Acórdão nº 03P2603 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPEREIRA MADEIRA
Data da Resolução03 de Julho de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. Condenada em 1.ª instância, juntamente com o co-arguido IRN, como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21.º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/1, na pena de sete anos de prisão, a arguida MLPD, devidamente identificada, recorreu de facto e de direito à Relação de Coimbra, que, por acórdão de 20/3/01, levando em conta que a recorrente não cumpriu o ónus do artigo 412.º, n.º 3, e 4, do Código de Processo Penal, decidiu da «imodificabilidade» da matéria de facto e, quanto ao mais, deu parcial provimento ao recurso, reduzindo a pena para seis anos de prisão. Recorreu de novo a arguida para o Supremo Tribunal de Justiça, que por acórdão de 30/10/02, reconhecendo, embora, que a recorrente, no recurso para a Relação, não dera cumprimento ao estatuído nos n.ºs 2 e 3 do artigo 412.º citado, decidiu todavia que o recurso relativo à matéria de facto não deferia ter sido decidido sem um prévio convite dirigido à recorrente no sentido de aperfeiçoar a motivação respectiva, pelo que, revogou aquele acórdão da Relação e ordenou que o tribunal em causa convidasse os recorrentes a aperfeiçoarem a motivação do recurso «com integral cumprimento do disposto no artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal. Regressados os autos à Relação de Coimbra, efectuado o ordenado convite, veio a ser apresentada de novo a motivação, após o que foi proferido novo acórdão, em que, do mesmo modo, se decidiu pela imodificabilidade da matéria de facto, uma vez que, segundo o decidido, a recorrente continuou a não dar cumprimento ao preceituado no mencionado preceito da lei adjectiva penal. E quanto ao mais, deu parcial provimento ao recurso e reduziu para seis anos a pena aplicada na 1.ª instância. Mais uma vez inconformada, volta a arguida a recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça a quem confronta com este rol conclusivo: 1) Não havia motivos para se poder rejeitar o recurso interposto quanto à matéria de facto, fazendo-se no Acórdão recorrido uma deficiente interpretação da norma do n.º 3 do artigo 412° do C.P.P. 2) Nas alegações deduzidas pela recorrente para a 2.ª instância, foram transcritos os depoimentos das testemunhas, bem como, na própria transcrição encontram-se destacados (a negrito) as partes desses depoimentos que se mostravam em dissonância com os factos dados como provados na sentença recorrida. E pela simples leitura de tais alegações verifica-se claramente qual a matéria de facto posta em causa pela recorrente. 3) A recorrente procedeu à transcrição dos depoimentos das testemunhas, conforme resulta do Acórdão recorrido. 4) Basta atentar nas alegações de recurso apresentadas pela recorrente para verificar que foi cumprido o artigo 412.º n.º 4 do C.P.P . 5) No Acórdão recorrido não foram devidamente analisadas todas as questões levantadas em sede de alegações de recurso. 6) Nunca se poderia ter em conta estes depoimentos e relatórios periciais, na medida em que, conforme consta dos autos, os mesmos resultam das diligências de investigação, que deveriam ser sujeitas ao principio do contraditório (n.º 2 do artigo 327° do C.P.P.). 7) Quanto à matéria da nulidade da prova extraída dos depoimentos dos Srs. Agentes da P.J. os quais estavam impedidos de depor, por terem tido intervenção na investigação, o Acórdão recorrido limita-se a aderir ao que se disse na sentença de 1.ª instância, não apreciando as questões que motivaram o - recurso nessa parte. 8) Nenhum dos meios de prova acima referidos foi no decurso da audiência de julgamento submetido ao princípio do contraditório. 9) No Acórdão recorrido não se interpretou devidamente as normas legais aplicadas ao caso em concreto. 10) Nunca se podia ter aceite elementos de prova que não foram discutidos em audiência de julgamento. 11) As provas periciais são nulas, pois não foi respeitado o princípio do contraditório na elaboração de tais provas (relatórios, peritagens, etc.), pois a arguida, nunca, e em nenhuma vez foi notificada para indicar perito, ou o seu Advogado nomeado para acompanhar tais diligências bem como simplesmente a data da realização das mesmas para poder, se quisesse estar presente ou fazer-se representar (artigo 3.º-A do C.P.C. "ex vi" artigo 4" do C.P.P.). 12) No Acórdão recorrido não foram tidos em consideração os factos dados como não provados, ou sobre o enquadramento legal da conduta da arguida tendo em conta esses mesmos factos dados como não provados. 13) Atendendo à ausência de antecedentes criminais e à situação familiar da arguida, conforme resultou provado do Acórdão recorrido, nunca se poderia ter neste decidido aplicar uma medida de pena que é manifestamente inadequada ao caso em concreto da arguida. 14) Sendo a arguida primária e mãe de três filhos, sendo um deles deficiente, justifica-se plenamente que lhe seja concedida uma oportunidade de pena suspensa, tanto mais que a arguida já cumpriu alguns meses de prisão preventiva e assim já se encontra prevenida efectivamente, em relação ao seu futuro. 15) A medida da pena aplicada à arguida é desproporcional atendendo às circunstâncias inerentes ao caso em concreto. 16) Nem sequer sendo justa a pena aplicada pelo Acórdão recorrido de 6 (seis) anos de prisão, na medida em que esta medida da pena continua a ultrapassar a medida da culpa do agente. 