Acórdão nº 07B841 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Nos autos de execução para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, instaurados no Tribunal Judicial da Comarca de Vila do Conde, pelo BANCO AA, SA, contra BB e mulher CC, foram deduzidos embargos pelos executados.
Alegaram, em síntese, que: As cláusulas do documento complementar não podem ser aplicadas in casu, porquanto, o seu conteúdo não lhes foi lido e explicado, pelo que devem ser consideradas como não escritas e, portanto, excluídas das obrigações assumidas pelos fiadores; O banco embargado não possui título executivo (obrigação certa, líquida e exigível) contra os fiadores em relação a todas as prestações, já que o empréstimo deveria ser pago em 300 prestações, com início em 30 de Novembro de 1997, sendo que a perda do benefício do prazo atribuído aos mutuários não se estende a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia, ou seja, ao terceiro fiador; O banco embargado não procedeu de boa fé e, por culpa dele, extinguiram-se os direitos de sub-rogação do fiador: o facto de o embargado não ter comunicado aos embargantes o vencimento imediato de todas as prestações; a resolução do contrato, a interposição da acção executiva contra os mutuários, libera os fiadores, por impossibilidade de sub-rogação; Resolvido o contrato de empréstimo com fiança, sobre o saldo devedor apenas recairão os juros legais de mora.
Na contestação, o embargado reduziu a quantia exequenda ao montante de € 18.139,55 e impugnou os factos alegados.
Os embargos prosseguiram a sua normal tramitação e, na altura própria, foi proferida sentença.
Concluiu-se pela incerteza, insuficiência, inexistência ou inexequibilidade do título executivo e consequentemente, julgaram-se os mesmos procedentes.
II - Apelou o exequente, mas debalde, porquanto o Tribunal da Relação do Porto confirmou a decisão de primeira instância.
III - Ainda inconformado, o exequente pede revista.
Conclui as alegações como segue: 1. As cláusulas excluídas pelos Tribunais recorridos constam de um contrato formalizado por escritura pública, bem como de um documento complementar que faz parte integrante da mesma.
-
A escritura pública é um documento autêntico, dotado de fé pública - que de acordo com o disposto no artigo 371º n.º 1 do Código Civil faz prova plena dos factos praticados pela autoridade pública respectiva, bem como dos factos neles atestados com base nas percepções da entidade documentadora.
-
A força probatória da antedita escritura só poderia ser elidida mediante a arguição da sua falsidade.
-
Ao não entender assim, as decisões dos Doutos Tribunais recorridos, ignoraram, por completo, as consequências jurídicas que advêm da autenticidade do documento em causa - violando as normas contidas nos artigos 371º e 372º do Código Civil.
-
Não havendo os Recorridos invocado tal excepção - falsidade do documento autêntico - então a formulação dos quesitos correspondentes teria de ser diversa - no sentido de o aludido ónus recair sobre os mesmos - e a final dados como não provados, improcedendo os embargos deduzidos.
Sem prescindir 6. Ainda que assim não seja entendido, sempre teriam tais quesitos de ser dados por provados.
-
Tal como consta da escritura pública que está na base do litígio, os quartos outorgantes, aqui Recorridos, declararam-se solidariamente fiadores e principais pagadores da dívida contraída pelos segundos outorgantes.
-
Na mesma escritura se refere que foi feita a sua leitura bem como o seu conteúdo devidamente explicado aos outorgantes, em conformidade com o disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 46.º e do n.º 1 do artigo 50.º do Código do Notariado.
-
O contrato abrange não apenas a escritura mas também o documento complementar.
-
Os Recorridos, ao se declararem solidariamente fiadores e principais pagadores no âmbito daquele contrato, fazem-no em relação a todas as cláusulas que do mesmo fazem parte, uma vez que o "contrato" se rege por todas essas cláusulas.
-
Ao ter sido efectuada a leitura da escritura e a explicação do seu conteúdo, os aqui Recorridos ficaram cientes que aquele "Contrato de Compra e Venda com Empréstimo", do qual se constituíram Fiadores, era regulado também por um documento complementar, parte integrante da referida escritura.
-
A escritura exarada faz fé pública de que a sua leitura e explicação do seu conteúdo foi, diligentemente, cumprida pelo Notário que a celebrou.
-
A comunicação adequada e efectiva aos Fiadores das cláusulas constantes do documento complementar, fica provada, desde logo, porque consta da escritura a sua realização.
-
Feita mediante escritura pública, tal comunicação foi assegurada com uma certeza e segurança que tutelam os interesses do consumidor de forma mais favorável do que a exigida pelo regime das cláusulas contratuais gerais.
-
Tornar-se-ia, até, desnecessário que os Recorridos viessem a ter, na prática, conhecimento, pois ao outorgarem o negócio mediante escritura pública e não tomando conhecimento das cláusulas, tal conduta não se conformaria com o grau de diligência legalmente pressuposto.
-
O Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais apenas exige que seja dado à contraparte razoável possibilidade de delas tomar conhecimento.
