Acórdão nº 06S2454 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMARIA LAURA LEONARDO
Data da Resolução07 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - "AA", residente na Av. do Brasil, nº ..., São Marcos Cacém, moveu acção declarativa de condenação emergente do contrato individual de trabalho, com processo comum, contra Empresa-A, com sede na Avª Álvares Cabral, nº ..., em Lisboa, alegando a ilicitude do seu despedimento e pedindo que esta seja condenada a reintegrá-lo ou a pagar-lhe indemnização de antiguidade, se esta vier a ser a sua opção, e ainda, em qualquer caso, que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia já liquidada de € 29.103,96, dos quais € 15.000, a título de indemnização por danos morais, bem como as importâncias correspondentes às retribuições mensais devidas até à data da sentença integrando a isenção de HT e a viatura e incluindo subsídios.

Pede, também, que a ré seja condenada a pagar-lhe juros de mora, à taxa legal, vencidos - desde a data do vencimento das respectivas prestações - e vincendos, até efectivo pagamento.

A ré contestou, concluindo no sentido da improcedência da acção e da sua absolvição do pedido.

Após o julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 10.859,29 (a título de trabalho suplementar, subsídio de alimentação e uso de viatura) acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre cada uma das prestações mensais devidas, desde as respectivas datas de vencimento até efectivo pagamento.

O pedido de declaração da ilicitude do despedimento, bem como os demais, nos termos do artº 13º da LCCT e por ressarcimento a título de danos morais, que daquele dependiam, foram julgados improcedentes.

O autor apelou, mas circunscreveu o objecto do recurso à parte em que a sentença considerou lícito o seu despedimento.

O Tribunal da Relação julgou a apelação improcedente e confirmou a decisão da 1ª instância.

O autor interpôs recurso de revista, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1ª) - Na sentença devem ser tomados em consideração não só os factos que o Tribunal deu como provados, mas também, ao que aqui directamente importa, os provados por documentos (n° 3 do artº 659° Cód. Proc. Civil); 2ª) - A fls 292, do Processo Disciplinar, documento da autoria da própria recorrida e por ela junto aos autos, consta o aviso de recepção da carta da Nota de Culpa; 3ª) - Esse documento consubstancia a notificação do recorrente e sem margem para dúvidas prova que ela ocorreu em 21 de Janeiro de 2002; 4ª) - Está, assim, esse facto provado nos autos; 5ª) - Ao não considerar assim e consignar apenas provada a data da carta de notificação o acórdão recorrido violou o nº 3 do artº 659° Cód. Proc. Civil; 6ª) - Em processo com vista ao despedimento, o prazo de 60 dias previsto no nº 1 do artº 31º do RJCIT suspende-se com a instauração de processo prévio de inquérito, desde que: tal seja necessário para fundamentar a nota de culpa; o inquérito seja iniciado no prazo de 30 dias a contar da suspeita de comportamentos irregulares; seja conduzido de forma diligente; e seja seguido da notificação da nota de culpa dentro de trinta dias a contar da sua conclusão; 7ª) - No caso dos autos não está preenchido o terceiro pressuposto, uma vez que entre a conclusão do inquérito (19 de Dezembro de 2001) e a notificação da Nota de Culpa (21 de Janeiro de 2002) decorreram 33 dias; 8ª) - Por outro lado, como decorreram noventa dias entre 23 de Outubro de 2001 (data do despacho do Director-Geral da ré) e 21 de Janeiro de 2002 (data da notificação da Nota de Culpa), o procedimento disciplinar mostra-se prescrito; 9ª) - É, consequentemente, ilícito o despedimento do recorrente; 10ª) - Consta expressamente da já aludida carta de notificação da Nota de Culpa, datada de 18.Jan.2002, a referência "Registada c/AR"; 11ª) - É de conhecimento geral, constituindo facto notório, que uma carta elaborada numa determinada data, enviada sob registo pelos CTT, nunca pode chegar ao conhecimento do destinatário nesse próprio dia em que é elaborada; 12ª) - Não carecem de prova os factos notórios (nº 1 do artº 514º Cód. Proc. Civil); 13ª) - Também por isso, não podia o acórdão recorrido ter considerado que foi respeitado pela recorrida o prazo de 30 dias entre a conclusão do inquérito prévio e a notificação da nota de culpa; 14ª) - Ao decidir como o fez, violou o nº 1 do artº 31° do RJCIT, aprovado pelo Dec. Lei nº 49408, de 24.Nov.69, conjugado com os n°s 11 e 12 do artº 10° da LCCT, aprovada pelo DL n° 64-A/89, de 27/02; 15ª) - A infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que teve lugar (nº 3 do artº 27° do RJCIT); 16ª) - O momento inicial relevante à contagem desse prazo é o da prática dos factos e o momento final é o da aplicação da sanção disciplinar; 17ª) - No caso dos autos, todas as infracções disciplinares anteriores a 28 de Março de 2001 (um ano antes da notificação do despedimento) estão prescritas - com a consequência de que são disciplinarmente irrelevantes os actos acusatórios praticados até essa data; 18ª) - Decidindo que o momento final relevante à contagem do referido prazo prescricional é o do início do procedimento disciplinar, a decisão recorrida violou o nº 3 do artº 27° do RJCIT; 19ª) - Para que constitua justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador tem que ter natureza culposa; 20ª) - A própria decisão recorrida consigna que o recorrente agiu com a motivação de alcançar o objectivo de organizar a Estação do Aeroporto e com o propósito de a empresa alcançar os melhores resultados; 21ª) - Assim, por não revestirem carácter culposo, os actos praticados pelo recorrente não constituem justa causa de despedimento; 22ª) - Ao decidir em sentido contrário, como decidiu, o acórdão recorrido violou o nº 1 do artº 9º do Regime Jurídico aprovado pelo Dec. Lei n° 64-A/89, de 27 de Fevereiro.