17) Tendo em atenção a ausência de antecedentes criminais e à situação pessoal e familiar que vem provada nos autos, seria uma pena mais aproximada da justiça a pena de 5 (cinco) anos de prisão. 18) Quanto à medida da pena o Tribunal deveria ter em conta a situação precária que se vive nas prisões em Portugal. 19) Tendo em conta as condições de aplicação das penas de prisão, estas penas revelam-se muito mais lesivas e muito mais sancionatórias para os arguidos do que o seriam quando o legislador estabeleceu determinada medida de pena para determinado tipo de crime. 20) Cabe aos Tribunais e aos Juízes, uma vez conhecedores desta realidade, aplicar as penas tendo em conta a precariedade que as mesmas vão ser cumpridas e com isso um maior índice de punibilidade sobre o facto praticado por determinado arguido. 21) O Tribunal deve fixar as penas, nomeadamente as penas de prisão tendo em conta estes factos. 22) Mesmo que fosse verdade o que consta na matéria dada como provada nos autos, tendo em conta as condições pessoais, familiares e ainda a personalidade da arguida, nunca se podia aplicar uma pena superior ao mínimo previsto na moldura do tipo de crime pelo qual a arguida foi condenada - 4 (quatro) anos de prisão. 23) Aplicando-se uma pena de 4 (anos) de prisão, surtia melhor efeito a punição/reabilitação da arguida. Pois estar-se-ia a punir de forma adequada um facto ilícito cometido contra a sociedade e do mesmo modo a salvar a arguida dos efeitos criminógenos de uma pena que fosse superior a esse período. 24) Não se fez no Acórdão recorrido uma correcta interpretação dos elementos constantes dos autos, bem como se fez uma deficiente interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso em concreto. 25) Deverá o Acórdão recorrido ser revogado. 26) O Acórdão recorrido viola: artigo 3°-A do C.P .C. "ex vi" artigo 4° do C.P .P; artigo 97°, n.º 2 do artigo 327°, artigo 355" n.º 1, n.º 7 do artigo 356.º, artigo 374° e artigo 379.º, todos do C.P.P.; artigo 205.º e artigo 204.º da C. R. P. Termina pedindo em conformidade a revogação do acórdão recorrido. Respondeu o MP junto do tribunal recorrido, defendendo o julgado. Subidos os autos, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta promoveu a sua remessa para julgamento. As questões a decidir - colhidas com o esforço que a prolixidade, extensão e confusão que as conclusões supra transcritas fazem adivinhar, mas que o fastidioso arrastamento do processo aconselha a não fazer corrigir ante o expediente do «convite à correcção» - são as seguintes: 1. Não havia motivo para [a Relação] não conhecer do recurso da matéria de facto uma vez que a recorrente deu cumprimento às exigências do artigo 412.º do CPP (conclusões 1 a 4). 2. No acórdão recorrido «não foram devidamente analisadas todas as questões levantadas em sede de alegações de recurso» (conclusão 5.ª) 3. Os depoimentos (?) e relatórios periciais não deviam ter sido valorados - e por isso são nulos - uma vez que não foi observado o princípio do contraditório na sua feitura (conclusões 6.ª, 8.ª, 10.ª e 11.ª) 4. Em matéria de arguida nulidade de prova relativa aos depoimentos dos agentes da PJ o acórdão recorrido limita-se a aderir ao que afirmou a 1.ª instância. (conclusão 7.ª). 5. Não se deu a devida atenção aos factos não provados (conclusão 12.ª). 6. A medida da pena é exagerada, e tendo em conta a situação pessoal e familiar da arguida ficaria melhor a de 5 ou de 4 anos, ainda assim substituída por pena suspensa (conclusões 13 a 24). 2. Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir. Vejamos antes de mais os factos provados em 1.ª instância: a) O arguido IN, pelas 14 horas e 30 minutos do dia 20 de Março de 2001, conduzindo a viatura de matrícula JM-..., dirigiu-se ao Bairro Salazar, em Leiria. b) Ali chegado, a arguida MLD aproximou-se da viatura, entretanto imobilizada e donde não chegou a sair o arguido I. c) Aproximaram-se então agentes da Polícia Judiciária, face ao que o arguido IRM se pôs em fuga. d) A arguida ML foi submetida a revista, sendo encontrada na sua posse uma bola de plástico que continha dois pacotes. e) Um deles tinha no seu interior dez (10) pequenas embalagens de heroína, e o outro quinze (15) pequenos pacotes de cocaína, um telemóvel da marca "Nokia" e ainda a quantia de 38.000$00 (trinta e oito mil escudos). f) Ordenada e realizada busca à residência da arguida ML, foram ali encontrados os seguintes objectos: - no quarto de dormir da mesma e dentro da sua carteira, uma embalagem com heroína; um outro embrulho envolto em plástico contendo dois sacos em plástico também com heroína; - debaixo da mesa de cabeceira do mesmo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
  • Acórdão nº 0515253 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Março de 2006
    • Portugal
    • 29 de março de 2006
    ...Não menos expressivo é, a este propósito, o acórdão também do Supremo Tribunal de Justiça de 3/07/2003 (em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ com o nº 03P2603), quando refere que: "Se, no recurso da matéria de facto, o recorrente quer ter êxito no seu objectivo de a ver reapreciada pela Relação, deve in......
  • Acórdão nº 01644/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Julho de 2004
    • Portugal
    • 8 de julho de 2004
    ...na linha da jurisprudência mais recente, «os factos não provados não existem, não relevam para a sentença…» (Ac. do STJ de 3/07/2003, Proc. Nº 03P2603). Como neste aresto, noutro passo, se diz, «Os factos não provados, juridicamente são neutros, ou, pelo menos, não têm relevância substantiv......
2 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT