Acórdão nº 02A4464 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelAFONSO CORREIA
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Dizendo-se proprietária, por doação verbal de seus pais, de um prédio rústico, que identifica, onde, com conhecimento e autorização deles, construiu a sua habitação, e usurpada nos seus direitos por parte dos réus, mediante a abusiva inscrição a seu favor e dos próprios autores, em comum e sem determinação de parte ou direito, na Conservatória do Registo Predial, da casa construída, os autores A e marido B pedem a condenação dos réus C e outros a) - a reconhecer que os autores são donos e legítimos proprietários do prédio urbano identificado no artigo 5º da petição; b) - a reconhecer e respeitar que o direito de propriedade dos autores sobre a casa identificada no artigo 5º e do terreno identificado no artigo 2º da petição, onde a mesma foi edificada, lhes adveio através do instituto da usucapião; c)- se assim se não entender, sempre a reconhecer e respeitar que por acessão industrial imobiliária os AA adquiriram a propriedade do prédio rústico identificado, mediante o valor que o mesmo tinha antes da construção da casa; d) - verem cancelados todos e quaisquer registos efectuados a seu favor, designadamente aquele que foi feito com base na relação adicional de bens, por óbito de D, relativamente à casa referida; e e) - indemnizar os autores por danos morais, no montante de 500.000$00, e patrimoniais a liquidar em execução de sentença

Na contestação os réus, apresentando diversa versão dos factos, qualificam de "farsa laboriosamente construída" a acção e de "pura fantasia" o pedido indemnizatório, pois nunca os pais da A. lhe deram o identificado terreno nem foi ela, mas sim os pais, quem construiu a casa nele existente

Saneado e condensado o processo, procedeu-se a julgamento com intervenção do Colectivo que decidiu a matéria de facto perguntada no questionário a que se seguiu sentença a decretar, no essencial, a procedência da acção

A Relação de Coimbra anulou o julgamento por contradição entre as respostas aos quesitos 13º e 23º, na sequência do que se procedeu a 2° julgamento e foi proferida nova sentença que, julgando procedente a acção, condenou os réus nos pedidos referidos nas alíneas a), b), d) e e), reduziu o montante da indemnização líquida a 400.000$00, e ainda, condenou os RR, como litigantes da má fé, na multa de 200.000$00

Inconformados, apelaram os RR, mas a Relação confirmou inteiramente o julgado, depois de manter intacta a matéria de facto apurada pelo Colectivo

Ainda irresignados, pedem os RR revista, insistindo na revogação do decidido por estarem plenamente provados factos que tal determinam, ser exagerado o montante arbitrado por danos não patrimoniais e não terem sido definidos os critérios tidos por relevantes para a determinação da medida da multa Tudo como se vê da alegação que coroaram com as seguintes Conclusões 1- O doc. de fs. 353, ao contrário do referido no douto Acórdão recorrido, não é a relação de bens - é sim uma declaração feita pela Recorrida, em seu próprio nome (e não a rogo da cabeça-de-casal), na qual a mesma declara que "a favor dos interessados mencionados no termo de declaração de folhas 2 (nos quais se inclui a própria Recorrida) não se operou qualquer outra transmissão de bens a título gratuito, provinda do autor da sucessão". 2 - Esta declaração foi feita perante um oficial público (funcionário da repartição de finanças) em 26/3/1984, pelo que faz prova plena de que a Recorrida esteve no dia 26/3/1984 na Repartição de Finanças e que aí prestou as supra referidas declarações. 3 - Assim, ao contrário do referido no douto Acórdão recorrido, este termo de declaração feito pela Recorrida em 26/3/1984 é um documento autêntico, nos termos dos art. 369º e seguintes do Código Civil, sendo que a certidão constante do processo a fls. 349 e seguintes também terá essa mesma força probatória plena em virtude do disposto no art° 383º do Código Civil. 4 - Deste modo, encontra-se plenamente provada pelo documento autêntico de fs. 353, assinado pela Apelada (em seu próprio nome), a declaração feita por esta em 26/3/1984 de que a seu favor (e dos restantes interessados) não se operou qualquer transmissão de bens a título gratuito, provinda do autor da sucessão (D); 5 - Acresce que não foi arguida a falsidade desse documento pela Recorrida e que esta aceitou que a assinatura aí contida era sua (cfr. fls. 358). 6 - Assim sendo, estando a autoria reconhecida (art. 371° do Código Civil), o documento supra referido faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor e consideram-se provados os factos compreendidos na declaração na medida em que forem contrários aos interesses da declarante (art. 376°, n.º 2º do Código Civil); 7 - Tal documento constitui ainda uma confissão expressa, feita pela Recorrida perante os restantes herdeiros, de que o terreno não lhe tinha sido doado, nos termos do art. 358°, n° 2, do Código Civil, sendo mais uma razão pela qual esse documento e os factos nele contidos têm força probatória plena. 8 - Sendo assim, tal facto devia ter sido julgado provado pelo douto Acórdão recorrido, nos termos do art° 659°, n° 3 e 712°, n° 1, al. b) do C.P.C., por estar plenamente provado por documento e por ter sido alegado pelos Recorrentes, na sua contestação, que não houve qualquer doação do terreno a favor da Recorrida; 9 - Acresce que, em consequência, não devia ter sido julgado provado o quesito 1°, uma vez que aí se dá por provado, com base em prova testemunhal, que o falecido D e mulher C, ora Recorrente, tinham transmitido (doado) à Apelada, a título gratuito, o terreno identificado em C) para esta aí construir uma casa; assim, atento o supra referido documento, não era admissível a prova testemunhal desse quesito 1°, nos termos do art° 393°, n° 2 do C.C. (ou, de qualquer modo, nos termos do art° 394°, n° 1 do mesmo Código); 10 - Pela mesma razão, não devia ter sido julgado provado o quesito 13°, na parte em que diz que a Apelada sempre utilizou o terreno "na convicção de ser dona do mesmo" (animus); 11 - De qualquer modo, sempre o referido documento e as respectivas declarações da Recorrida (fls. 353) constituirão um reconhecimento, perante a cabeça-de-casal e restantes herdeiros, de que o terreno não lhe foi doado e que, como tal, continuava a pertencer à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de D; 12 - Ou seja, sempre provocará a interrupção do prazo de usucapião, nos termos do art° 325° do Código Civil, ex vi do art° 1292° do mesmo Código; 13 - Assim sendo, em 19/6/96, data da interposição da acção, ainda não estavam decorridos os 15 anos necessários para a usucapião (nem posteriormente à interposição da acção tal prazo se completou, uma vez que a instância foi declarada interrompida por despacho de 5/12/97); 14 - Como a usucapião sobre o terreno não pode proceder, mesmo que se considerasse que foi a Autora/Recorrida quem construiu a casa, pagando-a, tal construção foi feita com materiais próprios em terreno alheio, pelo que só pelo fenómeno da acessão industrial imobiliária poderiam os Autores/Recorridos adquirir o direito sobre o terreno e sobre a casa, dependendo do valor de uma e outra; 15 - Como tais valores não se encontram determinados, uma vez que os quesitos 14° e 15° foram julgados não provados, deverá a acção ser julgada improcedente por não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT