Acórdão nº 05P224 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Março de 2005 (caso NULL)
Data | 10 Março 2005 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. A foi julgado na 1ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia e, por Acórdão de 14 de Abril de 2004, foi decidido condená-lo, pela prática de um crime de homicídio qualificado na forma tentada, p.p. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 22, 23, 73, 131 e 132, n.ºs 1 e 2, alíneas d), g) e i) do Código Penal, e de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p.p. pelos artigos 1 e 6 da Lei nº 22/97, de 27 de Junho, respectivamente, nas penas de 9 anos de prisão e 6 meses de prisão, e em cúmulo jurídico, na pena única de 9 anos e 2 meses de prisão.
Do acórdão da 1ª instância recorreu o arguido para o Tribunal da Relação do Porto, a impugnar a matéria de facto provada e a pedir uma redução de pena, mas esse Tribunal, por Acórdão de 13 de Outubro de 2004, decidiu julgar o recurso improcedente e manteve a decisão recorrida.
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Do acórdão da Relação do Porto recorre agora o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça e, da sua fundamentação, retira as seguintes conclusões: 1. O recorrente foi condenado, em 1ª instância, na pena de 9 (nove) anos de prisão pelo cometimento do crime de homicídio qualificado na forma tentada, p.p. pelas disposições conjugadas dos art.s 22, 23, 73, 131 e 132 n.s 1 e 2, als. d), g) e i) do Código Penal.
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Discordou o recorrente da pena que lhe foi aplicada. Daí o recurso para o Venerando Tribunal da Relação do Porto. E porque não foi atendido ao sufragado naquele recurso e foi mantido o decidido, continua o recorrente a não se conformar com a decisão. É que 3. Não foram devidamente sopesadas as circunstâncias que depõem a favor do recorrente e que determinariam a aplicação de pena de prisão em medida inferior.
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A pena para além de fazer face às exigências de prevenção geral de revalidação contra-fáctica da norma violada, terá que ter em conta as exigências individuais e concretas de socialização do agente, sendo certo que na sua determinação ter-se-á que entrar em linha de conta com a necessidade de evitar a dessocialização do agente.
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A pena de 9 (nove) anos de prisão mostrava-se e mostra-se, por isso, claramente desajustada.
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É que face aos critérios legais estipulados pelo art. 71 n.s 1 e 2 do C. Penal, o recorrente, deveria ser punido, por tal crime, em medida não superior 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão.
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Violou, pois, o acórdão recorrido os art.s 40, 70 e 71 n.ºs 1 e 2 als. a), b), c), d) e e) do C. Penal.
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Respondendo ao recurso, o M.º P.º na Relação do Porto pronunciou-se pelo seu não provimento.
A Excm.ª P.G.A. neste Supremo teve vista nos autos.
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Colhidos os vistos e realizada a audiência com o formalismo legal, cumpre decidir.
A única questão colocada pelo recorrente é a da medida da pena, que quer ver reduzida a 4 anos e 8 meses de prisão, mas, antes de mais, torna-se necessário apurar se a qualificação jurídica dos factos é a correcta, isto é, se o crime tentado é o de homicídio qualificado ou o de homicídio simples.
Os factos provados são os seguintes:
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O arguido e o ofendido, B, já se conhecem há cerca de vinte anos, tendo mesmo havido entre eles uma relação de amizade desfeita, em 2001, por questões de mau relacionamento entre as duas famílias a que pertenciam, o que teria levado à confrontação física entre alguns dos seus elementos.
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Por via disso, no dia 7 de Setembro de 2001, por volta das 23.30 horas, o arguido deslocou-se ao café denominado "Vai Chover", sito na Rua 25 de Abril, Madalena, nesta comarca, local que sabia ser habitualmente frequentado pelo ofendido B.
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Ali chegado, depois de ter visto o ofendido naquele café, chamou-o e pediu-lhe para o acompanhar, pois queria ter uma conversa com ele, o que o ofendido fez, tendo ambos saído do café e ido para junto de um muro ali existente, à direita do referido estabelecimento, levando em conta o sentido de quem sai do estabelecimento.
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Após uma breve conversa, que durou cerca de dois minutos, encontrando-se os dois próximos um do outro, o arguido empunhou uma arma de fogo, de calibre 6,35 mm, que trazia escondida e efectuou dois disparos, que atingiram o ofendido B na cabeça, após o que se ausentou do local, deixando o ofendido caído no solo.
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Como consequência directa e necessária dos disparos, sofreu o ofendido B duas feridas perfurantes com queimaduras periféricas na zona occipital direita da cabeça, tendo um dos projécteis sido retirado, enquanto que o outro ficou alojado na massa encefálica, lesões que lhe determinaram 365 dias de doença, com igual período de incapacidade para o trabalho e, de forma permanente, epilepsia pós-traumática.
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O arguido, ao efectuar os dois disparos contra o ofendido B nos termos referidos, quis tirar-lhe a vida, só não o tendo conseguido por circunstâncias externas à sua vontade, nomeadamente por os projécteis não terem atingido nenhuma zona vital da cabeça e por ter sido rapidamente conduzido ao Hospital de Santo António, onde lhe foram prestados os primeiros socorros e foi sujeito a intervenção cirúrgica que lhe permitiu salvar a vida.
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Sabia o arguido que só os titulares de licença de uso e porte de arma de defesa é que podem possuir armas de calibre 6,35 mm, e actuou querendo possuir uma, sem que para tal estivesse devidamente licenciado.
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O arguido actuou sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que o seu comportamento era proibido e punido por lei.
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À data da prática dos factos, o arguido encontrava-se a trabalhar como motorista e vivia com a sua esposa.
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O arguido tem o 6º ano de escolaridade e é estimado no seu meio social, sendo considerado uma pessoa responsável, séria e trabalhadora.
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O arguido frequenta um curso de informática no EP e recebe regularmente visitas da mulher e de outros familiares.
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O arguido não apresenta antecedentes criminais.
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O Hospital Geral de Santo António prestou assistência ao ofendido B no período compreendido entre 8/9 e 2/10/2001, ascendendo o custo de tal assistência ao montante de € 8.481,92.
Os factos provados não evidenciam qualquer dos vícios a que se reporta o art. 410, n. 2, do CPP, pelo que se consideram definitivamente adquiridos.
TENTATIVA DE HOMICÍDIO: QUALIFICADO OU SIMPLES? Como os autores notam (1), o legislador português optou por determinar que o homicídio qualificado não é mais do que uma forma agravada do homicídio simples previsto no art.º 131 do C. Penal ("Quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de 8 a 16 anos").
Não há, pois, diversos tipos criminais de crimes contra a vida, mas apenas um, que é o crime base, sendo que há circunstâncias que especialmente o agravam (crime qualificado) e outras que especialmente o atenuam (crime privilegiado). Por isso, também está fora de questão que se considere o crime base o de homicídio qualificado, não sendo o homicídio simples mais do que uma forma atenuada daquele.
A qualificação do crime vem prevista no art.º 132 e aí o legislador não quis organizá-la de uma forma taxativa, antes optou por uma fórmula aberta, embora cingida a certos parâmetros, que deixa ao aplicador uma margem de ponderação das circunstâncias, por forma a casuisticamente determinar se este ou aquele facto...
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