Acórdão nº 03B3596 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2003

Magistrado ResponsávelSALVADOR DE COSTA
Data da Resolução13 de Novembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I"A, S.A." e "Vidreira B, Lda." intentaram, no dia 12 de Janeiro de 1998, contra "C, Lda.", acção declarativa constitutivo-condenatória, com processo ordinário, pedindo a declaração da resolução do contrato de compra e venda de uma máquina biseladora celebrado entre a primeira autora e a ré, a condenação na restituição das prestações ou, subsidiariamente, a anulação daquele contrato por erro sobre as qualidades da máquina e a condenação na restituição desta, ou a condenação da ré a substituir a máquina por outra de modelo equivalente e sem defeitos, ou a eliminar os defeitos e, em qualquer caso, a pagar 2.000.000$ à autora "Vidreira B, Lda." e o que se liquidasse em execução de sentença por danos futuros, acrescidos de juros vincendos. Fundamentaram essencialmente a sua pretensão na celebração de um contrato de locação financeira entre as autoras, a primeira como locadora e a segunda como locatária, de um contrato de compra e venda entre "A, S.A." e a ré, relativamente à mencionada máquina e nos defeitos graves e inultrapassáveis que a afectavam e desconhecidos pelas autoras. A ré invocou, na contestação, a ilegitimidade ad causam das autoras, e a caducidade do direito de acção com base no decurso dos prazos previstos nos artigos 916º e 917º do Código Civil e, por impugnação, que logo no início da laboração da máquina reparou prontamente a pequena anomalia no computador e que as suas reparações que realizou em 1996 e 1997 se inseriram no plano das revisões a que as máquinas daquele tipo estão sujeitas. Na réplica, "A, S.A." afirmou que os pedidos visam o interesse da "Vidreira B, Lda." e que só por cautela interveio na posição de autora, e que os defeitos da máquina surgiram imediatamente e foram denunciados no prazo de garantia. Realizado o julgamento, foi a acção julgada parcialmente procedente, declarada reconhecida a resolução do contrato de compra e venda, condenada a ré a devolver à segunda autora o preço de € 59.596,37 contra a entrega por aquela da máquina e do montante correspondente ao seu uso concreto durante o período e nas circunstâncias em que funcionou, a liquidar em execução de sentença, e a pagar-lhe o que se liquidasse em execução de sentença pelos danos decorrentes do mau estado da mesma, até ao montante de € 9.975,96. Apelou a ré, e a Relação julgou o recurso parcialmente procedente e revogou a sentença recorrida na parte em que declarou resolvido o contrato de compra e venda da máquina e que condenou a apelante a devolver à autora "Vidreira B, Lda." o preço pago contra a entrega da máquina e da quantia correspondente ao valor do seu uso concreto. Interpôs "Vidreira B, Lda." recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão da Relação é nulo por se não haver pronunciado sobre a anulação do contrato por erro; - os factos provados revelam a existência e persistência de graves defeitos que impedem o perfeito funcionamento da máquina biseladora, e que, durante quatro anos, a recorrida e o fabricante os reconheceram e tentaram a sua eliminação por todos os meios, até Julho de 1997; - esses defeitos implicavam a paralização da máquina e levaram à perda de clientes da recorrente, e o prazo concedido à recorrida para os eliminar, era mais do que razoável; - não se pode considerar que um dos defeitos da máquina foi eliminado, porque o técnico do fabricante gastou três semanas de trabalho, conseguiu que o bisel saísse rectilíneo, mas com mossas resultantes de o tapete dar fortes pancadas no vidro; - o bisel curvo ou com mossas é originado por um defeito da máquina que não foi eliminado; - se os defeitos não fossem originários e graves, nem a recorrida nem o fabricante italiano aceitariam ter tentado a sua eliminação durante quatro anos; - a máquina em causa causou à recorrente prejuízos de centenas de contos por mês, pelo que não é aceitável que o contrato não seja resolvido e que a recorrente tenha que ficar com a máquina que lhe custou 20.000.000$; - a recorrida não eliminou, no prazo concedido, os graves defeitos da máquina sucessivamente denunciados e reconhecidos e que impossibilitam o seu funcionamento pelo que não há razão para que o contrato não seja resolvido; - se assim não se entendesse, havia razão para a anulação do contrato por erro viciante da vontade, pelo que o acórdão recorrido violou os artigos 798º, 808º, 905º 913º, 917º e 921º do Código Civil. Respondeu a recorrida, em síntese de conclusão de alegação: - a Relação decidiu em conferência inexistir a nulidade do acórdão invocada pela recorrente; - a feitura das reparações ou a simples admissão da possibilidade da existência de defeitos não permitem concluir pelo seu reconhecimento; - os defeitos da máquina inicialmente apontados pela recorrente prendiam-se com a parte eléctrica e com a afinação do bisel, tendo os primeiros sido resolvidos em 1995 e os segundos na primeira semana de Agosto de 1997; - o direito de resolver o contrato é subsidiário, para o caso de o devedor se não oferecer para eliminar o defeito, e os defeitos da máquina foram resolvidos; - as paragens e batimentos do tapete geradores de mossas no bisel não são originárias nem constituem vício da máquina, mas o resultado do desgaste normal da utilização da máquina, sem relação com os defeitos anteriormente alegados; - a denúncia do problema do tapete da máquina foi feita para além do prazo de garantia; - mesmo que assim não fosse, o prazo de caducidade contar-se-ia a partir do reconhecimento, pelo que a acção deveria ter sido proposta no prazo de seis meses a contar dessa data. IIÉ a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. "A, S.A." é uma sociedade de locação financeira, a "Vidreira B, Lda." dedica-se à actividade transformadora de vidro plano, e a ré tem por objecto a venda de equipamentos industriais. 2. "Vidreira B, Lda." necessitava de uma máquina biseladora, rectilínea, Lead 1207, para a sua actividade, e a ré comercializava-a, importando-a de Itália, do fabricante "D". 3. "Vidreira B, Lda." necessitava de obter financiamento para comprar a referida máquina, pelo que contactou com "A, S.A." para esta a adquirir em regime de locação financeira, e propôs-lhe a sua aquisição por 10.300.000$, acrescidos de imposto sobre o valor acrescentado de 1.648.000$. 4. No dia 23 de Dezembro de 1993, representantes de "A, S.A." e de "Vidreira B, Lda." declararam, por escrito, que a última pagaria à primeira 16 rendas de 3.000.000$ mais imposto sobre o valor acrescentado e 15 rendas de 682.178$, acrescidos daquele imposto e que, para a adquirir, a máquina teria de pagar o valor residual de 206.000$, acrescidos do mencionado imposto. 5. Representantes de "A, S.A." e de "Vidreira B, Lda." declararam acordar, em escrito de clausulado geral, que a primeira transferia para a segunda todas as garantias relativas à qualidade e funcionamento do equipamento e que a última exerceria directamente contra o fornecedor os direitos dela derivados. 6. As máquinas do mesmo tipo carecem de manutenção regular e de uma revisão rigorosa após dois anos de utilização intensa. 7. A ré, em Dezembro de 1993...

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