Acórdão nº 07P3330 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução11 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Celorico da Beira (proc. n.º 52/06.0GACLB), decidiu condenar: - o arguido AA, como autor material de 7 crimes de roubo do art. 210º, n.º 2, al. b), do C. Penal, na pena de 3 anos de prisão para cada um dos crimes; de 2 crimes de detenção ilegal de arma do art. 6º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27.6 (lei mais favorável), na pena de 4 meses de prisão para cada um dos crimes; e, em cúmulo jurídico, condená-lo na pena única de 6 anos de prisão; - o arguido BB, em concurso efectivo, em co-autoria material e na forma consumada de dois crimes de roubo do art. 210º, n.ºs 1 e 2, al. b), do C. Penal, na pena de 4 anos de prisão por cada um dos crimes; e, em cúmulo jurídico, condená-lo o arguido na pena única de 5 anos de prisão; - o arguido CC, em concurso efectivo, em co-autoria material e na forma consumada de 2 crimes de roubo do art. 210º, n.ºs 1 e 2, al. b), do C. Penal, na pena de 4 anos de prisão por cada um dos crimes; pela prática de 1 crime de detenção de substâncias explosivas do art. 275º, n.º 1, do C. Penal (regime mais favorável), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 anos e 10 meses de prisão.

Recorreram os arguidos, DD e CC para a Relação de Coimbra, impugnando a factualidade dada como provada, invocando a violação do princípio in dubio pro reo e a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

Aquele Tribunal Superior (Recurso nº 52/06.0GACLB.C1) negou provimento aos recursos.

Ainda inconformados recorrem para este Supremo Tribunal de Justiça os mesmos arguidos, suscitando as seguintes questões: - Apreciação da matéria de facto (conclusões 1.ª a 5.ª) - Nulidade da decisão da Relação quanto a essa matéria (conclusão 6.ª); - Medida concreta da pena (conclusões 7.ª a 15.ª) Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, teve vista o Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, teve lugar a conferência, pelo que cumpre conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

Comecemos por conhecer da arguida nulidade da decisão recorrida, por razões metodológicas.

Limitam-se os recorrentes a dizer na conclusão 6ª que: «o acórdão do Tribunal da Relação agora recorrido, não apreciou a matéria de facto sob recurso invocada pelos recorrentes, cometendo a nulidade do art. 379.º, n° 1, al. e) do CPP».

Escreve-se na decisão recorrida: «Sustentam os recorrente que o tribunal julgou incorrectamente os factos imputados aos recorrentes uma vez que não foi produzida qualquer prova que pudesse imputar com garantia terem os recorrentes ter participado em tais factos.

Os recorrente discordam com a forma como na decisão recorrida foi apreciada a prova produzida em julgamento e as conclusões de convicção probatória a que ali se chegou.

De acordo com o disposto no art. 412º nº 3 al b) do Código Processo Penal, a matéria de facto impugnada só pode proceder, quando o recorrente tendo por base o raciocínio lógico e racional feito pelo tribunal na decisão recorrida, indica provas que "imponham decisão diversa".

Ora, os recorrentes ao pretenderem a alteração da matéria de facto defendem que a convicção do tribunal resultou de deficiente valoração da prova produzida em julgamento, nomeadamente da indevida credibilidade atribuída á confissão integral e sem reservas, pelo co-arguido AA e de outros meios de prova tomadas por reforço daquelas declarações confessórias e incriminadoras dos recorrentes. Ora, tal não é indicar provas que imponham decisão diversa. As declarações prestadas pelos arguidos e depoimentos prestados pelas testemunhas têm de ser apreciados em conjugação com todos os outros elementos trazidos aos autos. Foi no conjunto de todos os elementos que o tribunal fundou a sua convicção.

O que afinal os recorrentes fazem é impugnar a convicção adquirida pelo tribunal a quo sobre determinados factos em contraposição com a que sobre os mesmos eles adquiriram em julgamento, esquecendo a regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127º.

De acordo com o disposto no art. 127º a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.

"O art. 127º do Código Processo Penal estabelece três tipos de critérios para avaliação da prova, com características e naturezas completamente diferentes: uma avaliação da prova inteiramente objectiva quando a lei assim o determinar; outra também objectiva, quando for imposta pelas regras da experiência; finalmente, uma outra, eminentemente subjectiva, que resulte da livre convicção do julgador.