Termina no sentido de ser anulado o acórdão recorrido, decidindo-se pela inexistência de justa causa de despedimento e condenando-se a recorrida em conformidade com o pedido.

Não houve contra-alegações.

Na mesma data em que o recorrente apresentou as suas alegações - em 20.02.2006 - veio arguir, em requerimento autónomo, a seguinte nulidade: não ter subido à Relação, com a apelação, o processo disciplinar que culminou no despedimento do autor.

Por acórdão proferido, em conferência, foi indeferida a apreciação da arguida nulidade.

O recorrente agravou deste acórdão.

São estas as conclusões da respectiva alegação: 1ª) - O recorrente arguiu perante o Tribunal da Relação de Lisboa a nulidade consistente na falta de uma parte do processo judicial que subiu em recurso, precisamente o processo disciplinar; 2ª) - É manifesta a relevância do processo disciplinar numa acção de impugnação de despedimento; 3ª) - Na medida em que essa falta influi no exame e na decisão da causa, consubstancia a nulidade a que se refere o nº 1 do artº 201º do CPC; 4ª) - Tal nulidade é de conhecimento oficioso e só pode ser reclamada pelo interessado (artºs 202º e 203º do mesmo diploma), devendo ser apreciada logo que reclamada (artº 206º-3); 5ª) - A arguição de nulidade podia ser feita no Supremo Tribunal de Justiça se o processo fosse expedido em recurso antes de findar o prazo previsto nesse preceito legal (artº 205º-3); 6ª) - Todavia, estando em curso o prazo de revista já a arguição devia ter lugar no Tribunal da Relação, como se fez; 7ª) - Ao indeferir a apreciação da nulidade, o acórdão recorrido violou as citadas disposições e ainda os artºs 666º e 668º do CPC; 8ª) - Além disso, tal indeferimento consubstancia uma denegação da justiça e constitui violação do princípio constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, direitos reconhecidos aos cidadãos no artº 20º da CRP.

Termina formulando uma alternativa: que se ordene à Relação que conheça da arguida nulidade ou se declare verificada a mesma, com a consequente junção aos autos do processo disciplinar e a anulação do acórdão que conheceu da apelação.

Não houve contra-alegações.

Remetido o processo ao Supremo, a relatora proferiu decisão sumária sobre o objecto do recurso de agravo, negando-lhe provimento.

O autor, considerando-se prejudicado com a decisão, veio reclamar para a conferência.

A Exma Procuradora Adjunta, no seu douto parecer, pronuncia-se no sentido do indeferimento da reclamação e consequente confirmação da decisão de fls 380 e segs.

Quanto ao recurso de revista, entendeu que, ao abrigo do disposto no nº 3 do artº 729º do CPC, o processo devia voltar ao Tribunal da Relação a fim de ser averiguada a data da notificação ao autor da nota de culpa, julgando-se, depois, novamente a causa.

Ninguém respondeu.

II - Questões Fundamentalmente, saber: A - Relativamente ao agravo: se foi extemporânea a arguição da nulidade invocada perante a Relação; B - Relativamente à revista: (i) se o procedimento disciplinar caducou; (ii) se as infracções disciplinares cometidas pelo recorrente prescreveram; (iii) se não há justa causa, por inexistência de culpa III - Factos 3.1 - Dados como provados pelas instâncias: 1. A ré é uma sociedade comercial que, na prossecução do seu escopo social, se dedica ao aluguer de veículos automóveis com condutor.

  1. O autor foi admitido ao serviço da ré em 22 de Agosto de 2000, para, sob autoridade e direcção dela, desempenhar a sua actividade profissional, no regime de contrato individual de trabalho (doc. de fls. 16 e 17).

  2. A sua admissão teve lugar na sequência de sugestão à ré e convite ao autor, pelo Director Geral, Dr. BB, que já trabalhara com ele durante dois anos numa outra empresa do ramo e o tinha como pessoa capaz e competente.

  3. Admissão essa que, juntamente com outras verificadas na mesma ocasião, nomeadamente de CC para Chefe de Estação, tinha em vista regularizar a falta de organização e o deficiente funcionamento da Estação do Aeroporto.

  4. O autor foi admitido com a categoria profissional de Supervisor e a termo certo de 6 meses e, em 1 de Novembro de 2000, foi pela ré promovido à categoria de Chefe de...

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