Acórdão nº 4537/04.4TVPRT-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução06 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA veio deduzir oposição à acção executiva para pagamento de quantia certa que BB e CC lhe movem para dele obter o pagamento da quantia de 183 603,59€ (cento e oitenta e três mil seiscentos e três euros e cinquenta e nove cêntimos), acrescida de juros legais vincendos.

Invoca, em síntese, que é parte ilegítima e que nada deve aos exequentes, porquanto subscreveu o documento dado à execução na qualidade de administrador da sociedade Petrocávado – Investimentos Imobiliários e Mobiliários, S.A., e não em nome pessoal.

Alegou ainda que o documento exequendo não é um título executivo, pois apesar de erradamente estar designado de Confissão de Dívida, não se destinou a reconhecer qualquer dívida da Petrocávado, sendo apenas uma declaração acessória de um cheque emitido que se destinava ao pagamento, pela Petrocávado, da última prestação do preço da cessão de quotas das sociedades SICL, Competro, e Pacsol. O diferimento do pagamento de parte do preço destinava-se a salvaguardar a possibilidade de vir a ser descoberto algum passivo ou serem exigidas obrigações fiscais não previstas na altura da celebração do contrato. Como este condicionalismo se verificou foi cancelado o cheque, correndo entretanto termos uma execução em que figurou como título executivo, e em que o opoente deduziu oposição que veio a ser julgada procedente. Nesse processo a própria embargada reconheceu que o documento aqui dado em execução mais não é do que uma declaração complementar ao cheque e explicativa da sua emissão.

Os exequentes contestaram, impugnando as razões aduzidas pelo opoente, sustentando a existência da dívida a que se refere o título executivo.

Saneado e instruído o processo, efectuou-se julgamento após o que foi proferida sentença na qual se decidiu: “Pelo exposto, considero a oposição procedente por ilegitimidade processual passiva do opoente e julgo extinta a execução.

Custas pelos exequentes”.

Irresignados, os exequentes apelaram da sentença, tendo a Relação do Porto, por razões não totalmente coincidentes, confirmado a decisão da 1.ª Instância.

Mantendo-se inconformados, os exequentes interpõem, agora, recurso de revista, para este Supremo Tribunal, concluindo, assim, as suas alegações: “1. A decisão recorrida não pode manter-se, porque fez uma errada aplicação e interpretação do direito aos factos dos autos.

  1. Com efeito, os factos provados pelos documentos juntos aos autos demonstram, de forma inequívoca, que o executado é devedor da quantia constante do título dado à execução, pelo que a sua oposição deveria ter sido julgada improcedente.

  2. A decisão recorrida, tal como a decisão de primeira instância, viola a lei em duas vertentes: por um lado, viola lei substantiva no que concerne às regras de interpretação da declaração negocial; por outro lado, viola as regras que, de forma imperativa, ordenam a produção dos diversos meios de prova, sua admissibilidade e/ou valoração.

  3. Recorrendo aos critérios legais de interpretação, previstos nos artigos 236° e 238° do Código Civil, temos que concluir que o executado se confessou devedor em nome pessoal, uma vez que emitiu e assinou um cheque da sua conta pessoal para titular a dívida constante do título executivo.

  4. O comportamento do declarante, em especial o facto de na mesma data em que assinou a confissão de dívida, ter emitido e entregue um cheque da sua conta pessoal para titular essa dívida, reforça que o mesmo se confessou devedor, em nome pessoal, impondo-se que nos termos do artigo 236° do Código Civil se interprete tal documento nesse sentido.

  5. O teor do cheque junto a fls. 29 do Apenso A, deveria ter sido dado como integralmente reproduzido, o que ora se impõe.

  6. Com efeito, no texto da confissão de dívida consta que para titular essa dívida o executado entregaria aos Exequentes um cheque do mesmo valor, cheque esse que foi identificado através do número, Banco e balcão.

  7. A cópia desse cheque, não impugnada, foi junta aos autos e permite concluir que o cheque foi sacado de conta pessoal do executado.

  8. Pelo que o Acórdão recorrido deveria ter alterado a matéria de facto constante das alíneas A., B e C. dos factos provados.

  9. Não o tendo feito, impõe-se que este Tribunal reconsidere essa decisão, nos termos do artigo 722° do CPC, porque se trata de matéria de direito uma vez que o Tribunal a quo violou os artigos 236° e 238° do Código Civil.

  10. Deve, nestes termos, alterar-se a redacção das alíneas A e C dos Factos provados devendo considerar-se provado apenas o seguinte: - O executado assinou o documento dado em execução, nos termos e com o conteúdo constante a fls. 17 da execução apensa.

    - dar-se como reproduzido o teor do cheque de fls.

    - A quantia titulada por este cheque destinava-se ao pagamento da última prestação do preço da cessão das quotas das sociedades Sicl - Sociedade de Investimento Combustíveis e Lubrificantes, Lda., e Pacsol- Posto de Abastecimento de Combustíveis de Soalhães, Lda.

