Acórdão nº 346/08.0TBLSA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução07 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: “AA”, residente na R.. H… M…, Lote x, n.º xx, F…, V…, L…, propôs a presente acção declarativa comum, sob a forma de processo ordinário, contra “BB” e marido, “CC”, residentes na R… do M… V…, Lote xx, V… N… de M…, pedindo que, na sua procedência, se declare a invalidade da procuração, outorgada em 26 de Janeiro de 2006, perante o Notário “DD”, na L…, pela autora, a favor da ré mulher [a], se declare a nulidade da escritura pública, outorgada a folhas x e y, do livro xx, do Cartório Notarial de L..., do Notário “EE” – escritura pública de compra e venda outorgada, em 2 de Fevereiro de 2006, pela ré mulher, pela qual esta, por si e em representação da autora, declarou vender a si própria o prédio urbano, composto por casa de habitação de c…, …, 1.º andar, logradouro e jardim, sito na R… H… M…, Lote x, n.º xx, F…, V…, L…, inscrito na respectiva matriz predial, sob o artigo XXXX°, e descrito na Conservatória do Registo Predial da L..., sob o n.º XXXX [b], sejam os réus condenados a reconhecer o direito de propriedade da autora sobre aquele prédio [c], se declare o direito de propriedade da autora sobre o referido prédio [d], e se ordene o cancelamento do registo efectuado pela segunda ré, sob a apresentação n.º 07, de 16 de Junho de 2006, na descrição predial urbana da Conservatória do Registo Predial da L..., sob o n.º XXXX/XXXXXXXX, e, subsidiariamente, em primeiro grau, para o caso de improcedência dos pedidos antecedentes, a autora pede a condenação dos réus a pagar-lhe o preço real e efectivo daquele prédio, no valor de 250.000,00 euros [e] e, também, subsidiariamente, mas, em segundo grau, para o caso de improcedência do pedido subsidiário antecedente, pede ainda a condenação dos réus a pagar-lhe o preço de 75.000,00 euros, pelo qual declararam adquirir o mencionado prédio.

Com vista a lograr o êxito da sua pretensão e como fundamento da mesma, a autora alega, em síntese, que, no inicio de 2006, solicitou à ré mulher, que é filha de uma sua sobrinha, que diligenciasse, como sua procuradora, pela venda da sua casa de habitação, para, posteriormente, a autora dividir o produto dessa venda pela ré e por um outro sobrinho, tendo, para o efeito, em 26 de Janeiro de 2006, outorgado uma procuração, mas sem que se tivesse apercebido do respectivo conteúdo, nomeadamente, da expressão “negócio consigo mesmo”.

A autora nunca teve intenção de vender a casa à ré, nem nunca foi esse o poder que quis facultar-lhe, sendo certo que esta nunca lhe disse que lhe iria comprar a casa de habitação.

Porém, em 2 de Fevereiro de 2006, a ré mulher, munida da mencionada procuração, outorgou, em Lisboa, a aludida escritura de compra e venda, em que declarou vender, a si própria, o dito prédio, pelo preço de 75.000,00 euros, sendo certo que a autora nunca entregou o imóvel, nem tal lhe foi referido ou solicitado, nem recebeu qualquer preço, e que o valor mínimo da avaliação para venda do mesmo seria sempre de 250.000,00 euros, tendo a ré exorbitado os poderes que a autora lhe quis conferir, agindo contra a intenção e vontade da mandante.

Na contestação, os réus concluem pela improcedência da acção, pedindo a condenação da autora como litigante de má fé, em multa e indemnização, bem como, para o caso de assim não se entender, a procedência da excepção de compensação, no montante de 13.261,73 euros, impugnando grande parte da factualidade descrita na petição inicial e alegando que a autora queria beneficiar a ré mulher, pretendendo que fosse esta a ficar com a sua casa, ao mesmo tempo que se queixava de falta de dinheiro, pelo que, para fazer face a despesas, existentes e futuras, a autora e a ré mulher acordaram em que a casa daquela seria vendida aos réus, pelo preço de 75.000,00 euros, preço esse que seria pago, de forma faseada, através da satisfação de despesas da autora.

Que a autora disse que gostaria de ir viver junto dos réus e foi por sua vontade que outorgou a procuração, conhecendo as implicações do acto; que, tal como foi acordado entre aquele e estes, foi outorgada a escritura pública a favor dos RR., do que foi dado conhecimento à A. que ficou satisfeita e agradecida, tendo ficado também acordado que esta estaria na casa até querer; na sequência do assim acordado os réus liquidaram despesas da autora, no valor de 13.261,73 euros, fazendo-o por conta do preço da venda da casa.

Porém, caso qualquer um dos pedidos da autora venha a proceder, deverá a mesma reembolsar os réus naquele aludido montante de 13.261,73 euros, ou, então, que este seja deduzido a qualquer montante que os réus venham a ser condenados a pagar.

Na réplica, a autora defende a improcedência da excepção de compensação, impugnando muita da factualidade alegada pelos réus, e conclui como na petição inicial.

A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente e, em consequência, condenou a ré mulher, “BB”, a pagar à autora, “AA”, a quantia, subsidiariamente, peticionada, de €75.000,00 e, no mais, absolveu os réus do pedido, julgando ainda improcedente, por não provado, o pedido incidental de condenação, por litigância de má fé, deduzido pelos réus, absolvendo, por isso, a autora deste pedido.

Desta sentença, a autora interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado a acção, parcialmente, procedente e, em consequência, declarou a ineficácia, relativamente à autora, da compra e venda realizada pela ré mulher, através da escritura pública, outorgada em 2 de Fevereiro de 2006, a folhas x/y, do Livro xx do Cartório Notarial de L... do Notário “EE”, condenando os réus a reconhecerem o direito de propriedade da autora sobre o prédio urbano, sito na R.. H… M…, Lote x, nº xx, F…, V…, L…, inscrito na matriz predial, sob o artigo xxxx, e descrito na Conservatória do Registo Predial da L..., sob o nº xxxx, e ordenando o cancelamento do registo efectuado pela ré mulher, sob a presentação nº 07, de 16 de Junho de 2006, na descrição predial urbana da Conservatória do Registo Predial da L..., sob o nº xxxx/xxxxxxxx.

Do acórdão da Relação de Coimbra, os réus interpuseram recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação integral, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem, na totalidade: 1ª – Não podia a recorrente ser condenada em objecto diverso do pedido, já que os factos que levaram à condenação objecto do presente recurso, além de não terem sido formulados pela recorrida, nem sequer foram alegados na petição inicial ou até ao encerramento da discussão em 1ª instancia.

  1. - A recorrida, como lhe competia, não alegou quaisquer factos concretos que consubstanciem a figura do abuso de representação.

  2. - Até ao encerramento da discussão a recorrida não alterou o pedido ou a causa de pedir, pelo que a recorrente apenas teve oportunidade de contestar o pedido inicialmente deduzido e os factos inicialmente alegados, assim como produzir prova sobre os mesmos.

  3. - À recorrente não lhe foi permitida, por que não era exigível, efectuar prova ou contra-prova sobre os factos que consubstanciam o alegado abuso de representação, tendo sido coarctada do direito ao contraditório.

  4. - O Acórdão do S.TJ. de 23/01/2001 (DR, I-A, nº 34, de 09/02/2001) mencionado pela Relação de Coimbra em nada se assemelha ao caso em apreço, já que na situação referida no citado Acórdão do...

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