A prova resultante da livre convicção do julgador pode ser motivada e fundamentada mas, neste caso, a motivação tem de se alicerçar em critérios subjectivos, embora explicitados para serem objecto de compreensão" (Ac STJ de 18/1/2001, proc nº 3105/00-5ª, SASTJ, nº 47,88).

Tal como refere o Prof Germano Marques da Silva no Curso de Processo Penal, Vol II, pg 131 "... a liberdade que aqui importa é a liberdade para a objectividade, aquela que se concede e que se assume em ordem a fazer triunfar a verdade objectiva, isto é, uma verdade que transcende a pura subjectividade e que se comunique e imponha aos outros. Isto significa, por um lado, que a exigência de objectividade é ela própria um princípio de direito, ainda no domínio da convicção probatória, e implica, por outro lado, que essa convicção só será válida se for fundamentada, já que de outro modo não poderá ser objectiva".

Ou seja, a livre apreciação da prova realiza-se de acordo com critérios lógicos e objectivos.

Sobre a livre convicção refere o Professor Cavaleiro de Ferreira que esta « é um meio de descoberta da verdade, não uma afirmação infundada da verdade» -Cfr. "Curso de Processo Penal", Vol. II , pág.30. Por outras palavras, diz o Prof. Figueiredo Dias que a convicção do juiz é "... uma convicção pessoal -até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais -, mas em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, portanto capaz de impor-se aos outros ."- Cfr., in "Direito Processual Penal", 1º Vol., Coimbra Ed., 1974, páginas 203 a 205.

O princípio da livre apreciação da prova assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art. 355 do Código de Processo Penal. É ai que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na recepção directa de prova.

No dizer do Prof. Germano Marques da Silva "... a oralidade permite que as relações entre os participantes no processo sejam mais vivas e mais directas, facilitando o contraditório e, por isso, a defesa, e contribuindo para alcançar a verdade material através de um sistema de prova objectiva, atípica, e de valoração pela intima convicção do julgador (prova moral), gerada em face do material probatório e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens". -Cfr. "Do Processo Penal Preliminar", Lisboa, 1990, pág. 68".

O princípio da imediação diz-nos que deve existir uma relação de contacto directo, pessoal, entre o julgador e as pessoas cujas declarações irá valorar, e com as coisas e documentos que servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto.

Citando ainda o Prof. Figueiredo Dias, ao referir-se aos princípios da oralidade e imediação diz o mesmo: « Por toda a parte se considera hoje a aceitação dos princípios da oralidade e da imediação como um dos progressos mais efectivos e estáveis na história do direito processual penal. Já de há muito, na realidade, que em definitivo se reconheciam os defeitos de processo penal submetido predominantemente ao principio da escrita, desde a sua falta de flexibilidade até à vasta possibilidade de erros que nele se continha, e que derivava sobretudo de com ele se tomar absolutamente impossível avaliar da credibilidade de um depoimento. (...) Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade. Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível a credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais ". -In "Direito Processual Penal", 10 Vol., Coimbra Ed., 1974, páginas 233 a 234 .

Assim, e para respeitarmos estes princípios se a decisão do julgador, estiver fundamentada na sua livre convicção e for uma das possíveis soluções segundo as regras da experiência comum, ela não deverá ser alterada pelo tribunal de recurso. Como se diz no acórdão da Relação de Coimbra, de 6 de Março de_2002 (C.J., ano XXV|II, 20, página 44) "quando a atribuição da credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear na opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum".

Ora, se atentarmos aos factos apurados e compulsada a fundamentação temos de concluir que os juízos lógico-dedutivos aí efectuados são acertados, designadamente no que se refere aos factos apurados e postos em questão pelos recorrentes.

Na verdade, as declarações do arguido AA foram devida e fundamentadamente valoradas. Essas declarações e na parte em que se refere aos co-arguidos DD e CC, constituem meio de prova legalmente admissível - "Não existe qualquer disposição legal que proíba que as declarações de co-arguido possam valer como meio de prova, pelo que as mesmas poderão ser objecto de valoração por parte do tribunal, para fundamentar a convicção sobre os factos que dá como provados, dentro da regra da livre apreciação da prova" Ac do STJ de 26/3/98 Proc nº 44/98 (cit. Pelo Mº Pº no seu parecer).

Para além do valor probatório destas declarações as mesmas foram confirmadas por outros meios de provas a saber - documentos, nomeadamente, no que respeita a registos de chamadas efectuadas pelos...

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