Acórdão nº 99A792 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Janeiro de 2000 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelRIBEIRO COELHO
Data da Resolução11 de Janeiro de 2000
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A, propôs contra B e sua mulher C uma acção declarativa com processo ordinário, distribuída ao 13. Juízo Cível de Lisboa, pela qual pediu a condenação dos réus a pagarem-lhe a quantia de 203559459 escudos, com juros legais desde 31 de Março 1989 e até efectivo pagamento sobre 155151262 escudos e acrescida do valor correspondente ao imposto do selo desde 31 de Fevereiro de 1989 até integral pagamento, baseando-se no facto de ter comprado, por ordem do réu, diversos títulos na bolsa que atingiram esse valor global de 155151262 escudos mas que os réus lhe não pagaram. Depois, alegando erro por defeito no cálculo que fizera do imposto de selo devido até 31 de Março de 1989, ampliou o pedido para 204798573 escudos e trinta centavos. Após contestação, saneamento, condensação e audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferido despacho a responder ao questionário, houve sentença que absolveu os réus do pedido e que a Relação de Lisboa, em apelação do autor, confirmou - sendo de registar que ao alegar nesta apelação o autor pediu. Deste acórdão vem trazido pelo A o presente recurso de revista onde pede que se julgue parcialmente procedente a acção, com a condenação do réu a pagar-lhe 216892545 escudos e oitenta centavos, com juros e demais encargos da lei, formulando, ao alegar, conclusões onde, com utilidade para a causa, defende o seguinte: I- O acórdão recorrido qualificou os factos que as instâncias deram como provados em termos de mandato com representação, conforme o disposto nos artigos 1157 e 1178 do CC. II- Porém, na realidade, trata-se de um mandato "sui generis", ou melhor, dum contrato de gestão de uma carteira de valores mobiliários, com normas próprias, espécie do género de prestação de serviços, como também é o mandato, o qual se encontra previsto no DL 229-E/88, de 4 de Julho, artigo 1, n. 1, no DL 229-I/88, de 4 de Julho, artigos 2, n. 2, alínea a) e artigo 3, n. 1 e 2, alínea a), no DL 77/86, artigo 6-A, aditado pelo DL 308/90, de 29 de Setembro, no Código do Mercado de Valores Mobiliários, artigo 608, alínea h), no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo DL 298/92, de 31 de Dezembro, artigos 4, n. 1, alínea h) e 199-A, n. 1, e no DL 260/94, de 22 de Outubro, artigo 3, n. 1, alínea e), o qual é executado numa base discricionária e individualizada (cit. RGICSF, artigo 199, n. 1, alínea d) e n. 2 e secção B) do anexo à Directiva n. 93/22/CEE, do Conselho, de 10 de Maio de 1993. III- As ordens do réu para compra dos títulos em causa, assinadas em branco, não obstam a que ele esteja obrigado ao pagamento das quantias pedidas nesta acção, pois a assinatura dele, que consta dessas ordens, não foi por qualquer forma impugnada, e embora tenha havido assinaturas em branco, a verdade é que o facto também não obsta a que o réu esteja obrigado ao dito pagamento, pois não foi alegado que tivesse havido abuso de preenchimento ou que as referidas ordens lhe foram subtraídas, considerando-se que aceitou as declarações insertas nesses documentos (CC. artigos 374, 376, n. 2 e 378). IV- O artigo 239 do CCOM não é aplicável ao caso dos autos, pois que não se coaduna com a rapidez e a oportunidade na execução das operações de bolsa, aplicando-se antes o disposto no artigo 1161, alínea b) do CC, que só obriga o mandatário a prestar as informações pedidas pelo mandante, relativamente ao estado da gestão. V- Aliás, o dever de informação que incumbe aos intermediários financeiros é o de informar claramente os clientes, antes da execução ou prestação dos respectivos serviços, para além dos previstos na lei (CMVM, artigo 663, n. 1, alínea b)). VI- As relações entre as instituições de crédito e os respectivos clientes assentam essencialmente numa base de confiança, de maneira que para o caso não importa que as aquisições de títulos para o réu tenham atingido valores avultados, em desproporção com a sua capacidade financeira, pretensamente manifestada através dos títulos que tinha em depósito e do saldo, a seu favor, da respectiva conta de depósito à ordem, na altura. VII- E não releva que o contrato de gestão da carteira de títulos