Acórdão nº 03S2053 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelVÍTOR MESQUITA
Data da Resolução30 de Setembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório "A", intentou a presente acção declarativa emergente de contrato de trabalho contra Caixa de Crédito de Agrícola de Mútuo ....... pedindo a condenação da R.: 1 - a reconhecer-lhe o direito à pensão de reforma por velhice (invalidez presumível), calculada nos termos das cláusulas 113ª e ss. do ACT para os trabalhadores ao serviço das Instituições de Crédito Agrícola Mútuo, devida desde 1 de Junho de 1999; 2 - a pagar-lhe as correspondentes mensalidades, as vencidas até 12 de Setembro de 2001 no valor global de 8.273.274$00 e as vencidas depois dessa data, até Novembro de 2001, no valor mensal de 200.075$00 e depois no valor mensal de 178.774$00, anualmente actualizável, até ao último mês da vida do A; 3 - a pagar-lhe juros, à taxa legal, desde a citação.

Para tanto alegou, em síntese: que foi admitido ao serviço da R. em 14 de Maio de 1984 com a qualidade de director executivo, trabalhando desde então sob as ordens, direcção e fiscalização da R. até 30 de Maio de 1999, data em que o vínculo laboral cessou pela sua passagem à situação de reforma por velhice e que, de acordo com o CCTV aplicável publicado no BTE, 1ª série, n.º 45 de 8 de Dezembro de 1987, tem direito a um complemento de reforma a ser pago pela Ré, pagamento este a que ela nunca procedeu.

A Ré apresentou contestação sustentando que o tribunal é absolutamente incompetente em razão da matéria para conhecer da acção, devendo ser absolvida da instância, porque nunca o A. exerceu funções na R. com base em vínculo laboral. Alegou ainda, em suma: que nunca existiu entre si e o A. um contrato individual de trabalho; que este exerceu desde sempre as funções de presidente da direcção da R., pelo que não é aplicável o CCTV em causa ou qualquer outro instrumento de regulamentação colectiva; que os factos alegados pelo A. não correspondem à verdade e que não se verificam os requisitos de que o instrumento de regulamentação colectiva faz depender o reconhecimento do direito que o A. pretende ver declarado.

O A. respondeu à contestação da R. nos termos de fls. 170 e ss.

Foi proferido despacho saneador que considerou improcedente a excepção suscitada declarando competente o Tribunal do Trabalho de Viseu.

Procedeu-se à audiência de julgamento, no final da qual foi proferida sentença que absolveu a R. do pedido.

Inconformado com o decidido, o A. recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 23 de Novembro de 2003, decidiu negar provimento à apelação interposta e confirmou a decisão sob censura.

Novamente inconformado o A. interpôs recurso de revista e terminou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Na economia da convenção colectiva aplicável, - Contrato Colectivo de Trabalho Vertical das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo, publicado no BTE 1ª Série nº45 de 8/12/1987, objecto de Portaria de Extensão a todos os trabalhadores do sector e publicada no BTE 1ª Série nº11 de 22/03/1988 - as funções de Gerente e de Director Executivo (as funções atribuídas ao Recorrente em Assembleia Geral da CCAM de .......) - estão tratadas de forma substancialmente diferente daquela que conceitualmente está consagrada para Gerentes e Administradores quer no Código das Sociedades Comercias quer no Código Cooperativo.

  1. Foi vontade quer da Assembleia Geral, quer da Direcção da CCAM recorrida, reconhecer ao recorrente a qualidade de trabalhador da instituição e, retribui-lo, por isso, nos termos da convenção colectiva.

  2. A decisão de considerar e Recorrente como trabalhador da CCAM de ......, foi decidida nos órgãos competentes da Recorrida, não tendo estas decisões sido impugnadas nos termos legais, o que se traduziu até na efectivação dos correspondentes descontos para a segurança social e, a inclusão do recorrente nos respectivos Mapas de Pessoal.

  3. A Recorrida iniciou e, manteve, por cerca de dois anos, o "pagamento de um complemento - reforma do Recorrente recebia da segurança social - complemento este que, posteriormente, foi retirado, sem qualquer justificação e é o objectivo nuclear do petitório dos presentes autos.

  4. Estão reunidos, no caso sub iudice, os pressupostos da existência de um contrato de trabalho, pelo menos desde a data do início dos descontos para a segurança social, na medida em que se verificou a vontade de assim o considerar por parte dos órgãos com legitimidade para assim o decidir, decisões estas que não foram impugnadas e que, inclusive, proporcionaram o pagamento do correspondente complemento da reforma ao recorrente por um período de dois anos.

  5. Até à passagem à situação de reforma do Recorrente, o contrato que existia entre este e a Recorrida, e que ambas as partes consideravam ser de trabalho, esteve em execução, pelo que, naturalmente, sendo as mensalidades de reforma benefícios sociais emergentes dele, estas são devidas para além da sua cessação, na medida em que emergiram da sua execução.

