Acórdão nº 05B1807 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ARAÚJO BARROS |
Data da Resolução | 12 de Julho de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A", L.da" intentou, no Tribunal Judicial de Bragança, acção ordinária contra B e mulher C, peticionando a condenação dos réus a pagarem-lhe a quantia de 2.111.000$00 acrescida dos juros vincendos até integral pagamento.
Alegou para tanto, em síntese, que: - se dedica à actividade de carpintaria e, nessa qualidade, executou trabalhos de carpintaria consistentes no fabrico de materiais e colocação em obra dos réus, reproduzidos nos orçamentos juntos; - em 30 de Maio de 2001 foi notificada pelos réus da resolução do contrato de empreitada por estes, assim como para levantar todas as madeiras colocadas na obra sob pena de as levantarem à custa dela; - os réus não quiseram manter o contrato e desistiram da empreitada, mas a autora havia executado trabalhos no valor de 2.111.000$00 que lhe não foram pagos, sendo credora dessa quantia.
Contestaram os réus e deduziram reconvenção, em que pediram a declaração de resolução do contrato de empreitada e a condenação da autora a pagar-lhes a quantia de 1.178.338$00 e juros legais até pagamento.
Alegaram, em suma, que: - as madeiras a fornecer deviam ser de 1ª qualidade e secas e os tectos interiores e exteriores deveriam ser colocados com tratamento e acabamento de fábrica e as demais teriam verniz por conta dos réus; - foi acordado o preço de 3.810.000$00 e a autora iniciaria os trabalhos logo que a obra estivesse pronta a recebê-los; - a autora iniciou os trabalhos exteriores sem a obra estar pronta a recebê-los por falta de remate das varandas, tectos e beiral e a madeira colocada não correspondia à negociada; - os tectos interiores foram mal colocados apresentando fissuras e empenos, desvios e desníveis, manchas e nós visíveis na madeira, que tornam a obra inaceitável; - os réus reclamaram desses e de outros defeitos mas a autora insistiu na continuação da obra sem atender às reclamações; - apesar disso iniciou a colocação do soalho, mas a madeira vinha com humidade e terra e eram notórias manchas amareladas, e nessas circunstâncias chamaram a atenção da autora para a madeira e informaram-na que caso não estivesse em condições não aceitariam aquele material; - a autora colocou parte desse soalho, o qual apresentava empenos e manchas que atingiam a madeira em profundidade, e nem as ripas para suporte do soalho estavam bem colocadas pois estavam baixas e espaçadas demais, e calçadas; - face a esses factos os réus reclamaram e disseram-lhe para não continuar os trabalhos até proceder à substituição das madeiras, o que a autora recusou; - porque a autora continuava os trabalhos sem substituir os materiais estragados e depois de a avisarem de que não aceitariam a obra naquelas condições, em Dezembro informaram a autora que tinham perdido a confiança, que resolviam o contrato e devia proceder ao levantamento dos materiais colocados na obra que não aceitavam, o que incluía os tectos exteriores e os soalhos; - a autora aceitou esse facto e procedeu ao levantamento do soalho e retirou da obra (nessa altura não eram ainda manifestos defeitos nas portas exteriores e nos tectos interiores que vieram a revelar-se) razão pela qual nessa altura quiseram acertar contas com a autora relativa às portas e aos tectos interiores do 1º andar desde que fossem eliminados alguns defeitos, o que a autora não quis; - o resto da obra contratada não veio a ser executado; - foi tentada a resolução amigável do litígio que não chegou a bom termo; - por causa dessa actuação a obra atrasou de Janeiro a Julho de 2001, e os autores tiveram de suportar os juros com o empréstimo contraído para a sua construção e os encargos com a garantia bancária exigida pela Câmara Municipal, sem qualquer contrapartida no uso da moradia, e correspondente ainda a idêntico atraso na venda ou aluguer da casa onde habitavam e que contribuiria para amortização do financiamento e diminuição dos encargos bancários.
Respondeu a autora, aceitando alguns factos e impugnando outros em relação ao contrato e à reconvenção, sustentando não existir prazo para fazer a obra contratada e não ser responsável por compromissos com terceiros.
Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com gravação da prova, vindo, depois, a ser proferida sentença em que se decidiu: a) julgar improcedente a acção e, em consequência, absolver os réus do pedido; b) julgar procedente a reconvenção e, em consequência, condenar a autora "A", L.da" a pagar aos réus B e mulher C, a quantia de 5.877,53 Euros (equivalente a 1.178.338$00) acrescida dos juros à taxa legal de 4%, deste a data da sentença até integral pagamento.
