Acórdão nº 03P625 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I1.1. O Ministério Público acusou o arguido MAAR, com os sinais nos autos, imputando-lhe a prática de 1 crime de furto qualificado dos arts. 296º e 297º, n.º 1, al. g), do C. Penal de 1982. Teve lugar o julgamento perante o Tribunal Colectivo do Porto (Proc. Comum 95/1993) e foi proferido acórdão a 4.12.02 em que, em sede de questão prévia, se decidiu declarar extinto, por prescrição, o procedimento criminal instaurado contra o arguido MAAR, nos termos dos arts. 117º, n.º 1, al. b), do C. Penal de 82, por se ter por esgotado o prazo prescricional, Para tanto, aí se explanou: «Como vimos, vem o arguido MAAR, acusado da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 296º e 297º, n.º 1, al. g), do C. Penal, versão de 1982. Os factos reportam-se a 11.12.1990, sendo o referido crime punido com pena de prisão de 1 a 10 anos. Nos termos do art. 117º, n.º 1, al. b), do referido diploma, tendo em conta a pena aplicável, o procedimento criminal extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do crime sejam decorridos 10 anos. Tal prazo decorreu no caso concreto, tendo terminado em 11.12.2000. O arguido, que foi interrogado pelo Ministério Público em 12.12.1990 e declarado contumaz por decisão de 2.07.93, nunca foi pessoalmente notificado nem da acusação, deduzida em 2.11.1992, nem de qualquer outro acto, decisão ou termo do processo, até 11.12.2000. No despacho de fls. 78, foi decidido que a declaração de contumácia apenas teria relevância face ao actual C. Penal, sendo que, face à lei vigente à data dos factos, inexistiriam quaisquer causas de suspensão ou interrupção da prescrição. A prescrição ocorreria, pois, em 11.12.2000. Porém, entretanto, através do Assento 10/2000 (Publicado no DR, I-A, de 10/11/2000), o Supremo Tribunal de Justiça veio fixar jurisprudência no sentido de que "no domínio da vigência do CP de 1982 e do CPP de 1987, a declaração de contumácia constituía causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal". Não obstante o teor do referido Assento, entendemos que a doutrina do mesmo não pode ser acolhida, quer por ser contrária à lei ordinária e aos princípios gerais de direito que regem o nosso ordenamento jurídico, quer por violar a Lei Fundamental da República. Vejamos: Nos termos do art. 119º, n.º 1, do C. Penal de 1982, a prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que: a) o procedimento criminal não possa legalmente iniciar-se ou não possa continuar por falta de uma autorização legal ou de uma sentença prévia a proferir por tribunal não penal, ou por efeito da devolução de uma questão prejudicial para o juízo não penal; b) o procedimento criminal esteja pendente, a partir da notificação do despacho da pronúncia ou equivalente, salvo o caso do processo de ausentes; c) o delinquente cumpra no estrangeiro uma pena ou uma medida de segurança privativa da liberdade. Não estava, pois, pelo menos expressamente, previsto que o instituto da contumácia tivesse qualquer repercussão em termos de suspensão da prescrição do procedimento criminal. Aliás, sendo a contumácia inexistente no C.P.P. de 1929, que vigorava em 1982, e tendo apenas sido consagrada a partir de 1988, com a entrada em vigor do C.P.P. de 1987, nunca o legislador de 82 se poderia querer referir a tal instituto, que não existia na altura, como causa de suspensão da prescrição. O Assento 10/2000, vem, porém, afirmar que o art. 119º (do C. Penal de 82), "para além dos casos especialmente previstos na lei", não pode deixar de considerar abrangidos quer aqueles casos que de momento já se encontrem previstos em leis quer aqueles que, de futuro, venham a ser consagrados em diplomas legais. Tal entendimento, face à natureza substantiva do regime da prescrição, viola, na nossa opinião e para além do mais, o disposto nos arts. 2º, n.º 4, do C. Penal, e 29º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa ("Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respectivos pressupostos, aplicando-se retroactivamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido"), pois implica a aplicação retroactiva de uma norma penal material de conteúdo menos favorável ao arguido. Entendemos, pois, divergindo da doutrina do Assento 10/2000 pelas razões expostas, que a declaração de contumácia não constituía, anteriormente à entrada em vigor do C.P.P. de 95, causa suspensiva da prescrição, sendo as alterações introduzidas pelo referido diploma ao nível dos efeitos da contumácia sobre o prazo de prescrição inaplicáveis aos processos instaurados antes da entrada em vigor do mesmo» (vide declaração de voto do Sr. Conselheiro Carmona da Mota, expressa relativamente ao Assento 10/2000).» 1.2. O Ministério Público interpôs recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça pedindo, com base na violação de jurisprudência fixada, a revogação da decisão. IINeste Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público promoveu a realização de audiência. Colhidos os vistos, teve lugar a audiência, na qual o Ministério Público acompanhou a motivação de recurso e a defesa sustentou a decisão recorrida, pelo que cumpre conhecer e decidir. IIIE conhecendo. 3.1. Pelo acórdão uniformizador...

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