do réu, celebrado com a extinta D, não tivesse sido ainda recebido pela ordem jurídica positiva, pois tratava-se de um contrato praticado e aceite de harmonia com os usos bancários, devendo considerar-se, assim, já então "juridificado", portanto com regras cogentes. VIII- Perante a matéria de facto averiguada pelo tribunal colectivo, com as respostas aos quesitos 10 a 17, inclusive, 27 a 29, 39 a 41, inclusive, 45 a 47, inclusive, 51 a 56, inclusive, e 66 a 70, inclusive, e ainda perante a matéria de facto decorrente das respostas aos quesitos 2, 3, 5, 6, 8, 9, 19, 22, 23, 25, 26, 31, 32, 34, 35, 37, 38, 43, 44, 49, 50, 58, 59, 61 e 62, o réu marido não pode deixar de ser condenado na quantia total de 216892545 escudos e oitenta centavos, com juros e demais encargos da lei. Não houve resposta. Por entender que era configurável como integrando litigância de má fé a conduta do recorrente ao formular agora a pretensão acima indicada, superior, sem qualquer justificação, à que sustenta na apelação, o relator convidou as partes a sobre esta questão se pronunciarem em dez dias. Só o recorrente respondeu, indicando cálculos diversos, reduzindo o pedido para 92375549 escudos e cinquenta centavos acrescidos de juros e imposto do selo e atribuindo, em parte, o que diz terem sido erros de cálculo anteriores à alegada pouca clareza e complexidade da matéria de facto havida como assente. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. O recorrente considera provada matéria que como tal não foi declarada pelas instâncias, o que obriga à exposição de toda a que vem dada como assente no acórdão recorrido para depois se apreciar a razão da discordância evidenciada nas suas alegações. É ela a seguinte: A) O autor, constituído por escritura pública de 15 de Janeiro de 1988, substituiu a D, representando-a - especificado em A) e C); B) O património desta foi integrado no do autor, para este se transmitindo o activo e passivo respectivos - especificado em B); C) Por carta datada de 24 de Junho de 1987, dirigida à extinta D - substituída depois pelo ora recorrente, que se constituiu em 15 de Janeiro de 1988 -, o réu declarou que autorizava os serviços daquela, em Lisboa, a fazerem a gestão da sua carteira de títulos - especificado em D); D) Em 24 de Junho de 1987 o réu tinha como títulos seus depositados na sua carteira os títulos discriminados a fls. 151, no valor nominal total de 1760200 escudos - especificado em I); E) Em 26 de Junho de 1987 o réu tinha na sua conta de depósitos à ordem aberta na D o saldo de 982500 escudos - especificado em J); F) Os réus casaram um com o outro em 5 de Março de 1967 - especificado em E); G) E exerceu durante todo o ano de 1987 a actividade de corretora adstrita à Bolsa de Valores do Porto - especificado em F); H) F era corretor oficial da Bolsa de Valores de Lisboa em 1987 - especificado em G); I) Os réus não pagaram ao autor a quantia de 155151262 escudos a que se reporta o documento de fls. 89, que se dá como reproduzido - especificado em H); J) Em data coincidente ou próxima de 24 de Junho de 1987, por sugestão do serviço de títulos de Lisboa da D, o réu assinou em branco vários documentos de ordem de compra de títulos, correspondentes aos documentos de fls. 38, 40, 42, 52, 60, 65, 69, 75, 76, 77, 78, 79, 85 e 87 - resposta ao quesito 72; K) A D encarregou F de comprar, sem limite de prazo, na Bolsa ou por outro meio, 1000 títulos de participação, 1. emissão, do BPA - resposta ao quesito 2; L) Foram comprados na Bolsa de Valores de Lisboa, em 11 Setembro de 1987, 350 dos referidos títulos e no seguinte dia 16 mais 650 dos mesmos títulos - resposta ao quesito 3; M) A D encarregou E de comprar, sem limite de prazo, na Bolsa ou por outro meio, 200 acções da Companhia de Celulose do Caima, S.A. - resposta ao quesito 5; N) Foram compradas na Bolsa de Valores do Porto, em 17 e 18 de Setembro de 1987, 70 acções desta Companhia - resposta ao quesito 6; O) A D encarregou E de comprar, na Bolsa ou por outro meio, 490 acções da SIAF - Sociedade de Iniciativas e Aproveitamentos Florestais, S.A. - resposta ao quesito 8; P) Foram compradas na Bolsa de Valores do Porto, em 18 de Setembro de 1987, 270 acções da SIAF - resposta ao quesito 9; Q) Pelo documento de fls. 38 o réu ordenou à D, em 18 de Setembro de 1987, a...

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