Acórdão nº 03B1727 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelFERREIRA GIRÃO
Data da Resolução02 de Outubro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" requereu, no 2º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Lisboa, contra B, a presente providência de jurisdição voluntária de alteração do acordo de atribuição da casa de morada de família e a fixação, com efeitos a partir de 1 de Julho de 2001, de uma renda devida pela requerida no montante de 90.000$00/mês. Alegou, para tanto e em síntese, ter sido acordado no processo de divórcio por mútuo consentimento, a atribuição, a título gratuito, da casa de morada de família, propriedade exclusiva do requerente, à requerida e até ao termo normal de formação escolar dos filhos comuns, mas desconhecendo o requerente, em absoluto, o mercado de arrendamento a que teve de recorrer para satisfazer as suas necessidades de habitação, foi confrontado com a necessidade de arrendar, por 200.000$00/mês, uma casa semelhante à que foi atribuída à requerida, valor imprevisível, criando grave desproporção à sua situação económica em relação à da requerida. Posteriormente, ampliou o pedido no sentido de abarcar a obrigação da requerida pagar a pretendida renda, acrescida da aplicação do coeficiente de actualização anual legal e ainda do valor da comparticipação extraordinária para a administração do condomínio no valor de 32.000$00, entre 1 de Julho de 2001 e 30 de Junho de 2002. Contestando, a requerida pugnou pela inalterabilidade do acordo, salvo pela superveniente alteração das circunstâncias, o que não acontece in casu. Frustrada a tentativa de conciliação e instruído o processo, foi proferida sentença a julgar improcedente o pedido, decisão que veio a ser confirmada pela Relação de Lisboa com a negação do provimento à apelação interposta pelo requerente, que, inconformado, pede agora revista do correspondente acórdão, formulando as seguintes conclusões: 1. O acórdão recorrido é nulo ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. d) do CPC, pois, embora tenham sido alegados diversos motivos de deficiência da decisão sobre a matéria de facto a fls. 365, nomeadamente nos pontos 14, 15 e 16 das alegações, 2. O acórdão recorrido é nulo ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. d) do CPC pois, embora tenha sido alegada a imprecisão da decisão sobre a matéria de facto, na parte em que considerou provado o facto relacionado sob o nº. 14 do acórdão recorrido; 3. O acórdão recorrido é nulo ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. d) do CPC por não ter apreciado nem decidido a questão suscitada pelo requerente da errada decisão da 1ª instância sobre os incidentes processuais e o condenou indevidamente nas custas, pois aquele obteve vencimento (ao abrigo do disposto nos artigos 446º, nº. 1 e 543º do CPC); 4. O acórdão recorrido ainda é nulo ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. d) do CPC por não ter apreciado a questão suscitada pelo requerente do erro de julgamento quanto a custas ao ter fixado o valor da acção em 20.000,00 euros. 5. O acórdão recorrido violou o artigo 515º do CPC desconsiderando o princípio da aquisição processual nele estabelecido ao decidir que não era relevante para a decisão dos presentes autos o facto alegado pela requerida no artigo 16º da réplica do apenso; 6. O acórdão ainda é nulo ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. c) do CPC ao ter considerado a existência de erro na decisão da matéria de facto, mas tendo concluído pela inexistência de obscuridade da decisão; 7. O acórdão recorrido incorreu em nulidade nos termos do disposto no artigo 668º, nº. 1, al. d) do CPC por ter deixado sem resposta grande parte da fundamentação das alegações do requerente, suportada por referência a vasta doutrina e jurisprudência, segundo a qual a 1ª instância errou na aplicação da norma jurídica aplicável ao caso sub judice; 8. O acórdão recorrido também merece censura do ponto de vista da aplicação do direito, por violação do disposto nos artigos 437º, 1778º e 1793º, todos do Código Civil; 9. O artigo 437º não é a norma adequada para dirimir os normais litígios, como é o caso dos autos, concernentes às concretas condições de utilização da casa de morada de família, em que se deve acautelar devidamente os interesses dos cônjuges e dos filhos, sob pena de recusa de homologação judicial, o que constitui um desvio fundamental ao princípio da liberdade de contratar consagrado no artigo 405º do CC; 10. O conteúdo desses acordos, na parte em que apenas estejam em causa os interesses dos cônjuges, tal como sucede no conflito sub judice, está sujeito ao critério legal da equidade; 11. O artigo 1778º deve considerar-se aplicável por interpretação extensiva à hipótese dos autos, em que se requer a modificação do acordo atributivo da casa de morada de família, por a sua execução se revelar altamente lesiva dos legítimos interesses do recorrente, o que é proscrito pelo critério legal de equidade ali acolhido; 12. Caso assim não se entenda, deverá então aplicar-se o preceituado no artigo 1793º, nº. 2 do CC, segundo o argumento a maiori ad minus; 13. Nada impede a aplicação do artigo 1793º, nº. 2 à hipótese dos autos, também por via de interpretação extensiva, em consonância com o preceituado no artigo 11º do CC; 14. Do negócio jurídico que atribuiu o gozo gratuito da casa de morada de família à recorrida não nasceu necessariamente um direito real de habitação; 15. Havendo dúvidas sobre qual tenha sido o sentido da declaração, deve aplicar-se o critério normativo oferecido pelo artigo 237º do CC, o qual determina que, em sede de negócios gratuitos, prevalece o que for menos gravoso para o disponente, em conformidade, aliás, com os critérios legais constantes do artigo 1778º; 16. O gozo gratuito pela recorrida da que foi a casa de morada de família faz as...

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