Acórdão nº 02A4566 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Fevereiro de 2003

Magistrado ResponsávelAZEVEDO RAMOS
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 23-10-95, "A" instaurou, no Tribunal Judicial de Ponta do Sol, a presente acção ordinária contra os réus B e "Colégio Missionário C", pedindo: a) - se declare que autora é dona e legítima possuidora do prédio misto identificado na petição inicial, quer por usucapião, quer por o ter adquirido por contrato de compra e venda, titulado pela escritura de 9-12-88; b) - se assim não for entendido, se declare que é dona de metade do mesmo prédio e, em compropriedade com seus irmãos, de todo o prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 2286º, como herdeiros instituídos de D, que o construiu após a morte do marido, E; c) - condenar-se os réus a reconhecerem tal direito de propriedade a favor da autora; d) - declarar-se que os registos do prédio efectuados na respectiva Conservatória, a favor dos réus, são nulos e de nenhum efeito; e) - ordenar-se o cancelamento das inscrições do mesmo prédio efectuadas na Conservatória a favor dos réus; f) - declarar-se nula ou anulada a escritura de doação de 22-6-94, feita pelo "Colégio Missionário C" a favor da ré B. Fundamentou a sua pretensão, em síntese, no seguinte: - nulidade da disposição testamentária de bens comuns do casal, feita em 13-2-67, pelo indicado E, por falta de aquiescência do respectivo cônjuge, D; - posse usucapiente da autora sobre o prédio, acrescida à da anterior proprietária D; - aquisição do direito de propriedade sobre o prédio, por via do contrato de compra e venda celebrado entre a autora e a dita D, em 9-12-88; - nulidade do contrato de compra e venda do direito de usufruto relativo ao mesmo prédio, outorgado em 6-4-94, entre a ré e F; - nulidade do contrato de doação referente à nua propriedade do ajuizado prédio, efectuado em 22-6-94, pelo "Colégio Missionário C" a favor da ré. Contestou a ré B, afirmando, em síntese: - a validade da disposição testamentária feita pelo E, em razão da aquiescência do respectivo cônjuge; - a nulidade do contrato de compra e venda relativas ao mencionado prédio, celebrado entre a autora e a D, por ter infringido o encargo fideicomissário de conservar o prédio e, por sua morte, o transmitir ao "Colégio Missionário C"; - a validade dos indicados contratos de compra e venda do usufruto e de doação; - ter sofrido um prejuízo resultante da ocupação ilegal pela autora, do mesmo prédio, desde a data em que o comprou à D. Em reconvenção, pediu: a) - se declare que a reconvinte é proprietária e legítima possuidora da totalidade do prédio em questão e se condene a autora a reconhecer tais direitos; b) - se condene a autora a restituir o prédio que ilicitamente ocupa; c) - se condene a autora a pagar a quantia de 4.800.000$00, como indemnização pela ocupação abusiva do prédio desde 6-4-94, acrescidos de 3.200.000$00, por cada ano, até à efectiva entrega do mesmo prédio. Houve réplica. Realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 13-3-98, que julgou parcialmente procedente a acção e procedente a reconvenção. Apelou a autora e a Relação de Lisboa, por Acórdão de 15-12-99, anulou o julgamento para ampliação da matéria de facto. Cumprido o determinado pela Relação, com o aditamento ao questionário do quesito 19º, foi realizado o segundo julgamento, após o que houve lugar a nova sentença, em 15-10-01, que decidiu: Julgar a acção parcialmente procedente e, por isso: a) - declarar que o prédio urbano, com a área coberta de 106 m2 e logradouro de 64 m2, inscrito na matriz sob o art. 2286º, propriedade outrora de D, faz parte da herança por esta deixada, de que é herdeira a autora; b) - condenar os réus a reconhecerem o direito declarado a favor da autora; c) - absolver os réus dos demais pedidos; Julgar parcialmente procedente a reconvenção e, consequentemente: a) - declarar a reconvinte proprietária do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial da Ponta do Sol sob o nº 00465/080591, com excepção da casa de habitação inscrita na matriz sob o art. 2286º; b) - declarar válidos os registos efectuados, sem prejuízo da anterior declaração; c) - condenar a autora a reconhecer a anterior declaração de propriedade, nos termos em que foi efectuada; d) - condenar a autora a restituir à ré o prédio que ocupa (excepto a casa de habitação inscrita na matriz sob o art. 2286º); e) - condenar a autora a indemnizar a ré pelos prejuízos decorrentes da ocupação da restante parte do prédio, desde 6-4-94, até à efectiva entrega, a liquidar em execução de sentença. Irresignada, apelou a autora, de novo, mas sem êxito, pois a Relação de Lisboa, através do seu Acórdão de 20-2-2002, negou provimento à apelação e confirmou a sentença recorrida.. Continuando inconformada, a autora recorreu de revista, cujas alegações culminam com estas sintetizadas conclusões: 1 - No domínio da vigência do Código Civil de Seabra, o consentimento para a disposição da meação de bens comuns para depois da morte, quando não fosse prestada no próprio testamento, tinha de ser dado por forma autêntica. 2 - De acordo com o disposto no art. 2482º do Código Civil de 1867, a falta de documentos autênticos não pode ser suprida por outra espécie de prova, salvo nos casos em que a lei assim o determinar expressamente. 3 - Pelo que o averbamento nº 2, constante do ajuizado testamento, é insusceptível de substituir a prova de manifestação de vontade da aquiescência do cônjuge D por forma autêntica, tal como é exigido pelo referido art. 1776º do Cód. Civil de 1867. 4 - Não foi apresentado documento autêntico pelo qual D tenha dado a sua aquiescência à disposição do bem comum do casal feita pelo testador, pelo que o quesito 19º teria de ser julgado não provado. 5 - O acórdão recorrido, ao declarar a inexistência da resposta ao quesito 19º e ao considerar assente o conteúdo externo e interno do averbamento notarial em causa, violou o disposto nos arts. 1776º, 2426º, 2427º e 2428º do Cód. Civil de 1867, os arts. 525º, 526º e 257º do Cód. Proc. Civil de 1961, os arts. 50º, 61º a 70º e 112º a 115º do Cód. Notariado de 1960 e o art. 655º, nº 2, do actual C.P.C. 6 - A recorrente, não obstante não ter intentado uma acção declarativa de falsidade do referido averbamento, nos arts. 16º e 17º da petição inicial arguiu a falsidade desse averbamento, integrando-o na causa de pedir da acção. 7 - Pelo que, integrando essa questão o objecto do processo, a mesma não pode deixar de ser conhecida e julgada, sob pena de omissão de pronúncia e, nessa medida, de nulidade, nos termos do art. 661º, nº 1, al. d) do C.P.C. 8 - Incumbia à recorrida B o ónus da prova da existência do referido documento autêntico, cuja omissão é insuprível, isto é, a prova do facto extintivo invocado pela autora e constitutivo do pedido reconvencional. 9 - Prova essa que não foi feita pela ré, pelo que devia ter-se decidido que não foi dada aquiescência, por forma autêntica, pela D, à disposição dos bens comuns no dito testamento. 10 - Por isso, também foi violado o disposto no art. 342º, nºs 1 e 2 do Cód. Civil. 11 - O fideicomisso instituído no aludido testamento é nulo, por abranger a meação do cônjuge do testador, devendo a cláusula fideicomissária ter-se por não escrita...

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