Acórdão nº 3679/08.1TBVLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução29 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA intentou acção de reconhecimento judicial da paternidade, com processo ordinário, contra BB, pedindo que a acção seja julgada procedente e, em consequência, o autor reconhecido como filho do réu.

Contestou o réu, invocando, desde logo, a excepção de caso julgado , já que, por sentença de 6-3-2002, proferida na acção de investigação de paternidade n° 801/2001, que correu termos pelo 2° Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, proposta pelo autor contra o aqui réu, idêntica pretensão à agora formulada fora já julgada improcedente por caducidade.

A final, proferiu-se a seguinte decisão: (…) Face ao exposto julga-se procedente por provada a excepção do caso julgado deduzido pelo réu e, nessa conformidade, ao abrigo do disposto nos arts. 288°, n° 1, e), 493°, n° 2, 494°, al. i) e 497°, n°s 1 e 2, do CPC, absolve-se o réu da instância.

(…) O autor apelou da decisão que considerou procedente a excepção de caso julgado, invocando em seu benefício os efeitos que considera deverem atribuir-se à prolação pelo TC do Ac. Acórdão nº 23/06.

A Relação começou por enunciar os factos provados, com relevo para a dirimição da causa: 1- O autor nasceu no dia 29 de Maio de 1975, na freguesia de Cedofeita, concelho do Porto; 2 - Por sentença de 6-1-1978, transitada em julgado, proferida no processo n° 5868/1976, que correu seus termos na 1a Vara Cível do Porto, em que era autor o Ministério Público, em representação do menor AA, e réu BB, foi o aludido réu absolvido do pedido 3 - Na referida acção pedia-se que o menor fosse declarado filho ilegítimo do réu; 4 - Posteriormente, por sentença de 6-3-2002, transitada em julgado, proferida no processo n° 801/2001, que correu termos pelo 2° Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, em que era autor AA e réu BB, foi o mesmo réu absolvido do pedido por caducidade da acção; 5 - Na referida acção pedia o autor que fosse declarado que o mesmo é filho do réu; 6 -Em 13-9-2008 intentou autor AA a presente acção contra o réu BB, na qual pede que seja o autor reconhecido como filho do réu.

Passando, de seguida, a apreciar o mérito da argumentação expendida pelo apelante, julgou o recurso improcedente pelos seguintes fundamentos: O recurso versa apenas sobre a questão do caso julgado que emana da decisão proferida em 6.3.2002 que considerou caduca acção de investigação de paternidade intentada pelo recorrente por ultrapassagem do lapso de tempo a que alude o art. 1817º nº 1 do CC (doc. de fls 35 a 40).

Argumenta, em suma, o recorrente que na sequência do acórdão do TC de 23/2006 de 10/1 (que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral da sobredita disposição legal) não existe caso julgado dado o efeito ex tunc da decisão de inconstitucionalidade.

Contudo, sendo um facto que o efeito principal da declaração de inconstitucionalidade é o efeito invalidatório (eliminação retroactiva da norma declarada inconstitucional) a retroactividade da sentença declarativa de inconstitucionalidade tem os seus limites sendo um deles o caso julgado (art. 282º nº 3 da CRP).

Neste contexto, como a Constituição estabelece a ressalva dos casos julgados (art. 282º nº 3 da CRP) isso significa a imperturbabilidade das sentenças proferidas com fundamento na lei inconstitucional que não são nulas nem revisíveis em consequência da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, J.J. Gomes Canotilho, 7ª edição, pág. 1012 e ss).

Consequentemente, como não estamos perante uma excepção ao princípio da intangibilidade do caso julgado (como acontece em matérias de ilícito penal, ilícito disciplinar e ilícito de mera ordenação social), há caso julgado como foi decidido pelo tribunal a quo.

  1. Inconformado com tal conteúdo decisório, o A. interpôs a presente revista que encerra com as seguintes conclusões: A- Em 6-1-1978 correu termos pela Ia Vara do Tribunal Cível do Porto acção de investigação oficiosa da paternidade contra o recorrido, tendo a mesma sido julgada improcedente e em 6-3-2002 foi proferida sentença nos autos de processo decorrentes pelo 2° Juízo do Tribunal Judicial de Valongo sob o registo 801/2001, em que eram partes recorrente e recorrido, tendo este sido absolvido do pedido(investigação da paternidade) por caducidade da acção.

    B - Foi proferida decisão por Acórdão de 23/06 de 8/2 do Tribunal Constitucional, publicado no D.R. de 8.2.2006, I série, págs. 1026 a 1034, declarando-se a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante no n°l do art.

    1817° do Código Civil, aplicável por força do art. 1873° do mesmo Código , da caducidade do direito de investigar a paternidade, sendo que tal declaração implica a remoção da norma do ordenamento jurídico, não podendo ser aplicada pelos Tribunais(art. 204° da Constituição da República), declaração esta que tem efeitos "ex tunc", isto é, tudo se passa, como se a norma nunca tivesse vigorado, o que significa que à data da entrada de tal acção, bem como da presente, não existe qualquer prazo de caducidade para a investigação da paternidade. É imprescritível o direito de investigar.

    C -A acção de averiguação oficiosa da paternidade é uma acção de interesse público(estabelecimento da paternidade), que tem lugar mesmo sem qualquer pedido e sempre que a paternidade não esteja estabelecida, o que é o caso, e mesmo a improcedência da acção oficiosa não obsta a que seja intentada nova acção de investigação, pelo filho, vide Artigos 1817° a 1819°, 1847, 1796, n.° 2 e 1869° a 1873° todos do Código Civil.

    D- 0 regime a que alegam os artigos 1813° e 1868° do Código Civil segundo o qual a improcedência da acção oficiosa de declaração da maternidade ou da paternidade instaurada pelo Ministério Público não obsta a que seja proposta nova acção judicial, com o mesmo fim, constitui uma franca derrogação do principio geral da força vinculativa do caso julgado.

    E - Como normas excepcionais que são o seu regime sobrep3õe-se ao das normas dos artigos 493° n° 2, i) , 494° e 495° do CPC, que integram normas de carácter geral.

    F - 0 principio da intangibilidade do caso julgado não tem carácter absoluto e pode ser excepcionado, remetendo-se na integra todo o vertido no Douto Acórdão, ora recorrido de fls 151 e seguintes(voto de vencida).

    G - Ao Recorrente assiste-lhe o "direito fundamental à identidade e integridade pessoal" (sendo a situação particular de tutela de direitos de natureza estritamente pessoal ou de personalidade, expressos na relação de paternidade ou de filiação), consagrado no art. 26.°, n° 1 da CRP, o "direito ao desenvolvimento da personalidade", e o "direito ao conhecimento da...

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