Inconformada apelou a autora, sem êxito embora porquanto o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 25 de Novembro de 2004, julgou improcedente a apelação confirmando a sentença recorrida.
Interpôs, agora, a autora recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que julgue a acção procedente e improcedente a reconvenção.
Não houve contra-alegações.
Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.
Nas alegações do recurso a recorrente formulou as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. Resulta da matéria de facto provada, designadamente do ponto 29, que em inícios de Dezembro de 2000 os réus informaram a autora de que tinham perdido a confiança na realização dos trabalhos contratados pelo que resolviam o contrato.
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A atitude dos réus, tomada em início de Dezembro de 2000 e posteriormente em Fevereiro e Março de 2001, é contrária à chamada hierarquização dos direitos do dono da obra, prevista no art. 1222º do C.Civil.
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Com efeito, o dono da obra não pode, desde logo, lançar mão da redução do preço ou da resolução do contrato, sendo possível a rectificação da prestação imperfeita.
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Deverá primeiramente exigir o cumprimento perfeito pela eliminação dos defeitos ou reconstrução da obra e só na hipótese de o empreiteiro, por impossibilidade, desproporcionalidade ou recusa, não renovar o cumprimento em conformidade com o contrato, nos termos devidos, é que o dono pode exigir uma redução adequada da sua contraprestação ou a resolução do contrato por incumprimento (nesse sentido, Ac. STJ de 02/12/93, in CJ 1993, III, pag. 157; Ac. RP de 25/05/92, in CJ 1992, III, pag. 291; e Ac. RL de 09/05/96, in CJ 1996, III, pag. 185).
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No caso em apreço está assente nos pontos n°s 4 e 5 da matéria de facto dada como provada, que, por um lado, os réus comunicaram à autora a sua intenção de resolverem o contrato de empreitada e, ao mesmo tempo, aceitaram parte da obra, designadamente as madeiras colocadas nos tectos interiores do primeiro andar e a madeira das três portas colocadas na obra, isto é, a porta da entrada principal e as portas da cozinha regional e garagem, o que, de alguma forma, se revela contraditório e suscita a questão da possibilidade da resolução parcial do contrato e, por outro, que a autora, além de ter proposto a redução do preço da empreitada, o que, aliás, lhe não competia, mas sim aos réus, enquanto donos da obra, manteve sempre a intenção de dar cumprimento ao contrato de empreitada celebrado entre as partes, aceitando, expressamente, resolver os defeitos invocados por aqueles.
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Não obstante tal atitude da autora os réus, conforme assente no ponto n° 7 da matéria de facto, referiram que não efectuaram qualquer proposta à autora e que não aceitavam que esta se dispusesse a resolver os defeitos da obra, inviabilizando, dessa forma, que a autora pudesse dar cumprimento à empreitada, como era sua vontade.
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Ora, tendo a autora proposto a redução do preço e aceitado resolver os defeitos existentes na obra, não era lícito aos réus resolverem o contrato nos moldes em que o fizeram, antes, face à disponibilidade da autora para o efeito, estipularem um prazo para que esta pudesse ter resolvido os defeitos invocados por aqueles e dar cumprimento ao contrato de empreitada celebrado.
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Nessa medida, não deve a presente resolução do contrato pelos réus, pelas razões aduzidas supra, ser enquadrada nos termos e com os efeitos julgados pelas Instâncias, porquanto os réus, contrariando a hierarquia dos direitos atribuídos pela lei ao dono da obra, lançaram, de imediato, mão da figura da resolução do contrato, quando o que deveriam ter feito era exigir, em primeiro lugar a reparação dos defeitos e, na impossibilidade de obterem tal desiderato, exigirem a reconstrução da obra, a redução do preço ou a resolução do contrato, tal como dispõe o art. 1222º do C. Civil.
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Da matéria de facto dada como provada, resulta que com a sua supra referenciada actuação, a autora provocou atrasos na obra, de Janeiro a Julho de 2001.
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O que se nos dá à apreciação no caso em apreço, é que os réus declararam à autora, em Dezembro de 2000, que resolviam o contrato de empreitada, sendo que, mais tarde, em Fevereiro e Março de 2001, reiteraram tal intenção, fazendo letra morta das intenções...
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