Acórdão nº 06B1441 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Maio de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução18 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "AA" intentou, no dia 11 de Outubro de 2000, contra BB e CC, acção declarativa constitutiva, com processo ordinário, pedindo execução específica de indicado contrato-promessa de compra e venda de uma parcela de terreno para construção a destacar de determinado prédio ou a pagar-lhe 8 500 000$ relativos a indemnização pelo aumento do valor daquela parcela e a reconhecer-lhe o direito de retenção sobre ela, com fundamento no incumprimento pelos réus daquele contrato.

Os réus, em contestação, negaram o direito da autora à execução específica e, em reconvenção, pediram a declaração da nulidade do referido contrato-promessa por envolver prestações de realização impossível, e a condenação da autora por litigância de má fé, e a autora replicou no sentido da validade daquele contrato.

À autora foi concedido, por despacho proferido pelo órgão da segurança social no dia 29 de Outubro de 2002, pedido no dia 16 desse mês, na fase de oferecimento de prova, apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 17 de Maio de 2005, reformada por outra de 7 de Junho de 2005, por via da qual os réus foram absolvidos do pedido de execução específica do contrato-promessa e condenados a pagar à autora € 14 291, 79 e juros, e a autora absolvida do pedido reconvencional.

Apelaram os réus, e a Relação, por acórdão proferido no dia 14 de Dezembro de 2005, negou provimento ao recurso.

Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão é nulo por não ter tomado posição devidamente fundamentada sobre a determinabilidade do objecto do contrato-promessa; - a Relação violou os artigos 286º do Código Civil e 660º, n.º 2 e 668º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil por não haver declarado a nulidade da sentença; - o contrato-promessa é nulo por ser indeterminável em razão de dele não constarem as circunstâncias da delimitação da parcela de terreno e não poder ser posteriormente individualizada; - as estipulações verbais, posteriores ao documento do contrato-promessa não podiam ser provadas por testemunhas, por deverem ser reduzidas a escrito e, como o não foram, são nulas; - não podia ser aplicado o disposto no artigo 442º, nº 2, do Código Civil porque a recorrida não resolveu o contrato-promessa nem pediu a sua resolução; - a posse da parcela de terreno pela recorrida não lhe acrescentou qualquer valia, e, como o preço convencionado foi inferior ao seu valor objectivo à data do contrato, para efeito de indemnização deve ser considerado o valor de mercado e não o de 2 000 000$; - o incumprimento do contrato-promessa também é imputável à recorrida por virtude da sua inoperância quanto à elaboração do projecto de construção de que dependia a autorização camarária do destaque e deste sendo também dependente a celebração da escritura; - a responsabilidade dos recorrentes pela não celebração da escritura deve ser excluída ou pelo menos reduzida, nos termos do artigo 570º, n.º 1 do Código Civil, por a recorrida ter contribuído decisivamente para que não fosse cumprido o contrato-promessa; - a exigência pela recorrida da entrega no notário da certidão camarária de autorização do destaque, sabendo que isso é impossível, constitui abuso do direito; - a recorrida não gerou mais valia na parcela de terreno, o pedido de indemnização em virtude do aumento do valor da coisa é exagerado, visou o enriquecimento da recorrida, excede os limites pela boa-fé e pelo seu fim económico, configurando abuso de direito; - não devem ser condenados a indemnizar a recorrida pelo aumento do valor da coisa, ou, pelo menos, deve a indemnização ser substancialmente reduzida; - o acórdão recorrido violou os artigos 220º, 221º, n.º 2, 238º, 280º, nº 1, 334º, 393º, 410º, nº 2, 436º, nº 1, 442º, n.º 2, 570º e 875º do Código Civil, 6º, n.º 4 do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, e 660º, nº 2, e 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.

