Acórdão nº 06P4344 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelPEREIRA MADEIRA
Data da Resolução14 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

Em processo comum com a intervenção do tribunal colectivo, o Ministério Público deduziu acusação contra AA, devidamente identificado, imputando-lhe a prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo art. 210º, nº 2, b), ex vi art.º 204.º, n.º 2, f), do Código Penal, e de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo art.º 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27/06, na redacção dada pela Lei n.º 98/2001, de 25/08.

Realizado o julgamento, veio a ser proferida sentença em que, além do mais, foi decidido: a) absolver o arguido da prática do crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo art. 6º, nº 1, da Lei nº 22/97, de 27/06, na redacção dada pela Lei nº 98/2001, de 25/08, de que vinha acusado; b) condená-lo, pela prática de um crime de roubo previsto e punido pelo art. 210.º, n.ºs 1 e 2, b), com referência ao art. 204.º, n.º 2, f), ambos do Código Penal, na pena de três anos e seis meses de prisão; Irresignado com aquele segmento absolutório, recorre o Ministério Público ao Supremo Tribunal de Justiça, assim delimitando o objecto da sua discordância: 1- Nos presentes autos foi o arguido AA acusado da prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de roubo do artigo 210.º, n.º 2, al. b), ex vi n.º 2, al. f), do artigo 204.º do C.Penal e de um crime de detenção ilegal de arma, p. e p. pelo artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27/06, na redacção dada pela Lei n.º 98/2001, de 25/8.

2- No acórdão proferido nos autos e agora posto em crise, foi o arguido absolvido da prática dos factos da acusação contra si deduzida quanto ao crime de detenção ilegal de arma, absolvição com a qual não se concorda.

3- Com efeito, o que qualifica o crime de roubo (nos termos do artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal), é a utilização de arma de fogo, que constitui infracção autónoma, de forma alguma consumida pela primeira.

4- Dito de outra forma, sendo a detenção e uso de arma de fogo um meio para consumar um crime de roubo, não é o fim em si mesmo nem com ele se confundindo.

5- Porque os crimes de roubo e de detenção de arma proibida protegem interesses diferentes e se consumam em momentos diferentes - o crime de roubo protege a propriedade e a pessoa e o de detenção de arma o perigo relativo às pessoas e às coisas estando consumado quando foi iniciada a prática do roubo - existe concurso real desses crimes quando o roubo é praticado com o emprego de arma proibida.

6- Face ao actual Código, embora tenha desaparecido a referência expressa a qualquer agravação resultante de uso de arma, seja ela qual for, está incluída uma referência agravativa ao emprego de arma, pela remissão para os n.ºs 1 e 2 do artigo 204.º e, relativamente ao crime de detenção de arma proibida, apenas foram alterados os seus requisitos.

7- Tendo o crime de roubo sido levado a cabo com a utilização da arma de fogo melhor descrita no ponto 2 da matéria dada como provada, verifica-se um concurso real de infracções entre o crime de roubo qualificado e o de detenção ilegal de arma - que a utilização desta última comporta.

8- Não existe entre aqueles dois crimes qualquer relação determinante de concurso aparente de normas, nomeadamente consunção.

9- Ocorrendo entre tais crimes verdadeiro concurso real ou efectivo, deve o arguido ser condenado pelo crime de detenção ilegal de arma, p. e p. pelo art.º 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27/6, na redacção dada pela Lei n.º 98/2001, de 25/8, em pena de prisão efectiva a cumular com a que lhe foi aplicada pela prática do crime de roubo.

10-Ao ter decidido como se decidiu, violou o tribunal a quo o disposto nos artigos 30.º, n.º 1, 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), com referência ao art.º 204.º, n.º 2, f), todos do Código Penal, e art.º 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27/6, na redacção dada pela Lei n.º 98/2001, de 25/8, não se podendo, em consequência, manter.

Termina pedindo, no provimento do recurso, a alteração da decisão recorrida com a condenação do arguido também como autor material de um crime de detenção ilegal de arma, em pena de prisão a cumular com a que lhe foi aplicada pela prática do crime de roubo.

Respondeu o arguido em defesa do julgado.

Subidos os autos, foi promovida a designação de dia para julgamento.

A única questão a decidir, consiste assim em saber se foi ou não acertada a decisão de absolver o arguido da autoria de um crime de detenção ilegal de arma, tido por consumido no acórdão recorrido, pelo crime de roubo.

  1. Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir.

    Factos provados 1. No dia 6 de Fevereiro de 2006, cerca das 12h30, o arguido, que se fazia transportar no ciclomotor, de marca "S...", modelo "TS", de cor azul e amarelo, sem matrícula, com o número de quadro SA11A-..., e o número de motor A 109 - ..., dirigiu-se à farmácia denominada "Farmácia de R...", sita em R..., Paredes, pertencente a BB, com o intuito de se apropriar das quantias em dinheiro que se encontrassem na posse das funcionárias daquela farmácia e que estas detinham em razão do seu ofício, mesmo que para o efeito tivesse de as atemorizar, molestar no seu corpo ou na sua saúde, ou até disparar sobre elas, se necessário; 2. Para tanto, o arguido muniu-se de uma pistola com carregador, semi-automática, de calibre 6,35 mm B... (. 25 ACP ou.25 Auto na designação anglo-americana), de marca "T... G...", de modelo GT 27, com o número de série D..., de origem italiana, em boas condições de funcionamento, contendo quatro munições, de calibre 6,35 mm B..., de marca "G...", de origem alemã, em boas condições de utilização; 3. Uma vez no interior da aludida farmácia, o arguido aproximou-se da funcionária CC- que aí se encontrava a trabalhar -, apontou-lhe a pistola aludida no ponto anterior e ordenou-lhe, em tom grave e sério, que lhe entregasse o dinheiro que estava nas caixas registadoras, junto ao balcão de atendimento; 4. Em pânico, temendo que o arguido lhe causasse mal irreparável na saúde ou lhe tirasse até a vida, a CC, incapaz de resistir, entregou ao arguido a quantia de € 115,00 (cento e quinze euros), em notas, correspondente às receitas parciais desse dia, dinheiro que o arguido fez dele, apesar de saber que não lhe...

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