  6. O Recorrente perfez mais do que os exigíveis dez anos ao serviço na CCAM de ......, o que lhe garante o acesso ao direito peticionado.

  7. As exigências da vida e, da economia contemporâneas, vêm exigindo "o alargamento do critério de subordinação jurídica de forma a evitar que a autonomia com que alguns assalariados executam o seu trabalho seja de molde a excluí-los do âmbito de aplicação do Direito do Trabalho" 9. "A construção jurisprudencial conduziu a uma evolução da noção jurídica de subordinação (…) que já não resulta apenas da submissão às ordens para a execução do trabalho propriamente dito, mas também da integração do trabalhador numa organização colectiva de trabalho, concebida por e para outrem" (…).

  8. "Se o trabalhador tem uma determinada autonomia na execução do seu trabalho, é necessário para classificar o respectivo contrato, verificar a existência de outros indicadores - um feixe de indícios - que revelem uma eventual relação de subordinação".

  9. Na medida em foram dados como provados indícios como a execução pessoal e autónoma do trabalho, a sua disponibilidade, continuidade e exclusividade ao longo de mais de 14 anos ao serviço da CCAM, a sua sujeição ao controlo da direcção e da assembleia geral da CCAM, o local na empresa ou a duração do trabalho nos limites por ela praticados, os meios de trabalho sempre fornecidos pela CCAM, bem como os respectivos encargos profissionais serem assumidos pela recorrida, o facto de existir remuneração para este trabalho, consubstancia-se o "feixe de indícios" constitutivos do contrato de trabalho.

  10. Sem prejuízo disto, a inexistência de subordinação hierárquica não significa que não exista subordinação jurídica, entendida esta, como uma dependência face às decisões colectivas do executivo ou da assembleia geral da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo.

  11. O recorrente insere-se na previsão da norma da convenção colectiva que institui o leque de funções atribuíveis ao trabalhador que detenha a categoria profissional de director executivo de uma Caixa de Crédito Agrícola Mútuo.

  12. Falece o argumento da nulidade do contrato porque não se trata de uma lacuna que exija ser integrada com o recurso ao art. 598º do Código das Sociedades Comerciais, isto é não se trata de um caso que a lei não preveja (art. 10º do CC) uma vez que a norma da Convenção Colectiva prevê o exercício das funções e tarefas exercidas pelo recorrido, em regime de contrato de trabalho e, de forma livre e independente, isto é, com autonomia, pelo que a relação contratual como de trabalho não está ferida de nulidade.

  13. O Decreto Lei n.º 321/1982 de 17 de Junho operou uma profunda revisão da legislação reguladora do crédito agrícola mútuo pelo que este normativo se passou a aplicar em detrimento do Código Cooperativo.

  14. Neste diploma (Decreto Lei n.º 321/1982 de 17 de Junho) não se estabelece qualquer limitação à possibilidade de os trabalhadores ao serviço da CCAM serem admitidos como Associados nem o facto de serem trabalhadores é fundamento de inelegibilidade para os seus órgãos sociais.

  15. Com o Decreto-Lei n.º 24/91 de 11 de Janeiro que dotou as Caixas de Crédito Agrícola Mútuo de um novo regime jurídico, a situação manteve-se, continuando a não haver qualquer impedimento à admissão dos trabalhadores à qualidade de associados das CCAM, como se manteve a inexistência, como causa de inelegibilidade para os órgãos sociais de qualquer limitação aos trabalhadores da instituição.

  16. O Decreto-Lei n.º 230/95 de 12 de Setembro, que estabeleceu algumas alterações ao regime jurídico do crédito agrícola mútuo, também não trouxe alterações significativas a esta situação.

  17. Até à passagem à situação de reforma do recorrente, este contrato não foi declarado nulo, pelo que, naturalmente, sendo as mensalidades de reforma benefícios sociais emergentes de uma convenção colectiva de trabalho, estes são devidos para além da vigência do contrato de trabalho e por efeitos dele.

  18. Por tudo o exposto, a douta sentença, ora apelada, não faz uma aplicação de acordo com os princípios que enformam o direito do trabalho, ao caso vertente e, designadamente, as normas aplicáveis da clª 113ª e seguintes do CCTV para as Instituições de Crédito Agrícola Mútuo, publicado no B.T.E. 1ª série, nº45 de 8/12/1987.

    A Ré CCAMM apresentou resposta às alegações do recorrente.

    O Exmo. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se pronuncia no sentido de que, a não se entender que se impõe a volta do processo ao tribunal recorrido, por existir contradição na decisão proferida sobre a matéria de facto, é de julgar improcedente a revista.

  19. Fundamentação de facto As instâncias deram como provada a seguinte factualidade: 2.1. Desde o início da constituição da CCAM de ...... (9.8.83) que o Autor procedeu à gestão dos assuntos administrativos e comerciais da Caixa, de acordo com os objectivos e orientações gerais previamente fixados pela Direcção (da qual fazia parte) e pela Assembleia Geral.

    2.2. A Ré fornecia o material e os instrumentos de trabalho necessários à execução...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
5 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT