Acórdão nº 03A949 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2003

Magistrado ResponsávelPONCE DE LEÃO
Data da Resolução06 de Maio de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A", viúva, residente no lugar da Granja, Pombal, veio propor a presente acção de reivindicação contra B e sua mulher C, residentes no mesmo lugar, pedindo a condenação destes a: 1º) reconhecerem que ela, Autora, tem o direito de propriedade sobre o prédio urbano descrito no artº 1º da p. i.; 2º) restituírem-lhe o dito prédio, devoluto e totalmente livre de pessoas e de quaisquer objectos ou móveis todas as partes. Alega, para tanto, e em síntese, que: É dona do prédio que melhor identifica na p. i.; Os RR. ocupam, de início por mera tolerância e agora contra a sua vontade, grande parte desse prédio. Devidamente citados, veio a Ré C contestar e reconvir, tendo, em resumo, alegado que: São donos do prédio que melhor identifica no seu articulado, nele se integrando o urbano 3.423 reivindicado pela A. que, por mero favor dos RR, nele passou a residir a partir de 1996; e, que, A entender-se que a A. é dona de tal urbano, deve ter-se em consideração que os RR efectuaram obras de demolição e ampliação da casa actualmente inscrita sob o artº 3.423, nas quais foram despendidos mais de 4.000 contos, as quais não podem ser desintegrada do prédio sem perda ou deterioração, devendo tal valor ser pago pela Autora. Em reconvenção, pede a condenação da Autora, a: a) reconhecer que os RR são donos e legítimos possuidores da casa, logradouro, arrecadações e terreno anexo, tudo melhor identificado no art. 52º da contestação, inscrita na matriz sob o artigo urbano 3.423 e rústico 8.945; b) abster-se de, por qualquer forma, perturbar, impedir ou restringir o exercício dos seus direitos de uso, fruição e disposição desse prédio. Subsidiariamente, e para o caso de os RR não serem reconhecidos donos da parte urbana, pede a condenação da A. ao pagamento da quantia de 4.000.000$00, a título de indemnização correspondente às despesas por eles efectuadas com as obras executadas naquele urbano, quantia essa que deve ser actualizada e acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal até efectivo pagamento. A Autora apresentou resposta, mantendo o alegado na sua petição inicial, acrescentando que, quando muito, terão os RR procedido a algumas obras de melhoramento no pátio da casa, que deverão ser qualificadas como benfeitorias; pede, ainda, a condenação da Ré como litigante de má fé. Realizou-se a audiência preliminar, onde o Réu veio dar o seu expresso consentimento a que a Ré, sua mulher, estivesse sozinha em juízo para efeitos do pedido reconvencional por ela deduzido. Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixados os factos assentes e organizada a base instrutória, sem reclamação das partes. A Ré, em 14/12/1999, veio deduzir articulado superveniente, que foi mandado desentranhar e devolver à parte, por desatempado. Inconformada, veio a mesma interpor recurso de agravo, recebido com subida diferida. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância do formalismo legal, conforme resulta da respectiva acta, findo o que foi proferida douta decisão sobre a matéria de facto controvertida, sem reclamações. Foi, seguidamente, proferida sentença, que condenou os RR a reconhecerem a A. dona do prédio melhor identificado nos autos e a restituírem à mesma, devoluto e totalmente livre de pessoas e de quaisquer objectos e/ou móveis, todas as partes, dependências, arrecadações, compartimentos e espaços que ocupam do mesmo prédio, tendo julgado improcedente a reconvenção, sendo do respectivo pedido absolvida a Autora. A Ré foi, ainda, condenada como litigante de má fé. Inconformada, veio a Ré interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, que viria a proferir acórdão, onde se negou provimento ao agravo interposto e acima referido, e ainda julgou parcialmente procedente a apelação, tendo sido decidido: - confirmar a decisão recorrida na parte em que condenou os RR a reconhecerem o direito de propriedade da A. sobre o prédio inscrito na matriz urbana sob o artigo 3423 e na parte em que julgou improcedente o pedido reconvencional; - anular a decisão recorrida na parte em que ordenou a restituição do prédio à A., a fim de ser ampliada a matéria de facto nos termos constantes do acórdão, repetindo-se, quanto à mesma, o julgamento, com posterior decisão sobre tais questões, bem como naquela em que condenou a Ré como litigante de má fé. Foram dados como provados os factos seguintes: 1. Na matriz predial urbana da freguesia de Pombal, sob o artº 3423, está descrito um prédio composto de casa de habitação de r/c, construída em blocos, coberta de telha marselha, com 4 divisões e 4 vãos, com a superfície coberta de 28 m2, uma dependência de 21 m2, a confrontar do norte, poente e sul com D e do nascente com caminho, não descrito na CRP de Pombal - al. A) dos