Respondeu a recorrida, em síntese de alegação: - a sentença não é nula, porque conheceu das questões suscitadas, e o acórdão recorrido tomou posição fundamentada sobre a determinabilidade do contrato-promessa; - ao autorizarem-na a transmudar a parcela, deixaram os recorrentes ao seu critério a sua própria localização, pelo que o contrato-promessa não é nulo por indeterminabilidade do seu objecto; - a interpretação das declarações negociais produzidas no contrato-promessa podem ser objecto de prova testemunhal; - não entregou o projecto de construção na Câmara por virtude de os recorrentes haverem recusado a sua colaboração, questão só levantada em sede de recurso; - o incumprimento do contrato resultou de culpa dos recorrentes, que se presume, e não há abuso de direito na exigência da entrega da certidão camarária de autorização do destaque, porque lhe competia marcar a escritura e aos recorrentes a entrega dos documentos necessários; - no pedido de indemnização pelo incumprimento do contrato-promessa está implícito o pedido de resolução do contrato-promessa; - a indemnização pelo valor da coisa está dependente da tradição da coisa, e o aumento do seu valor verificado entre a data do contrato e a do não cumprimento é a diferença entre o seu valor actual e o montante do preço convencionado; - não agiu nesta parte com abuso do direito.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A autora e os réus declararam, por escrito, no dia 3 de Setembro de 1999: - os últimos prometer vender e a primeira prometer comprar, por 2 000 000$, uma parcela de terreno com a área de 1 000 metros quadrados do prédio rústico denominado Campo da Espregueira, situado em Breia, freguesia de Fragoso, Município de Barcelos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Barcelos sob o nº 84 631 - Fragoso, inscrito na matriz rústica sob o artigo 2577 - antigo artigo 440º - da freguesia de Fragoso, a destacar do prédio mencionado; - ser o pagamento de 500 000$ de sinal e o resto no acto da escritura, a efectuar após a entrega pelos réus de todos os documentos necessários para a sua realização; - ser a parcela vendida livre de quaisquer ónus e encargos e que com a assinatura do presente contrato e com o recebimento do sinal, os réus entregavam-na à autora, autorizando-a a ocupá-la e a iniciar nela as obras que pretendia levar a efeito, bem como, se assim o entendesse, a transmudá-la total ou parcialmente, e que a escritura de compra e venda seria feita em dia, hora e local a indicar aos réus pela autora.

  1. A autora entregou aos réus a quantia de 500 000$, e a aquisição do prédio referido sob 1 não se encontrava registada em nome dos réus, sendo composto por culturas, videiras, uma ramada e castanheiros, e a primeira, aquando das declarações mencionadas sob 1, tinha conhecimento que a parcela dava para a construção e podia ser desanexada.

  2. Na sequência das declarações mencionadas sob 1, a autora e os réus delimitaram, no local, através de esteios de granito cortados e espetados no terreno bem como através de um traço de tinta branca, uma parcela de terreno, correspondente à que pretendiam negociar, da qual a autora tomou logo posse, estando essa parcela implantada a partir de um caminho público que a confronta a Sul, sendo aí limitada por um muro com um desenvolvimento curvilíneo, sendo a nascente limitada pelo muro de granito na Quinta da Espregueira, medindo a referida parcela, em linha recta, a sul, 33,0 metros, a norte 25,94 metros, a nascente 32,32 metros e a poente 31 metros, com a área total de 880 metros quadrados.

  3. O terreno confina com uma estrada parcialmente pavimentada com calçada de cubo de granito, há naquela estrada energia eléctrica, próximo do prédio existe uma casa de habitação, a nascente da Quinta da Espregueira, e outra a Sul e na parcela há vestígios de uma casa nela implantada.

  4. A autora limpou a parcela das silvas, mato e ervas, passou a entrar nela quando o entendesse, descolou, no muro do terreno, as pedras que estavam caídas, à vista de toda a gente, como se de coisa própria se tratasse, e o prédio situa-se em zona classificada como de construção no Plano Director Municipal de Barcelos, podendo ser loteado e ou desanexado.

  5. O preço corrente do terreno para construção ronda na freguesia de Fragoso € 25 por metro quadrado, e os réus não apresentaram o pedido à Câmara Municipal de Barcelos para destacar a parcela mencionada sob 1.

  6. No dia 24 de Fevereiro de 2000, a autora notificou judicialmente os réus para comparecerem no dia 28 de Março de 2000, pelas onze horas e trinta minutos, na Secretaria Notarial de Esposende, a fim de efectuarem a escritura, e que estava nessa data à sua disposição naquela Secretaria a restante parte do preço, e para, no dia 20 de Março de 2000, entregaram a fotocópia dos bilhetes de identidade, dos cartões com o número do contribuinte, bem como as certidões do teor matricial, da conservatória do registo predial e da câmara municipal a autorizar o referido destaque, necessários à celebração da escritura.

  7. Após a notificação mencionada sob 7 os réus escreveram à autora, no dia 22 de Março de 2000, uma carta, em que lhe expressaram o seguinte: "Solicitada a informação junto dos serviços competentes da Câmara Municipal de Barcelos, foi-nos dito que aquela instituição não autoriza o destaque de qualquer parcela do prédio correspondente ao artigo 2577º da matriz predial de Fragoso. Dada tal posição da Câmara Municipal de Barcelos, verifica-se que, por razões que não nos são imputáveis, o contrato-promessa de 3 de Março de 1999 não é possível de concretizar. Comunicava-mos ainda a V.Exª que a partir desta data encontra-se ao dispor de V.Exª a quantia de 500 000$ a que o contrato mencionado se refere".

  8. A carta mencionada sob 8 foi recebida pela autora e os réus deslocaram-se ao Cartório Notarial de Esposende e colocaram à disposição daquela a...

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