de tecido de algodão e a sua condenação a pagar-lhe € 14.248,47 a título de danos patrimoniais e € 20.000 de danos não patrimoniais, com juros de mora vincendos calculados à taxa legal.

Alegou, em resumo, que celebrou com a ré um contrato de compra e venda comercial, tendo encomendado, sob amostra por ela apresentada, tecidos de diferentes cores destinados à confecção de fatos de banho, sendo que treze peças de tecido vermelho fornecidas pela ré tingiam o produto acabado com a descoloração do seu tinto, o que lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais.

A ré contestou.

Por excepção, invocou a pendência de oposição a uma execução entre as mesmas partes na qual se discutem, precisamente, os factos aqui em causa; por impugnação, negou parte dos factos alegados na petição inicial, sustentando que a autora não lhe deu conhecimento, ao longo de todo o processo de encomenda, fabrico e entrega do tecido, da finalidade a que o destinava, pelo que desconhecia que seria utilizado na confecção de calções de banho.

Na réplica, a autora respondeu à excepção dilatória deduzida pela ré.

No despacho saneador, com fundamento na suspensão da oposição à execução invocada pela ré até à decisão da presente acção, considerou-se não verificada a excepção dilatória arguida.

No decurso do julgamento a ré invocou ainda a caducidade do direito de acção da autora, por considerar ultrapassado o prazo de um ano previsto no artigo 287.º do Código Civil.

Realizado o julgamento e estabelecidos os factos foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, anulando-se o contrato celebrado entre a autora e a ré relativamente às treze peças de tecido de algodão, poliamida, na cor vermelha, e condenando-se a ré a pagar à autora 14.248,47 € a título de danos patrimoniais e 10.000,00 € de danos não patrimoniais, bem como juros de mora desde a citação.

A ré suscitou a omissão de pronúncia quanto à alegada caducidade do direito de acção, mas por despacho de fls 433-434 a arguição foi julgada intempestiva.

Depois apelou da sentença e agravou deste despacho, mas sem êxito, pois a Relação do Porto, não obstante ter introduzido alterações na redacção da matéria de facto assente - respostas aos pontos 2, 3, 25 e 27 a 29 da base instrutória - julgou improcedentes ambos os recursos, confirmando por remissão as decisões recorridas.

Daí a presente revista, em que a ré defende a revogação do acórdão recorrido, concluindo, resumidamente e de útil, o seguinte: 1.ª) O tribunal deveria ter conhecido da excepção peremptória de caducidade do direito de acção, dado que à ré somente era exigido que a invocasse (artigos 303.º e 333.º do Código Civil), o que fez, não se mostrando tal invocação intempestiva; 2.ª) Tratando-se de um contrato de compra e venda comercial sobre amostra, e não tendo a autora demonstrado a desconformidade entre a amostra que serviu de base à relação comercial e a mercadoria entregue, deve concluir-se que a ré entregou mercadoria com as exactas qualidades e características constantes da referida amostra; 3.ª) A autora não apresentou, no prazo de oito dias após a entrega, reclamação relativa à não conformidade da mercadoria com a amostra; 4.ª) Não se provou que a ré soubesse ou que o vendedor lhe tenha dito o destino a dar pela autora à encomenda; 5.ª) Dos 1600 calções vendidos contendo o tecido tingido a vermelho, apenas 720 apresentavam cores combinadas e, como tal, a potencialidade de tingir, somente sobre estes sendo de admitir reclamação; 6.ª) Dos 1100 calções vendidos à Sacoor somente 39 foram reclamados e dos 500 vendidos à Wreck somente 7 foram devolvidos, pelo que o prejuízo real sofrido pelos clientes da autora foi de € 1864, e não de € 13.887,90; não se justifica, por isso, que deva ser a ré a suportar as consequências da inabilidade negocial da recorrida; 7.ª) No âmbito do quadro contratual em que decorreram os factos em causa, a quantia indemnizatória a atribuir à autora a título de danos morais não poderá ultrapassar o valor da indemnização devida pelos prejuízos sofridos, no montante de € 1864; mas perante a alteração da matéria de facto decidida pela Relação, que reduziu a factualidade provada relativa aos danos não patrimoniais, deveria ter-se procedido à concomitante redução do valor da indemnização a atribuir à autora.

A recorrida contra alegou, defendendo a inadmissibilidade da reapreciação da questão da caducidade do direito de acção suscitada no recurso de agravo e a improcedência do recurso.

Tudo visto, cumpre decidir.

II.

Fundamentação

  1. Matéria de facto A Relação considerou provados os seguintes factos: 1.

    A Autora é uma sociedade comercial que, no âmbito do seu objecto comercial, se dedica, entre outras, à actividade de confecção de artigos de pronto-a-vestir.

    1. A Ré é uma sociedade comercial que se dedica pelo menos à venda de tecidos prontos para confecção.

    2. No exercício das respectivas actividades, Autora e Ré iniciaram as suas relações comerciais há já vários anos.

    3. Sendo que, durante o ano de 2002, a Ré forneceu e vendeu à Autora os tecidos.

    4. Em 7/4/03 a Ré procedeu à entrega do tecido encomendado, o que fez nos termos da guia de saída.

    5. Conforme se poderá verificar pelo teor da referida guia, a Ré vendeu e entregou à Autora, entre outras, 13 peças do tecido algodão, poliamida, na cor vermelha, totalizando 981 metros.

    6. Em 9/4/03 a Ré emitiu e remeteu à Autora a respectiva factura, com o n.° …, a qual descriminava como importância a pagar pelo referido tecido vermelho a importância de 4.512,60 €.

    7. Em Julho de 2003, atendendo à conta corrente que a Autora mantinha com a Ré, de todos os tecidos por aquela vendidos, apenas faltava liquidar o valor global 4.045,53 €.

    8. Valor este titulado por dois cheques pré-datados emitidos pela Autora a favor da Ré, um no valor de 3.000 € e outro no valor de 1.045,53 €, ambos emitidos sobre o Banco Espírito Santo, respectivamente com os n.ºs … e …, a vencer-se o primeiro no dia 20/7/03 e o segundo em 10/8/03.

    9. Em 28/7/03, a Ré, solicita à Autora que a informe das quantidades das peças reclamadas e quais os montantes envolvidos.

    10. Três dias depois, isto é em 1/8/03, não tendo a Autora ainda respondido a tal telefax, a Ré reitera tal solicitação à Autora, ameaçando-a, desta feita, que, caso não respondesse até ao dia seguinte, entenderiam que afinal não tinham fundamento a denúncia dos defeitos efectuada pela Ré.

    11. A Ré intentou uma acção executiva contra a Autora, apresentando como títulos executivos os cheques pré-datados referidos.

    12. Execução esta que corre os seus termos sob o n.º 527/04.5TJVNF pelo 4.° Juízo Cível deste Tribunal [de Vila Nova de Famalicão].

    13. E na qual a Autora prestou a respectiva caução com vista a obter a suspensão da execução.

    14. Em 2002, a Ré forneceu à Autora tecidos destinados à colecção de calções de banho das marcas Sacoor e Wreck, as quais, respectivamente, são propriedade das clientes da Autora, CC - …, S.A. e Rec – DD S.A., ambas empresas integrantes do...

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