Acórdão nº 03S3876 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Março de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | FERREIRA NETO |
Data da Resolução | 03 de Março de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra "B, Lda.", alegando em síntese o seguinte: A Autora entrou ao serviço da Ré em 1/10/98, como Delegada de Publicidade, tendo o último salário mensal, em Janeiro de 2001, sido de 222.531$00.
Recebeu duas notas de culpa, com diferentes conteúdos, uma em 4/9/00, e outra em 16/11/00, às quais respondeu, tendo-lhe sido comunicado o despedimento por carta de 9/2/01.
Porém, já havia caducado o direito à acção disciplinar, sendo nulo o processo disciplinar, pelo que o despedimento deve ser considerado ilícito. Aliás, verifica-se também a inexistência de justa causa.
Conclui pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, com a reintegração no seu posto de trabalho, reservando-se, no entanto, a opção pela indemnização de antiguidade.
Realizada a audiência das partes, frustrou-se a tentativa de conciliação, vindo a Ré de seguida, na contestação, alegar, em síntese, que se verificam os factos imputados à Autora nas notas de culpa, os quais constituem justa causa para despedimento, concluindo pela improcedência da acção.
Foi proferido o despacho referido no art. 61º do CPT, com dispensa de audiência preliminar e de fixação de base instrutória.
Procedeu-se à audiência final, na qual o A. optou pela reintegração.
Elaborada a sentença, foi nela proferida a seguinte decisão: "Tudo visto e ponderado julgo não provada e improcedente a presente acção e absolvo a Ré do pedido".
Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, que o julgou improcedente.
Irresignada ainda, traz o presente recurso de revista, cujas alegações finais concluiu assim: a) A caducidade do procedimento disciplinar foi invocada pela ora Recorrente na respectiva PI, e, por outro lado, trata-se de uma questão de conhecimento oficioso (cfr. p. ex.: Ac. de 30/5/89, in BMJ nº. 387, Ano 1989, pág. 462º; Ac. de 21/04/93, Rec. Revista TRP - Proc. 862/91; b) Mais se verifica a situação excepcional descrita no art. 722º/2 do CPCT porquanto cabe a este Tribunal verificar do não respeito pelo ónus de impugnação especificada consagrado no art. 490º do CPC (nesse sentido, mutatis mutandis, cf. Ac. deste STJ de 14/03/90 in BMJ, 395º - 521º), c) O que efectivamente aconteceu quanto aos seguintes factos, devidamente invocados pela Recorrente e não impugnados pela Recorrida, além de confirmados pelos elementos documentais constantes dos Autos, mas que todavia, não foram considerados, devendo-o ser: - Na reunião de 04/07/02 esteve presente o Dr. C, gerente e director da Ré; - A nota de culpa datada de 04/09/00 foi enviada por carta registada com aviso de recepção, recebida a 07/09/00; d) Ora, nomeadamente por força dos arts. 328º e 331 n. 1 do CC, e ainda do art. 10º, 11 e 12 da LCCT, o prazo de caducidade do procedimento disciplinar consagrado no art. 31º/1 da LCT, verificável em relação a cada infracção individualmente considerada, apenas se suspende com a comunicação da nota de culpa ao trabalhador, ou com a instauração de processo prévio de inquérito desde que, nomeadamente, necessário; e) Quanto à comunicação da nota de culpa, como declaração recipienda, e de acordo com o disposto no art. 224 n. 1 do CC, apenas se torna eficaz logo que chegue ao poder do respectivo destinatário ou é dele conhecida; f) Quanto ao inquérito prévio, a respectiva necessidade, para efeitos do disposto no art. 10º/12 da LCCT, tem de ser real e efectiva (cf. Ac. deste STJ de 18/10/00, in Rec. Revista Ac. TRL - Proc. 1097/00), g) Necessidade real e efectiva esta cuja prova compete à Entidade Patronal; h) Nesta sequência, além de discutível porque conclusivo - implicando a prévia e discutível definição do que entender por início do processo disciplinar -, o facto provado sob o ponto 48 da matéria de facto assente afigura-se ainda de pouca relevância, por não ter qualquer efeito suspensivo no prazo do art. 31º/1 da LCT; i) Todo o processado daí até à nota de culpa datada de 04/09/00 apenas pode ser tido, materialmente desde logo, como processo de inquérito prévio, cuja necessidade se não verifica, não tendo sido nem invocada, nem provada pela Recorrida, como lhe competia; j) A nota de culpa por sua vez, que efectivamente tinha a virtualidade de interromper o prazo em causa, foi datada e enviada a 04/09/00, e, decorridos os trâmites postais posto que seguiu por carta registada com aviso de recepção, apenas foi recebida a 07/09/00; k) Só que previamente a esta data, já havia entretanto ocorrido a caducidade do procedimento disciplinar quanto a todos os factos ocorridos até à reunião de 04/07/00, inclusive, na medida em que tal reunião se destinava a tentar resolver as divergências manifestas entre a Recorrente e o Director Comercial da Recorrida, e por isso mesmo contando com a presença do gerente e director da Recorrida, Dr. C; l) Ou seja, a entidade patronal, devida e pessoalmente representada por aquele seu representante legal de pleno direito, teve pleno conhecimento dos factos em jogo e ocorridos até à reunião de 04/07/00, pelo menos nesse preciso momento, tendo o procedimento disciplinar pelos mesmos caducado no dia 03/09/00 (último dia possível para o respectivo início: o dia 02/09/00); m) Tal entendimento é ainda reforçado especificamente quanto à reunião de 15/05/00, posto que, conforme o próprio Acórdão recorrido reconhece: "relativamente aos factos ocorridos no dia 15.05.00 ainda se poderia dizer que o superior hierárquico com poderes disciplinares tomou conhecimento da infracção de imediato, o que motivou até a nota informativa nº. 5".
