Acórdão nº 02P1895 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2002 (caso NULL)
Magistrado Responsável | CARMONA DA MOTA |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Comum colectivo 181/00 de Sesimbra (1) Arguido/recorrente: A (2) 1. OS FACTOS Em finais de 1996 ou inícios de 1997, um grupo constituído por B, cidadão português, C, cidadão marroquino, e D, cidadão espanhol, decidiram unir esforços para de forma concertada, estável e continuada, procederem à aquisição, transporte e distribuição de produtos estupefacientes. Para o efeito, adquiriam elevadas quantidades de haxixe, em Marrocos, e de cocaína, na Colômbia e outros países da América do Sul. Depois, a partir de locais pré-determinados, e em regra por via marítima, procediam ao transporte dos ditos produtos até à costa litoral portuguesa, normalmente entre o Algarve e Sesimbra, onde eram recolhidos e armazenados, após o que destinavam o haxixe e a cocaína a todo o território nacional, a Espanha e ao continente europeu. Esse grupo procurava preferencialmente a costa portuguesa para os desembarques, por entender que essa era a melhor solução para o bom êxito das operações. Tal grupo, devidamente organizado, visando a obtenção de avultados proveitos económicos mediante a compra, venda e transporte desses produtos, sediou os seus centros de operação em locais não determinados de Espanha, enquanto em Portugal viria a desenvolver a sua actuação, principalmente na zona de Sesimbra. De tal actividade procurava retirar elevados proventos económicos, o que conseguiu. Para melhor dissimular essa actividade, bem como os lucros da mesma resultantes, decidiram que utilizariam empresas já constituídas, ou a constituir. Para esse efeito, utilizaram a sociedade "...... - Produtos do Mar, L.da", com sede em Peniche, cujo objecto social inscrito no registo é o comércio, produção e industrialização de produtos alimentares, designadamente de pescado e marisco, sua importação e exportação e, ainda, o fabrico de gelo, tendo o capital social de 10.000.000$, dividido em duas quotas, uma no valor de 7.400.000$ pertencente a E, c. c. F e outra de 2.600.000$ pertencente a D. Com a mesma intenção, em 17Dez97, procederam ao registo do contrato de sociedade da "......, L.da.", com sede na Amadora, tendo como objecto social inscrito a construção civil, obras públicas e imobiliário e o capital de 10.000.000$, dividido em duas quotas de igual valor uma de G e outra do arguido B, este nomeado gerente. Em meados de 1997, B começou a manter contactos com o arguido A, indivíduo que já conhecia dos tempos em que ambos tinham estado presos, em cumprimento de penas por tráfico de estupefacientes, no sentido de o convidar a aderir à actividade a que o grupo se vinha dedicando. O arguido A anuiu a essa proposta, com intenção de vir a obter avultadas quantias económicas. Conhecedores das dificuldades por que passava o sector pesqueiro nacional, os mesmos logo acordaram que procederiam, em Portugal, à compra de embarcações ou à contratação de embarcações com as respectivas tripulações, por forma a efectuarem o transporte de estupefacientes que viriam a adquirir, em especial em Marrocos e na América do Sul. Com vista a essa actividade, o arguido A, que até ao ano de 1996 havia trabalhado numa unidade hoteleira de Sesimbra, resolveu contactar pessoas da sua confiança e arranjar forma de adquirir as embarcações que lhes faziam falta. Então, contactou os arguidos H, I e J, este seu irmão e, após os informar dos contactos que havia tido com B, convidou-os a fazerem também parte do grupo. Estes acederam a tal proposta, com intenção de obterem elevadas quantias económicas. Por forma a dissimularem essa actividade, bem como os lucros resultantes da mesma, o arguido A acordou com os arguidos H e J constituírem uma sociedade que se dedicasse à comercialização de pescado. Assim, em 3Abr97, constituíram a sociedade Viveiros das Caixas, Comércio de Produtos Alimentares, L.da, com sede em Sesimbra, com o objecto social de comércio de bens alimentares, importação e exportação, exploração de restaurante, cervejaria, marisqueira e similares, com o capital social de 900.000$00, dividido em três quotas iguais, ficando a gerência a pertencer ao arguido A. Com vista a essa mesma actividade de tráfico de estupefacientes, o arguido A, em Mai97, deslocou-se a Quarteira, Algarve, e aí adquiriu, a ....., a embarcação de pesca de nome "Veraliza", pelo preço de 6.000.000$, que pagou, por duas vezes, em notas. Pelo menos parte desse dinheiro, havia-lhe sido entregue pelo referido grupo, a que ele aderira e de que passara a fazer parte integrante e elemento activo, tratando-se de um adiantamento respeitante a futuros transportes de estupefacientes que viriam a ser efectuados a pedido do mesmo grupo. Desde então, não mais o arguido A, com o conhecimento, acordo e colaboração dos arguidos H, I e J, deixou de diligenciar no sentido de levar por diante tal projecto. Assim, em 18Jun97, deslocou-se a Vigo e aí manteve contactos com outras duas pessoas. Durante o mês de Set97, novamente a título de adiantamento respeitante a futuros transportes de estupefacientes projectados para serem efectuados para o mesmo grupo, voltou a receber, pelo menos, a quantia de 47.200.000 pesetas, quantia essa que entregou ao arguido I, que, no dia 30Set97, na agência de Grândola da CGD, a cambiou por 56.998.010$, que veio a depositar na sua conta à ordem n.º 0771.001933300, agência de Sesimbra da CGD. No dia 14Out97, o arguido I transferiu essa quantia para a Holanda, para uma conta existente na agência do Rabobank, em Dordrecht (conta n.º 11315331429), em nome do arguido A. Em 15Out97, na sequência das diligências que entretanto havia efectuado, e tendo já depositada a tal quantia na sua conta, o arguido A adquiriu na Holanda, por 330.000 dólares, correspondente a 59.000.000$, a embarcação de pesca de nome "Catharina Elisabeth", que chegou a Lisboa, às instalações da "Docapesca", em Alcântara, no dia 23, tendo como tripulantes o proprietário, o arguido A, e os arguidos I, H e K e onde ficou acostada até ao dia 06Jan98, data em que deu entrada no porto de Sesimbra, onde permaneceu durante cerca de quatro meses, para reparação, nomeadamente a instalação de um túnel de congelação, um dessalinizador e um sistema de ar condicionado, cujo custo ascendeu a 38.677.950$, pagos pelo arguido A. Durante o período de permanência da embarcação no porto de Sesimbra, o arguido A, assim como os arguidos I e J, efectuaram inúmeros contactos telefónicos para o estrangeiro, designadamente para o Brasil, Espanha e Holanda, alguns visando o tal objectivo de transportes de estupefacientes, nomeadamente da América do Sul para Portugal, o que o arguido A fez com consciência de estar a agir no interesse do mencionado grupo. Na sequência desses contactos com o grupo, acordou-se que a embarcação "Catharina Elisabeth" iria até próximo da costa sul-americana, onde aguardaria cocaína de uma outra embarcação. O arguido A aceitou proceder a todas as diligências para vir a concretizar aquele transporte de cocaína, utilizando para o efeito a embarcação "Catharina Elisabeth". Entretanto, o arguido A efectuou diligências com vista ao transporte de haxixe desde a costa marroquina até ao porto de Sesimbra, tendo mantido contactos com C para encontrar outra embarcação que possibilitasse a sua realização. No decurso dessas diligências, nas quais sempre contou com a colaboração dos arguidos J e H, contactou com o arguido L, pessoa que conhecia há vários anos, mestre da embarcação "Família ....", propriedade da sociedade Samapesca - Indústria de Pesca, L.da, de que também era sócio. Depois de ter comunicado a L o que pretendia dele, ficaram acordados entre ambos os pormenores do transporte de haxixe e o respectivo preço, pelo menos de sete milhões de escudos. Entre o dia 9 e o dia 14Jan98, a embarcação "Família ...." saiu do porto de Sesimbra, em direcção à costa marroquina, largando antes as artes de pesca junto ao Cabo Sardão. A tripulação era constituída pelo mestre L, por M, N, K e O, e pelo arguido I, homem de confiança de A. L, M, K, O e I, sabiam que iria ser efectuado um transporte de haxixe desde Marrocos para a costa portuguesa. O arguido N que, como pescador, era tripulante da embarcação "Família ....", apercebeu-se no decurso da viagem, logo que largadas as artes de pesca e a embarcação se dirigiu para a costa marroquina, de que iria ser efectuado um transporte de haxixe e, não obstante, aceitou colaborar nesse transporte com intenção de prestar uma ajuda ao L e obter vantagem patrimonial. Já na costa marroquina, o arguido I estabeleceu as comunicações com o fornecedor marroquino do haxixe e surgiu então uma lancha com 8 ou 9 metros, com vários indivíduos marroquinos, cujas identidades não foram apuradas, procedendo-se ao transbordo de 40 fardos de haxixe (cerca de 1.700 kg) para o interior da embarcação "Família ......". No regresso, recolheram as artes e entraram no porto de Sesimbra, onde descarregaram as celhas que continham o produto estupefaciente, tapadas pelas artes de pesca. Para aquele acto de descarregamento tiveram a colaboração de ....., elemento da Brigada Fiscal de Sesimbra, que, a troco de 500 contos, lhes forneceu informações para conseguirem, em segurança, entrar no porto e procederem ao descarregamento, sem serem vistoriados. Aportado o «Família ....» no porto de Sesimbra, as celhas com o estupefaciente foram carregadas na viatura Mitsubishi Canter FC, propriedade da firma "Samapesca". Nesse carregamento, participaram entre outros os arguidos P e Q, ambos empregados de terra da "Samapesca", que, durante ele, se aperceberam que se tratava de estupefaciente, mas, na intenção de ajudarem o L, não o suspenderam. Colocadas as celhas na viatura FC, esta seguiu, conduzida pelo arguido P, acompanhado dos arguidos L e K, até a um condomínio fechado na localidade de Cotovia, Sesimbra. Durante o trajecto, o arguido A seguiu atrás na sua viatura Mercedes-Benz KE. Os arguidos J e H deslocaram-se na viatura Fiat Brava HS, tendo sido o primeiro quem abriu o portão automático logo que a...
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