Acórdão nº 03P2155 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Julho de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução08 de Julho de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Supremo Tribunal de Justiça I 1.1. AFSC, com os sinais nos autos, foi condenado, por acórdão de 24.2.2003 do Círculo Judicial de Vila Franca de Xira, como autor material de um crime de abuso sexual de crianças agravado, p. e p. pelos art.ºs 172°. n.° 1 e 177°, n.º 1, al. a), ambos do C. Penal, na pena de 5 anos de prisão

Inconformado recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça concluindo na sua motivação: 1 - Quanto à pena em concreto aplicada ao arg.º -5 anos de prisão efectiva-ela foi exagerada, não teve em conta os factores de escolha e graduação da respectiva pena concreta que estão previstos nos art.°s 70.° e 71.º do C. Penal. Assim essa determinação deve fazer-se em Junção da culpa do agente e das exigências de prevenção da prática de condutas criminalmente puníveis, devendo atender-se a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime depuseram a favor ou contra o arguido; 2-Circunstâncias que militam contra o arg°.: - Ao actuar da forma descrita no Acórdão , o arg░. agiu deliberada, livre e conscientemente, tendo perfeito conhecimento da idade da menor SATS e que esta era sua neta, actuando movido pelo desejo de satisfazer os seus impulsos sexuais, apesar de saber que a conduta que praticava com a menor ofendia os mais elementares princípios de moral sexual daquela, pretendendo e conseguindo manter com ela relações sexuais, ainda que sem penetração vaginal; - Sabia o recorrente que a sua conduta era prevista e punida por lei; - Depois dos factos, a SATS teve uma mudança no seu comportamento, tornando-se uma criança mais agressiva, sofrendo de pesadelos e enurese nocturna, tendo sido acompanhada por uma psicóloga; - O dolo é intenso e manifesta-se na sua forma mais vincada - o dolo directo; - O arguido apenas admite ter praticado os factos em face do resultado dos exames efectuados, dizendo-se arrependido, mas de forma pouco convincente; - O comportamento do recorrente é objecto de elevada reprovação social, reprovação essa tanto maior quanto mais baixa é a idade da ofendida; - Actuou de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que toda a sua conduta lhe estava vedada, por ser ilícita e criminalmente punível; 3-Circunstâncias que militam a favor do arg.║: - O arguido vive sozinho em Faro sendo viúvo, e a ofendida vive em Castanheiro do Ribatejo; - Reformado, auferindo cerca de €200 por mês; - Não sabe ler, nem escrever, sabendo, apenas, assinar o seu nome; - Não lhe são conhecidos antecedentes criminais, o que se mostra relevante face à sua idade (70 anos), quer antes quer depois dos factos (os factos são de Dezembro de 2001 e o acórdão é de Fevereiro de 2003); - O recorrente é de humilde condição económica e social; - Diz-se arrependido; - Da conduta do arg.░ não resultou o desfloramento da ofendida; - princípio da reintegração social do condenado; 4-Há, pois, também que ter em atenção a finalidade das penas referidas no art░. 40.º 1, do C. Penal, introduzido pelo DL n░. 48/95, de 15/3-protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade; 5-E são quatro as linhas de força inseridas neste art░. 40░.: princípio da culpa, princípio da proporcionalidade, principio da vinculação à defesa de bens jurídicos e principio da reintegração social do condenado; 6-O Tribunal Colectivo ao optar por uma pena privativa da liberdade de cinco anos de prisão, quando a moldura penal mínima do crime a que o arg.║ foi condenado é de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses, não teve em atenção o art░. 40.║, 50.░, 70.║ e 71.║ todos do C Penal e as circunstâncias que militam a favor e contra o arg.░, a sua reintegração social e a idade do mesmo-70 anos; 7-Impunha-se que a decisão recorrida obedecesse aos requisitos previstos nestes artigos o que não o fez. 8-O Tribunal Colectivo não devia pelo crime a que o org.║ foi condenado o ter condenado na pena de prisão efectiva de 5 (cinco) anos de prisão atenta a moldura penal mínima do mesmo-l (um) ano e 4 (meses) de prisão, mas sim, tendo em atenção os artigos supra citados do C. Penal, devia o Tribunal ter condenado o arg░. Na pena mínima de 3 (três) anos de prisão não efectiva na sua execução mas sim suspensa por um período de 5 (cinco) anos, por esta realizar deforma adequada e suficiente as finalidades da punição e da reintegração social do idoso de 70 anos condenado. 9-A pena de prisão deve ser suspensa atendendo ao modo de execução do crime, não houve desfloramento da ofendida nem tentativa de violação da mesma nem agressões físicas, à sua situação actual, é reformado, vivendo sozinho e tem 70 anos de idade, a ausência de antecedentes criminais quer antes quer posteriores aos factos, atendendo que esteve vários meses em prisão preventiva por estes factos. Face a isto e a tudo o que foi supra referido é de concluir que a simples censura do facto e ameaça de prisão efectiva, realizam deforma adequada e suficientes as finalidades da punição, pelo que deverão E. Ex░s suspender a execução da pena de prisão pela qual o arg░. Deve ser condenado, três anos, em cinco anos de pena suspensa, tudo nos termos do art. 50░ do CP. Face aos elementos constantes dos autos, é possível fazer uma prognose positiva relativamente ao recorrente e suspender por esta razão a pena de prisão. 10-Em conclusão e pelo supra exposto o arg░. Devia ter sido condenado numa pena de prisão efectiva de 3 anos e não de 5 anos suspensa na sua execução por 5 anos. 11-O art. 50░ do CP, ao exigir a satisfação das necessidades de prevenção geral do crime para a suspensão da pena viola o princípio da culpa, deste modo o art. 50░ do CP viola o art. 32░ da CRP. 12-A grande amplitude entre os limites mínimo e máximo das penas viola o art. 30░ n.║ 4 da CRP. Assim sendo, violaram-se os art░s 40░,50░, 70░, 71░, 172░, n░. 1 e 177░, n░. 1 al. a) todos do C Penal e art.s 13░, 20░, 30░, 32░ da CRP. Nestes termos, deve o presente Recurso ser julgado procedente, devendo a decisão recorrida ser substituída por outra que aplique ao arg░. A pena efectiva de 3 anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 5 anos. Assim se fazendo a costumada Justiça