n) Deverá assim efectivamente proceder a invocada caducidade do procedimento disciplinar por todos os factos em jogo ocorridos até à reunião de 04/07/00, inclusive; o) Verifica-se, por outro lado, a nulidade de todo o procedimento por falta da comunicação a que a entidade patronal está obrigada, de acordo com o disposto nos arts. 10º/1, 12º/1, a), e 3, a), ambos da LCCT - nulidade esta que, visto o respectivo regime, e ainda que atípica, é de conhecimento oficioso; p) Há aqui que considerar o próprio teor das duas notas de culpa dirigidas à Recorrida, matéria de facto esta adquirida para devida apreciação nos presentes Autos nomeadamente nesta sede, por força do ponto 6. da matéria de facto assente; q) Ora, nas comunicações e notas de culpa anexas em causa nenhuma alusão sequer é feita no sentido de que os respectivos signatários estivessem a agir em nome da Recorrida, os mesmos não estão identificados, e são pelo menos dois quando, de acordo com o próprio teor de tais comunicações, apenas um único e mesmo instrutor havia para ambas as situações; r) Assim, dúvidas não restam quanto à própria inexistência de comunicação exigida pelo art. 10º/1, seja da parte da Recorrida, seja da parte de representante seu, até por força do disposto nos arts. 258º e 260º/1 do CC, cujo regime depende da actuação - inexistente no caso em apreço - em nome de outrem; s) Finalmente, também acontece não se verificar justa causa de despedimento, cujo conceito nuclear, na sequência da doutrina e jurisprudência supra citadas, se reconduz à questão de saber, para além da caducidade e da nulidade supra referidas, se, tudo visto, está provado um comportamento da parte da Autora tal, que a respectiva desvinculação imediata se tenha tornado tão valiosa juridicamente que a ela não pode obstar a protecção da lei à continuidade tendencial do contrato nem a defesa da sua especial situação como trabalhadora; t) Verifica-se, em primeiro lugar, que nem todos os factos que levaram à decisão de despedimento ficaram provados, e muito pelo contrário, ficou provado o oposto dos factos mais objectivos que a ora Recorrida imputava à Recorrente, relacionados quer com a marcação das respectivas férias, quer com a razão de ser da não realização de determinados trabalhos; u) Verifica-se, em segundo lugar, que os factos em causa têm a sua origem num contexto de manifesta lesão de determinados e legítimos direitos e expectativas da Arguida, desde logo quanto à referida marcação das férias; v) Mas também quanto à baixa da respectiva retribuição na vertente das "comissões", facto este a considerar, tal como supra exposto, porque invocado pela Recorrente e não impugnado pela ora Recorrida, antes por esta confirmado; w) Verifica-se, em terceiro lugar, o que coincide em absoluto com o que acabou de ser dito, que a Recorrente sempre havia sido uma trabalhadora verdadeiramente exemplar (pontos 16 a 19 da matéria de facto assente); x) Em quarto lugar, da conjugação dos factos anteriores resulta inequivocamente que a génese do presente litígio radica na própria actuação da Recorrente, que de modo algum se poderá afirmar estar isenta de culpas nesta matéria; y) Em quinto lugar, é facilmente perceptível, em todo este contexto, que o recurso da Recorrente à tutela não corresponde a qualquer falta de lealdade mas a uma derradeira tentativa de resolução graciosa do litígio em causa, ou seja precisamente o oposto, sendo certo que neste segundo caso nomeadamente o risco de exposição pública é incomparavelmente maior; z) Em sexto lugar, verifica-se que o grau de dependência financeira e funcional da Recorrida para com a tutela é de tal modo elevado que a consideração pela Recorrida de que a carta da Recorrente traduz um acto...
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