Acórdão nº 046931 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Janeiro de 1995 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelLOPES ROCHA
Data da Resolução11 de Janeiro de 1995
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 - A e B, com os sinais dos autos, responderam no Tribunal da Comarca de Santarém, em processo comum colectivo, depois de pronunciadas pela prática de quatro crimes de burla agravada previstos e punidos pelos artigos 313 e 314, alínea c) do Código Penal; cinco crimes de falsificação de documento, previstos e punidos pelo artigo 228, n. 1, alínea b) e 229 do mesmo Código; e quatro crimes de uso de documento falso previsto e punido pelo artigo 228, n. 1, alínea c) e n. 2 e 229, ainda do mesmo Código. Pelo acórdão de folhas 296 a 304, com data de 18 de Fevereiro de 1994, o Tribunal Colectivo absolveu a arguida B e condenou o arguido A: a) pela prática dos crimes de falsificação (cada um) na pena de 14 meses de prisão e trinta dias de multa à taxa diária de 500 escudos; b) pela prática de cada um dos quatro crimes de uso de documento falso, na pena de 13 meses de prisão e vinte e quatro dias de multa à taxa diária de 500 escudos, em alternativa 16 dias de prisão; c) pela prática de crime de burla previsto e punido pelo artigo 313 do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão; pela prática de outro crime de burla previsto e punido pelo mesmo artigo, em 9 meses de prisão; pela prática de outro crime de burla, ainda previsto no mesmo artigo, em 6 meses de prisão; enfim, pela prática de outro crime de burla também previsto e punido no mesmo artigo, na pena de 9 meses de prisão. Procedendo ao cúmulo jurídico das indicadas penas o Tribunal Colectivo condenou o arguido na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão em 100 dias de multa à taxa diária de 500 escudos, em alternativa 66 dias de prisão. Foi o arguido condenado ainda em 4 UCs de taxa de justiça, nas custas com 1 UC de procuradoria e em 1/100 de taxa de justiça fixada em termos e para os efeitos do artigo 13, n. 3 do Decreto-Lei n. 423/91. 2 - Inconformada com o decidido, interpôs recurso para este Supremo Tribunal, a Excelentíssima Delegada do Procurador da República, que motivou, concluindo como segue: 2.1 A arguida B acompanhou sempre o arguido A em todas as "aquisições" que fizeram nos estabelecimentos comerciais de Santarém. Ora, conhecendo ela o arguido como conhecia, não é possível que não se tivesse apercebido que este se identificava ora com o nome de C1, ora com o nome de C2, mas nunca com o seu verdadeiro nome, que a fotografia dos B.I. não era a do seu amigo e que não achasse estranho o volume e espécie das compras, nomeadamente que não questionasse a aquisição de dois relógios de senhora em ouro; 2.2 A análise destes factos de harmonia com o disposto no artigo 127 do Código de Processo Penal não permitia concluir que a arguida desconhecia o que se estava a passar; 2.3 A submissão que a arguida tinha relativamente ao arguido não significa ausência de vontade da sua parte, mas adesão à vontade daquele, fazendo-a sua; 2.4 Só faz sentido falar-se na submissão da arguida se se entender que ela tinha conhecimento dos factos; 2.5 Na determinação de valor consideravelmente elevado deve o julgador atender aos elementos de interpretação sistemática, nomeadamente o valor referido na alínea f) do artigo 1 da Lei 23/91, de 4 de Julho; 2.6 Assim, devem ser tidos como valores consideravelmente elevados os valores que se situem acima de 200000 escudos, ainda que corrigidos de acordo com a inflação verificada desde meados de 1991; 2.7 Na determinação da medida concreta da pena a aplicar em cúmulo jurídico deve atender-se, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente; 2.8 Sendo em muito maior número e significado as circunstâncias agravantes deve a pena concreta situar-se próximo da pena abstracta aplicável ao cúmulo; 2.9 O douto acórdão recorrido violou o disposto no artigo 127 do Código de Processo Penal, e os artigos 314, alínea c) e 78, do Código Penal; 2.10 Em face do exposto, ordenando a repetição do julgamento ou substituindo o douto acórdão recorrido por outro que condene o arguido A também por duas burlas agravadas previstas e punidas pelos artigos 313 e 314, alínea c) do Código Penal e em cúmulo jurídico em pena próximo do meio da pena que abstractamente lhe é aplicável, será feita justiça. 3 - Os arguidos apresentam a sua resposta, mas esta foi mandada desentranhar dos autos pelo despacho de folha 364, por extemporaneidade (ultrapassagem do prazo a que alude o artigo 413, n. 1, com referência ao artigo 411, n. 4, ambos do Código Penal). O mesmo despacho declarou o recurso próprio, recebido no efeito devido e que nada obstava ao seu conhecimento. Corridos os vistos legais, teve lugar a audiência com o formalismo prescrito na lei do processo. Cumpre agora apreciar e decidir. 4 - É a seguinte a matéria de facto considerada provada no Tribunal a quo: 4.1 No dia 15 de Janeiro de 1993, por volta das 15 horas e 16 minutos, os arguidos deslocaram-se a esta cidade de Santarém, vindos de Lisboa; 4.2 O arguido A trazia consigo vários cheques sem serem preenchidos nem assinados, da Nova Rede - Banco Comercial Português - agências das Olaias, Praça de Londres e Alvalade, Lisboa, correspondendo respectivamente às contas bancárias n. ..., n. ... e n. ..., tendo como titulares os nomes C1, D e C2, respectivamente; 4.3 Trazia ainda consigo, o mesmo arguido, três Bilhetes de Identidade - documentos de folha 12, cujo conteúdo se dá como reproduzido para os legais efeitos: um daqueles Bilhete de Identidade apresentava o n. .... de 27 de Março de 1992 e o nome de D; outro com o n. ....., de 26 de Março de 1992 e o nome de C1; outro com o n. ... de 26 de Março de 1992 e nome C2, todos do C.I.C. de Lisboa; 4.4 Todos os Bilhetes de Identidade acima identificados apresentam: no local próprio impressão digital de um dedo da mão; o nome manuscrito do titular ali referido, no local próprio da assinatura e no local próprio a fotografia aparentando ser do arguido; 4.5 Era intenção deste, ao deslocar-se à cidade de Santarém, comprar objectos de valor em diversos estabelecimentos comerciais e fazer os pagamentos com aqueles cheques e identificando-se com o Bilhete de Identidade do titular das contas a que pertencia o cheque utilizado na compra e venda respectiva; 4.6 Na concretização deste seu desígnio, o arguido, acompanhado da arguida B, entrou no estabelecimento comercial de electrodomésticos denominado Roberto da Silva Teipas, sito na Rua Capelo Ivens, n. 60, nesta cidade de Santarém; 4.7 Uma vez aí o arguido decidiu comprar uma câmara de video "Song" TR. 105 n. 3030728 pelo preço de 190 mil escudos e um par de colunas de som auto pelo preço de 17500 escudos; 4.8 Para pagamento de tal importância global - 207500 escudos, o arguido, no balcão, à frente da responsável do estabelecimento, E, preencheu com o seu próprio punho o cheque n. ... da Nova Rede, Olaias, em que figurava como titular C1, contra n. ...., escrevendo nos lugares respectivos aquele montante quer por extenso quer por numerário, a data e local da emissão, tudo conforme documento de folha 16, cujo conteúdo se dá como reproduzido para os legais efeitos; 4.9 Ainda no mesmo circunstancialismo descrito, o arguido, com o seu próprio punho escreveu aquele nome C1 no lugar destinado à assinatura do cheque e exibiu àquela E o Bilhete de Identidade atrás identificado em que como titular figurava aquele C1 como se este fosse o seu nome e aquele o seu Bilhete de Identidade; 4.10 O arguido entregou o cheque à E e saíu com as compras efectuadas do estabelecimento, sempre acompanhado da B; 4.11 Seguidamente o arguido, acompanhado da arguida, dirigiu-se ao estabelecimento comercial de ourivesaria "Luciano Carlos dos Santos, Limitada", sito na Rua Capelo Ivens n. 121, onde, após ter observado com a arguida diversos artigos expostos decidiu comprar um relógio em ouro amarelo de senhora, marca Cortina, pelo preço de 450 mil escudos, dizendo o arguido ao empregado F que o relógio era para a mulher que o acompanhava, a arguida B; 4.12 Para pagamento daquela importância o arguido, no balcão à frente daquele F preencheu com o seu próprio punho o cheque n. ...da Nova Rede - Olaias em que figurava como titular C1, conta n...., escrevendo nos lugares próprios aquele montante por extenso e em numerário, a data e local da emissão; 4.13 Ainda no mesmo circunstancialismo descrito, o arguido, com o seu próprio punho escreveu aquele nome C1 no lugar destinado à assinatura do cheque e exibiu ao empregado F o Bilhete de Identidade atrás identificado em que como titular figurava o dito C1, como se aquele fosse o seu Bilhete de Identidade e este o seu nome; 4.14 O arguido entregou o cheque assim preenchido e assinado ao empregado da ourivesaria, recebeu o relógio e com a arguida B saíram do estabelecimento; 4.15 Seguidamente o arguido, acompanhado da arguida, dirigiram-se para a casa "Grandela Aires", sita na Rua Teixeira Guedes, n. 7, nesta cidade de Santarém onde decidiu comprar uma máquina fotográfica Canon EOS modelo 1000 FN C/35/80 com o n. 425446/4200286, pelo preço de 109000 escudos. 4.16 Para pagamento daquela importância o arguido preencheu ao balcão à frente do dono do estabelecimento G, com o seu próprio punho o cheque n. ..., Nova Rede, agência da Alvalade, conta n. ..., em que figurava como titular C2, escrevendo em lugares próprios aquele montante, quer por extenso quer por numerário, a data e local de emissão; 4.17 O arguido, no mesmo circunstancialismo, naquele cheque, com o seu próprio punho, escreveu o nome de C2 no lugar destinado à assinatura e exibiu àquele G o Bilhete de Identidade atrás referido em que como titular figurava o nome C2, como se aquele fosse o seu nome e o seu Bilhete Identidade; 4.18 Seguidamente o arguido entregou o cheque assim preenchido e assinado ao G recebeu a máquina fotográfica e acompanhado da arguida saíram do estabelecimento; 4.19...

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