-
O contrato celebrado - mediante escritura pública - concedeu aos Recorridos uma possibilidade mais do que razoável de conhecer e perceber o seu conteúdo - uma possibilidade mais exigente do que aquela que a lei prevê.
Termos em que Deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, e, em consequência, ser decretada a anulação das doutas decisões de 1ª instância e do Venerando Tribunal da Relação do Porto, substituindo-as por outra que, julgando os embargos deduzidos improcedentes, ordene o prosseguimento da execução.
Contra-alegaram os executados, concluindo que: 1- Dos factos provados na douta sentença, não há razão para alterar as respostas aos quesitos e a douta decisão recorrida; 2- "Parte devedora", na escritura pública que formalizou os contratos de compra e venda, empréstimo, hipoteca e fiança, são os segundos outorgantes, não os quartos outorgantes; 3- Debalde procuraremos uma declaração dos fiadores no sentido de "conhecer perfeitamente e aceitar integralmente as cláusulas do documento complementar (...) tendo dispensado a sua leitura; 4- Das várias versões de "verdade" plausíveis, em confronto, a que prevalece é a do julgador, após a valoração das provas produzidas; 5- Requer-se a ampliação do objecto de recurso, uma vez que os recorridos obtiveram ganho da causa, mas apenas por parte dos fundamentos pedidos referidos na sua Oposição à Execução; 6- Extinta a obrigação principal por pagamento, com a adjudicação ao exequente do imóvel hipotecado, atendendo ao valor...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 4208/15.6T8PBL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2017
...p. 33, Fernando de Gravato Morais, Contratos de Crédito ao Consumo, Almedina, p. 345; acórdãos do STJ de 10/5/2007, proferido no processo 07B841, da Relação de Lisboa de 11/2/2014, proferido no processo. 12878/09.8T2SNT-A.L1-7, de 16/5/2013, proferido no processo, 426-B/2001.L1-8, de 17/11/......
-
Acórdão nº 1630/06.2YRCBR.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2014
...é um elemento necessário e autónomo, que deve ser invocado e demonstrado”[35]. Tal como vertido no Acórdão do STJ, de 10/05/07, Proc. n.º 07B841, cabe ao aderente demonstrar que se está perante um contrato de adesão, de acordo com as regras gerais do ónus da prova constantes do art. 342.º d......
-
Acórdão nº 1831/20.0T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Março de 2023
...BARROS, 25/5/2006, processo n.º 06B1016, Rel. PEREIRA DA SILVA, 24/10/2006, processo n.º 06A2978, Rel. JOÃO CAMILO, 10/5/2007, processo n.º 07B841, Rel. JOÃO BERNARDO, 13/5/2008, processo n.º 1287/08, Rel. FONSECA RAMOS, e, mais recentemente, 17/12/2019, processo n.º 155/16.2T8PNF.P1.S1, Re......
-
Acórdão nº 2577/14.4TBMAI-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Fevereiro de 2017
...Editora, 4.ª ed., pág. 716. [5] Mário Júlio de Almeida Costa, ibidem, pág. 714. [6] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 10-05-2007, processo 07B841; RP de 23-06-2015 processo n.º [7] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume II, Coimbra Editora, 3.ª ed., pág. 33. [8] In www.dg......
-
Acórdão nº 4208/15.6T8PBL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2017
...p. 33, Fernando de Gravato Morais, Contratos de Crédito ao Consumo, Almedina, p. 345; acórdãos do STJ de 10/5/2007, proferido no processo 07B841, da Relação de Lisboa de 11/2/2014, proferido no processo. 12878/09.8T2SNT-A.L1-7, de 16/5/2013, proferido no processo, 426-B/2001.L1-8, de 17/11/......
-
Acórdão nº 1630/06.2YRCBR.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2014
...é um elemento necessário e autónomo, que deve ser invocado e demonstrado”[35]. Tal como vertido no Acórdão do STJ, de 10/05/07, Proc. n.º 07B841, cabe ao aderente demonstrar que se está perante um contrato de adesão, de acordo com as regras gerais do ónus da prova constantes do art. 342.º d......
-
Acórdão nº 2577/14.4TBMAI-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Fevereiro de 2017
...Editora, 4.ª ed., pág. 716. [5] Mário Júlio de Almeida Costa, ibidem, pág. 714. [6] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 10-05-2007, processo 07B841; RP de 23-06-2015 processo n.º [7] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume II, Coimbra Editora, 3.ª ed., pág. 33. [8] In www.dg......
-
Acórdão nº 1831/20.0T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Março de 2023
...BARROS, 25/5/2006, processo n.º 06B1016, Rel. PEREIRA DA SILVA, 24/10/2006, processo n.º 06A2978, Rel. JOÃO CAMILO, 10/5/2007, processo n.º 07B841, Rel. JOÃO BERNARDO, 13/5/2008, processo n.º 1287/08, Rel. FONSECA RAMOS, e, mais recentemente, 17/12/2019, processo n.º 155/16.2T8PNF.P1.S1, Re......