Acórdão nº 995/07.3TBCTB.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução04 de Novembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

N Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA Sumário : I- «A separação de facto desfaz efectivamente a comunidade, mas não o vínculo conjugal», como escreveu Maria Nazareth Lobato Guimarães no seu estudo Reforma do Código Civil, 1981, pg 191.

II- Nessa medida, importa ter sempre presente que se o vínculo conjugal se mantém, com ele, se mantém também o dever conjugal de assistência que emana de tal vínculo jurídico, pois como escreveu o saudoso Conselheiro Abel Pereira Delgado, «não deve confundir-se a obrigação alimentar que impende sobre ambos os cônjuges com o dever de alimentos genericamente regulado nos artigos 2003º e segs. As regras são diferentes. O dever conjugal recíproco de alimentos deriva directa e imediatamente do casamento e não supõe qualquer acordo prévio ou antecedente litigioso, enquanto a obrigação de alimentos regulada nos artºs 2003º e segs. é fruto de convenção entre as partes ou de decisão judicial» ( A. Delgado, Divórcio, pg.46).

III- Daí que o legislador tenha isentado desse dever apenas o cônjuge que não tenha dado causa à separação, ainda que tenha saído do lar conjugal por culpa do outro, isto é, por facto censurável subjectivamente ao carente de alimentos, compelindo à saída do « inocente» do lar conjugal, não sendo, assim, «imputável» a este a saída do referido lar.

IV- Se a separação não for imputável a qualquer dos cônjuges, o dever de assistência mantém-se durante a separação de facto (nº 2 do referido artigo) VI- Se ambos derem causa à separação de facto ou se só um deles for culpado de tal quebra, o dever de assistência só incumbe, em princípio, ao único ou principal culpado (nº 3 do mesmo preceito).

VII- Parece socialmente adequado e de inteira justiça que o cônjuge não culpado, ainda que tenha saído da casa por motivos imputáveis ao outro, não possa ser coercivamente compelido à prestação alimentícia a quem deu causa a tal separação.

Decisão Texto Integral: RELATÓRIO AA intentou, em 14 de Junho de 2007, a presente a acção com processo ordinário contra BB pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia mensal de € 350,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da propositura da acção, além de uma quantia a título de alimentos provisórios.

Alegou, em síntese, que o Réu deixou de residir em E........ com a Autora, com quem é casado, indo residir e trabalhar para o Algarve, sendo que os cônjuges se deixaram de encontrar um com o outro desde o Natal de 2006; que desde Novembro de 2006, o Réu deixou de contribuir para os alimentos da Autora e encargos da vida familiar; que a Autora não tem quaisquer rendimentos nem dispõe de condições de saúde que lhe permitam trabalhar, tendo, ainda, que suportar € 78,00 da prestação da casa; e que o Réu aufere rendimentos superiores a € 1.000 e vive em casa da mãe.

Contestou o Réu alegando, em síntese, que, depois de ter sido alvo de maus tratos físicos e psíquicos, teve de deixar a casa de morada de família em Julho de 2004, por ter sido expulso de casa pela Autora que o ameaçou de morte; que desde então nunca mais viveram como casal; que a Autora não sofre de doença incapacitante para o trabalho, ela é que nunca quis trabalhar; que aufere vencimento entre os € 860 e 875, que vive em casa arrendada, pela qual paga € 300,00 de renda, suporta a prestação da casa de € 78,13 e ainda auxilia financeiramente a sua mãe, pelo que não dispõe de capacidade financeira para prover alimentos à autora.

Foi proferido despacho saneador, no qual se julgou inadmissível a cumulação de pedidos, absolvendo-se o Réu da instância no que toca ao pedido de fixação de alimentos provisórios.

De seguida, no mesmo despacho, foram seleccionadas as matérias assente e controvertida.

Procedeu-se, então, a julgamento, findo o qual se respondeu à matéria da base instrutória sem reclamações.

Após o que foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu o Réu do pedido.

Inconformada, interpôs a Autora recurso de Apelação da sentença para o Tribunal da Relação de Coimbra que, julgando a Apelação procedente, revogou a sentença recorrida e condenou o Réu a pagar à Autora, a título de alimentos e desde 14 de Junho de 2007, a quantia mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).

Inconformado, veio o Réu interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES 1ª - A matéria de facto considerada assente nos autos deve ser ampliada, nos termos das disposições dos artigos 264.°, n.° 2 e 729.° do Código de Processo Civil; 2ª - Devem ser acrescentados os seguintes factos, que, apesar de acessórios são de toda a pertinência para a boa decisão da causa: i) A autora andou a correr atrás do réu com uma faca, em momento imediatamente anterior à partida do réu para a cidade de Lagos, em 2004; ii) A autora muitas vezes batia no réu; iii) A convivência entre o casal era conflituosa, em particular quando a autora ficava muito nervosa; iv) Numa ocasião, o veículo do réu, foi levado de Alcains, onde o réu trabalhava, por a autora o ter ido buscar, deixando-o apeado.

3ª Foi erroneamente interpretado e aplicado ao presente caso o disposto no artigo 1675.°,nºs 2 e 3 do Código Civil; 4ª Ao considerar que "para se livrar da obrigação de alimentos, incumbe ao demandado provar o facto negativo impeditivo de a separação de facto em causa lhe não ser imputável", o douto acórdão recorrido viola o artigo 342.° do Código Civil; 5ª Em face da factualidade provada, deve entender-se que a separação de facto não é imputável ao réu ora recorrente; 6ª Antes se deve considerar que a...

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