Acórdão nº 03B464 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelLUCAS COELHO
Data da Resolução18 de Setembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: ID. A, viúva, internada no lar da terceira idade da Rua ..., Falagueira-Amadora, instaurou acção ordinária na 16.ª vara cível da comarca de Lisboa, em 13 de Janeiro de 1997 - na qual por ter mais tarde falecido veio a ser substituída pelos herdeiros habilitados -, contra o advogado Dr. B e esposa, D. C, fundada na celebração de mandato com o réu e no facto de a actividade de advogado em execução do contrato se destinar a acorrer aos encargos normais da vida familiar. Por actos praticados em execução e no exercício do mandato, pediu a condenação dos réus a pagar-lhe a quantia de 10.350.000$00 retida em seu poder - sendo 6.000.000$00 relativos ao preço da venda de um andar da autora realizada pelo réu e 4.350.000$00 de depósitos bancários dela -, acrescida dos juros de mora vencidos nos últimos 5 anos, a capitalizar, no montante de 7.115.625$00, e vincendos até integral pagamento. Contestaram os réus excepcionando a ilegitimidade da ré e pronunciando-se no sentido da procedência apenas parcial da acção, uma vez que, mantendo efectivamente em seu poder os 6.000 contos da venda do andar, já quanto aos depósitos bancários transferira o réu 2.300 contos para familiares da autora cumprindo instruções desta, retendo consigo tão-somente os títulos de depósitos de 1.450 contos. Por outro lado, a autora deve ao réu a importância de 1.818.883$00 a título de honorários e despesas. Assim, invocando a compensação do pedido principal com esta verba e a de 2.300 contos, a condenação não deveria exceder a diferença apurada. No saneador foi rejeitada a excepção dilatória, julgando-se a ré parte legítima, decisão de que a ré interpôs agravo com subida diferida. Prosseguindo consequentemente a acção seus trâmites normais, veio a ser proferida em 13 de Julho de 2000 a sentença final condenando os réus nos pedidos de 10.350.000$00, acrescidos de 7.115.625$00 de juros vencidos até 31 de Dezembro de 1996, e, negando-se a capitalização, dos juros vincendos às taxas legais desde esta data até integral pagamento. O réu apelou da sentença. E subindo o agravo retido à Relação de Lisboa com a apelação, o tribunal ad quem, mediante acórdão de 10 de Outubro de 2002, negou-lhe provimento, confirmando o despacho saneador recorrido. Mas julgou parcialmente procedente a apelação, condenando o réu: a pagar aos herdeiros da autora a quantia do pedido principal objecto de condenação em 1.ª instância (10.350.000$00), reduzida, por abatimento de 1.450.000$00 relativos aos títulos de depósitos bancários em seu poder, à cifra diferencial de 8.900.000$00; acrescida dos juros desde 31 de Julho de 1991, à taxa legal, até integral pagamento; e a entregar-lhes ademais os títulos de depósitos no aludido valor de 1.450.000$00. Inconformados ainda com a decisão dos dois recursos, trazem os réus a presente revista. E o objecto desta, que a ponderação da respectiva alegação e suas conclusões à luz dos fundamentos do acórdão recorrido permitirá ainda precisar, compreende: no tocante ao julgamento do agravo, a questionada legitimidade da ré para a presente acção; quanto à decisão da apelação, a virtual ampliação da matéria de facto ao abrigo do nº. 3 do artigo 729º do Código de Processo Civil. II1. O acórdão recorrido considerou provada a matéria de facto já apurada na 1ª instância, seguidamente explanada na parte essencial ao julgamento do recurso: 1.1. «O réu é advogado e é no exercício dessa actividade que aufere os proventos para fazer face aos encargos normais da vida familiar» [alínea A) da especificação]; 1.2. «Em 1990, a autora, já com 84 anos de idade», «impossibilitada de tomar conta de si e não tendo familiares próximos», decidiu vender o andar em que vivia e internar-se num lar [alínea B)]; ajustou a venda por 6.000 contos, mas tinha extrema dificuldade em se deslocar ao cartório notarial para intervir na escritura [alínea C)]; 1.3. Por outro lado, a autora, para além de depósitos à ordem, possuía «18 títulos de depósitos a prazo na ..., perfazendo um total de 4.350 contos», e era titular de «uma pensão de reforma» para cujo recebimento devia «periodicamente fazer a prova de vida (1)»[alínea D)]; 1.4. «Precisava, assim de um procurador para outorga da escritura, administração de capitais depositados, movimento bancário e o recebimento da pensão, e, de um modo geral, tratar dos seus assuntos» [alínea E)]; 1.5. Por indicação de familiar que o conhecia desde a infância, a autora pediu ao advogado réu que aceitasse o encargo [alínea F)] e este, anuindo, elaborou a minuta de procuração que a autora lhe passou [doc. nº. 1 dado como reproduzido na alínea G)]; 1.6. «Em execução do mandato, o Réu outorgou a escritura de venda», «recebeu o ajustado preço de 6 mil contos», e «levantou os depósitos que ela tinha na ..., tendo depositado tudo em nova conta, ou contas, que abriu, ou dado o destino que muito bem entendeu» (resposta ao quesito 1º); 1.7. «O réu levantou e dissipou em seu proveito 2.900 contos dos títulos da ...» (quesito 7º), «retém os títulos de 1.450 contos, impossibilitando a autora de os levantar» (quesito 8º), «mantém em seu poder a quantia de 6 mil contos do preço da venda do andar» [alínea J)], «nada pagou à autora e deixou de fazer, até, a prova de vida dela, pelo que lhe foi suspenso o pagamento da pensão» (quesito 2º), «recusou-se a apresentar contas» e a entregar o dinheiro (quesito 11º); 1.8. «A autora revogou a procuração» por instrumento de 16 de Março de 1994 [ alínea I)] e «procurou outro advogado» [alínea Q)]; 1.9. Em 25 de Novembro de 1996, o Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados proferiu o seguinte acórdão [alínea S)]: «- Assim, e decidindo, ACORDAM os do Conselho Distrital de Lisboa, reunidos em plenário, em condenar o Sr. Advogado arguido, Dr. B, titular da cédula profissional nº. 4120, pela prática continuada e violadora dos artigos 76º, nº. 3, 83º, nº. 1, alíneas c), g) e h), 84º, nº 1, e artº 91º, todos do Estatuto da Ordem dos Advogados, na pena disciplinar de 7 (sete) anos de suspensão, nos termos dos artigos 91º, 92º e 103º, alínea t), do citado Estatuto. - Mais condenam o Sr. Advogado arguido na restituição à queixosa da quantia de 10.350.000$00 (dez milhões, trezentos e cinquenta mil escudos), acrescidos dos respectivos juros à taxa legal, desde 31 de Julho de 1991 até integral devolução, e na perda do direito a honorários, de harmonia com o disposto no artº. 104º do Estatuto da Ordem dos Advogados.» 2. Nestes fundamentos de facto à luz do direito aplicável se firmaram as instâncias. 2.1. Relativamente à controversa legitimidade da ré esposa, o despacho saneador, considerando que a causa de pedir alegada na petição é o facto de o réu no exercício da sua profissão de advogado ter sido procurador da autora em determinados actos notariais e de outra natureza - «sendo que foi no exercício da sua actividade como advogado que praticou esses actos» - e subsumindo-a à alínea b) do nº. 1 do artigo 1691º do...

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