1.2. O Ministério Público respondeu à motivação, sustentando a improcedência do recurso. II Neste Tribunal, o Ministério Público teve vista dos autos e pronunciou-se pela atribuição da competência da Relação de Lisboa e não do Supremo Tribunal de Justiça para conhecer deste recurso

Para tanto sustentou que, partindo do princípio da unidade do sistema, se deve concluir que não cabe recurso para o Supremo de decisão final do tribunal colectivo, desde que não coubesse do acórdão da Relação que, em recurso, sobre esta recaísse. Só dessa forma - diz - se dará conteúdo à intenção, expressamente anunciada, de restringir a admissibilidade de recurso para o STJ em função da gravidade dos casos e se impede que entre pela janela [art. 432.░, al. d)] o que se fez sair pela porta [art. 400.░, n.║ 1, als e) e f)]. Ou seja, só poderá haver recurso directo para o STJ uma vez verificado o pressuposto (negativo) de não se estar perante uma (futura) decisão da Relação que viesse a ser irrecorrível

Foi cumprido o disposto no n.║ 2 do art. 417.║ do CPP

Colhidos os vistos e realizada a audiência, cumpre conhecer e decidir, começando por esta questão prévia. IIIE conhecendo. 3.1. Quanto à questão prévia, com a discordância do relator, entendeu-se e decidiu-se: O recurso da decisão proferida por tribunal de 1.ª instância interpõe-se para a Relação, «exceptuados os casos em que há recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça» (art. 427.º do CPP). Ora, «recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça (...) de acórdãos proferidos pelo tribunal colectivo, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito» (art. 432.º, al. d). Foi o que o arguido fez, pois impugnou acórdão proferido pelo tribunal colectivo e visou exclusivamente o reexame de matéria de direito, pelo que recorreu directamente para o Supremo Tribunal de Justiça. Ora, a letra da lei, nesse art. 432., al. d), é clara e imperativa, não devendo ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (art. 9.º, n.º 2, do CC). De resto, em matéria de recursos, há que respeitar a segurança jurídica que os sujeitos processuais só podem encontrar no conforto da lei e não em interpretações jurisprudenciais que dela se tendem a afastar

Note-se que não estamos perante um recurso "per saltum", mas perante um "recurso directo" para o STJ, pelo que não há que conferir à relação uma competência que a lei em caso algum lhe atribui, ainda que por título alternativo ou opcional. O recorrente, ao limitar o seu recurso a questões de direito, quer vê-las decididas pelo mais Alto Tribunal e, com essa pretensão, não está a escolher uma instância de recurso, mas a obedecer ao dito imperativo legal. A vingar a tese defendida pelo Excm.º Procurador-Geral Adjunto, o arguido nunca saberá, no momento da interposição, se dirige o recurso ao STJ ou à Relação, pois que se o assistente ou o M.º P.º também recorrerem, o que ele ignora, já não ocorrerá a proibição da "reformatio in pejus" e já não se verificará o pressuposto (negativo) de não se estar perante uma (futura) decisão da Relação que viesse a ser irrecorrível. Essa insegurança não pode ser tolerada e, por isso, as regras de competência são definidas antecipadamente e de modo abstracto. E como tal têm de ser interpretadas. Não ignoramos que, assim, o STJ acabará por conhecer de casos de pequena e média gravidade. Mas também não podemos perder de vista que, se foram julgados pelo tribunal colectivo, em algum momento tiveram gravidade suficiente para fazer intervir esse tribunal e não o singular, circunstância que, só por si, justifica a intervenção deste Supremo Tribunal. Tanto mais que o processo pode voltar a uma fase anterior, por virtude de reenvio ou de anulação do acórdão. Termos em que não se atende à questão prévia e admite-se o recurso, para ser...

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