  11. Isto posto, embora conste do texto da confissão de dívida que o executado outorgou esse documento na qualidade de administrador da sociedade Petrocávado, resulta provado através desse mesmo documento que nessa mesma data o mesmo emitiu, assinou e entregou aos Exequentes um cheque para titular essa dívida.

  12. Ora, complementado o teor do título executivo dos autos com o teor do cheque junto aos autos, é pacífico que o executado se confessou devedor dessa quantia em nome pessoal, assumindo pessoalmente a dívida da sociedade que representava.

  13. Se assim não fosse, o cheque emitido para titular a dívida teria sido sacado de uma conta da sociedade e não de uma conta pessoal da titularidade do executado.

  14. Nesta conformidade, os factos dos autos provados (por documentos com força probatória plena) implicam decidir que o Executado assumiu pessoalmente a dívida da sociedade Petrocávado que representava. E, embora estivesse previsto na promessa celebrada em Novembro que seria esta sociedade a pagar o preço em falta e a assinar um cheque e uma confissão de dívida, verificou-se que, afinal, em 9 de Janeiro, foi o executado que assinou a confissão de dívida e emitiu o cheque que titulava essa dívida - vide documentos juntos a fls. 17 da execução apensa e 29 do Volume I da Oposição.

  15. Tais factos permitem concluir sem margem para dúvida que o executado assumiu a dívida nos termos do disposto na alínea b) do artigo 585° do Código Civil, norma que por não ter sido aplicada pelo tribunal recorrido foi violada tacitamente.

  16. Acresce que a assinatura constante da confissão de dívida é a assinatura do executado, que não assinou sobre carimbo da sociedade, nem fez menção da sua qualidade de administrador.

  17. Ora, é sabido que face do disposto nos artigos 260° n°4, 409° n°3, 474° e 478° do CSC, os gerentes, administradores ou directores de sociedades comerciais devem assinar sempre com a sua própria assinatura (correspondente ao seu nome civil) e indicar a sua qualidade, nomeadamente referindo a expressão da firma e a palavra gerente ou administrador ou director, respectivamente escrita à mão ou mecanicamente (v.g. por carimbo).

  18. Sucede que, ao lado da assinatura do executado aposta na confissão de dívida, não consta a firma da sociedade, nem a palavra administrador, pelo que o Acórdão recorrido interpretou de forma incorrecta o disposto no artigo 409° do CSC que, assim, foi violado.

  19. Acresce que, a confissão de dívida dos autos integra título executivo válido, nos termos da alínea c) do artigo 46° do CPC, pelo que não tendo sido declarada nula ou anulada a confissão de dívida ou invocado qualquer vício formal que lhe retirasse o seu efeito de título executivo válido, nunca poderia a oposição proceder.

  20. Alterada assim em conformidade a matéria de facto das alíneas A, B e C dos factos provados, teremos forçosamente de concluir: que o título dado à execução consubstancia uma declaração/confissão de dívida assumida pessoalmente pelo executado perante os Exequentes, dívida essa certa, exequível e com vencimento determinado - trata-se pois inequivocamente de título executivo válido contra o executado (artigo 46° do CPC); que o executado, porque assumiu tal dívida, a título pessoal perante os Exequentes, deve a estes a quantia exequenda; de tudo resultando que a oposição tem de ser julgada improcedente.

  21. [1] Em suma, impõe-se a revogação do Acórdão recorrido uma vez que violou os artigos 236°, 238°, 376°, 394°, 585° do C.C., 409° do C.S.C, e os artigos 55° e 814° do CPC.

    Não foram oferecidas contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    As conclusões da recorrente – balizas delimitadoras do objecto do recurso (arts. 684º nº 3 e 690º, nº 1 do Código de Processo Civil[2] - CPC daqui por diante) – consubstanciam as seguintes questões:

    1. Admissibilidade (ou não) da produção de prova testemunhal para prova dos factos indicados nas alíneas A) e C); b) Interpretação da declaração negocial constante do título executivo; c) Vinculação da sociedade com a assinatura do administrador.

    II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Vêm dados como provados, pelas instâncias, os seguintes factos: 1) O executado assinou o documento dado em execução, nos termos e com o conteúdo constante a fls. 17 da execução apensa, enquanto representante legal da sociedade Petrocávado - Investimentos Imobiliários e Mobiliários, S.A. (A).

    2) Como consta do referido documento, para titular o pagamento dos € 174.579,26 foi entregue aos exequentes o cheque daquela importância sacado sobre o Finibanco, com o n.° 0000000000, datado de 30 de Abril de 2002 (B).

    3) A quantia titulada por este cheque destinava-se ao pagamento pela Petrocávado da última prestação do preço da cessão das quotas das sociedades Sicl - Sociedade de Investimento Combustíveis e Lubrificantes, Lda., Competro Comércio de Petróleos, Lda., e Pacsol - Posto, de Abastecimento de Combustíveis de Soalhães, Lda. (C).

    4) O diferimento do pagamento desta prestação destinava-se a permitir a...

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