factos assentes; 2. A. e RR ocupam, actualmente, o prédio referido em A), nele habitando, o que ocorre contra a vontade da A. - al. B); 3. A casa de habitação e dependência referidas em A) foram construídas em 1959 pela A. e por um indivíduo chamado E, que com ela vivia maritalmente - resposta ao quesito 1º; 4. A partir de 1959 a A. utilizou-se do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Pombal sob o artº 3423, habitando a casa de habitação e utilizando-se da dependência que originariamente o constituíam, bem assim como habitando a casa de habitação e utilizando-se do salão com um forno e uma divisória, do barracão e do telheiro, que passaram a constituí-lo a partir das obras referidas na al. c) da resposta dada ao quesito 2º - resposta à alínea a) do quesito 2º; 5. A A. consentiu em que, primeiro o R., e depois de 7/2/76 os RR e os filhos destes, habitassem na casa de habitação e utilizassem a dependência que constituíam originariamente o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Pombal sob o nº 3423, do mesmo modo em que consentiu que os RR e os filhos destes habitassem a casa de habitação e utilizassem o salão com um forno e uma divisória, o barracão e o telheiro que passaram a constitui-lo a partir das obras referidas em c) da resposta dada ao quesito 2º - resposta à alínea b) do quesito 29 ; 6. Com consentimento da A., os RR levaram a efeito obras de reparação, conservação, remodelação e ampliação no prédio referido em A), em resultado das quais o mesmo passou a ser composto por casa de habitação com 75 m2, dotada, pelo menos, de 3 quartos, corredor, uma sala, uma casa de banho, uma cozinha, por um salão com um forno e uma divisória com 83 m2, por um barracão e um telheiro com uma área de cerca de 81 m2 - resposta à alínea c) do quesito 29; 7. Contíguo ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Pombal sob o nº 3423, com a composição que o mesmo tinha antes e depois das obras referidas em c) da resposta dada ao quesito 2º, existia e existe um terreno de cultivo que está identificado como estando inscrito no art. 8945 (parte) no croquis que constituí o documento 9 junto pela Ré em audiência de julgamento, terreno esse que a partir de 1959 também foi cultivado pela A., posteriormente pela A. e pelo R., e depois de 7/2/76 pela A. e pelos RR - resposta dada à alínea d) do quesito 2º; 8. Os actos referidos na resposta ao quesito 2º foram praticados à vista de toda a gente, sem violência e de forma pacífica, estando a A. convencida que não lesava, com os actos por ela praticados, direitos de outrem, o mesmo sucedendo com os RR em relação aos actos por eles praticados, já que os praticaram com o consentimento da A. e, enquanto este foi vivo, do E referido na resposta ao quesito 1º - alínea a) da resposta dada ao quesito 3º; 9. O referido na al. a) da resposta ao quesito 2º ocorreu ininterruptamente, a partir de 1959, com excepção de um período de tempo não superior a um ano, em que a A. viveu no casal Fernão João e de outro período de tempo de cerca de 8 anos em que a mesma viveu no Folgado, períodos esses anteriores a Agosto de 1996 - al. b) da resposta ao quesito 3º; 10. A A. cultivou o terreno de cultivo referido em d) da resposta ao quesito 2º de forma interrupta, desde 1959, com excepção de um período de tempo não superior a um ano, em que a A. viveu no casal Fernão João e de outro período de tempo de cerca de 8 anos em que a mesma viveu no Folgado, períodos esses anteriores a Agosto de 1996 - al. c) da resposta ao quesito 3 9 ; 11. O R. também cultivou o terreno de cultivo referido na al. d) da resposta ao quesito 2º, de forma ininterrupta, desde data exacta não apurada mas anterior a 7/2/76 e posterior a 1959 - alínea d) da resposta ao quesito 3º; 12. A Ré também cultivou o terreno de cultivo referido em d) da resposta ao quesito 2º de forma ininterrupta, desde 7/2/76 e até, pelo menos, 1998 - al. e) da resposta dada ao quesito 3º. 13. O R. habitou desde 1959 na casa de habitação e utilizou-se da dependência que constituíam originariamente o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Pombal sob o art. 3423, do mesmo modo que habitou a casa de habitação e utilizou-se do salão com um forno e uma divisória, do barracão e do telheiro que passaram a constituí-lo a partir das obras referidas em c) da resposta ao quesito 2º, de forma ininterrupta, desde 7/2/76 e até, pelo menos, 1998 - alínea g) do quesito 3º; 14. Desde 1959, com o consentimento da A. e enquanto foi vivo, do E, o R. sempre viveu na casa descrita em A) e naquela em que a mesma foi convertida por causa do referido na al. c) da resposta ao quesito 2º, nelas dormindo, confeccionando e tomando refeições, nelas mantendo os seus bens e pertences - resposta dada ao quesito 8º; 15. Desde data exacta que não foi possível apurar, mas anterior a 7/2/76 e posterior a 1959, com o consentimento da...

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