Acórdão nº 99B702 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 1999 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMIRANDA GUSMÃO
Data da Resolução25 de Novembro de 1999
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1. No Tribunal de Círculo de Vila do Conde, A intentou acção declarativa com processo ordinário contra B e mulher C, D e mulher E, F, G e marido H, I; J e marido L; M e marido N, O e marido P; Q e mulher R, S e mulher T, U e marido V, X e marido Y, Z e marido A' e B' e mulher C', na qualidade de herdeiros de D', pedindo se reconheça e declare que o Autor é filho do referido D', alegando, em síntese, que nasceu das relações sexuais havidas entre a sua mãe, E' e o dito D', e ainda que este, sempre e até à hora da sua morte, o reputou e tratou como filho, sendo também publicamente como tal reconhecido. 2. Todos os Réus, com excepção dos referenciados em 1., 3., e 5. lugares, contestaram, impugnando a factualidade alegada pelo Autor e invocando a caducidade da acção. 3. No despacho saneador relegou-se o conhecimento da referida excepção para a sentença. 4. Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença a absolver os Réus do pedido. 5. O Autor apelou. O acórdão da Relação do Porto, por acórdão de 18 de Março de 1999, julgou procedente a apelação e, consequentemente, revogou a sentença recorrida, reconhecendo e declarando o Autor A como filho de D'. 6. Os Réus D e OUTROS pedem revista - revogação do acórdão recorrido e absolvição do pedido ou declaração do direito de peticionar por parte do recorrido - formulando as seguintes conclusões: A) a presente acção fundamenta-se em presunções "iuris tantum", nos termos do disposto no artigo 1871, do Código Civil. B) Tais presunções mostram-se ilididas quando existam dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado. C) Os factos considerados provados não podem ser vistos separadamente, mas antes devem ser considerados no seu conjunto, numa perspectiva global. D) A posse de estado, tal como a configura o artigo 1871 do Código Civil, tem como pressuposto o "nomen" - atribuição a uma pessoa de um nome correspondente a um estado - o "tractatus" - ter sido dispensado a alguém um tratamento correspondente a um estado - e a "fama" - quando alguém é considerado pelo público como detentor de um estado. E) A factualidade provada é manifestamente insuficiente para se poder concluir com segurança que existiu por parte do investigado um conjunto de actos claros e positivos de protecção ("algumas deu dinheiro ao Autor e à mãe deste...), amparo ("muitas vezes... encontrava-se com o Autor, dispensava-lhe carinhos e chamava-lhe filho") e solicitude ("... por vezes, quando o Autor era criança, acarinhava-o e levava-o a passear na motorizada"). F) Não vem provado que a mãe do Autor era virgem e menor ao tempo da concepção, ou se o consentimento dela foi obtido por promessa de casamento, abuso de confiança ou abuso de autoridade, sendo também manifestamente insuficiente dizer-se que o investigado por vezes manifestou a intenção de vir a casar com a mãe do Autor. G) O facto de o douto acórdão recorrido ter considerado que no período legal de concepção a mãe do Autor teve relações sexuais com o investigado, não tendo mantido com qualquer outro homem, só poderão fundamentar uma acção de investigação de paternidade, nos termos do disposto no artigo 1817 n. 1 do Código Civil, ou seja, durante a menoridade do investigante ou nos dois anos seguintes à sua maioridade ou emancipação, sendo por isso uma presunção como qualquer outra, que pode ser ilidida através de prova insuficiente ou por prova em contrário. H) Não estão provados factos que se integrem nos conceitos de reputação e tratamento de pai para filho, donde se possam inferir com firmeza e segurança, que o investigado é pai do Autor. I) A falta de verificação de qualquer dos requisitos que constituem a posse de estado, descaracterizará a situação, com as inerentes consequências jurídicas. J) Estão plenamente preenchidos os requisitos do artigo 1871 n. 2, do Código Civil, já que face à factualidade provada não é de molde a poder afirmar com firmeza e segurança a relação paternal do investigado com o recorrido, encontrando-se, assim, amplamente ilidida a presunção de paternidade. K) Se assim se não entender, deverá ser apreciada a invocada questão da caducidade. L) Resultou da audiência de discussão e julgamento que, pelo menos nos últimos quatro anos de vida do investigado, este se encontrava acamado e que o recorrido durante esse período nunca se encontrou com ele. M) Deveria o Tribunal "a quo" ter considerado que, se os poucos actos de tratamento que considerou provados existiram até essa altura, pelo menos, a partir do momento em que o investigado ficou acamado, deixaram de existir tendo, assim, caducado o direito de o recorrido intentar a presente acção, pelo decurso do prazo. 7. O recorrido A apresentou contra-alegações, onde salienta que: 1) Dos autos resulta provada a filiação (e paternidade) "biológica" e a "posse de estado" do Autor. 2) Não foi alegado, nem provado, qualquer facto impeditivo, extintivo ou modificativo de tal "posse de estado". 3) O Autor goza da presunção legal de paternidade prevista no artigo 1871 n. 1 alínea a) do Código Civil. 4) Os Réus não ilidiram tal presunção nos termos do artigo 1871 n. 2 do Código Civil. 5) A acção foi proposta no prazo de um ano prevista no artigo 1871 n. 4, ex vi 1873, do Código Civil. 6) A data da morte é a única data que poderá ser tomada como certa como cessação do tratamento. 7) Aos Réus competia o ónus da prova de que tal tratamento cessara em data anterior à data da morte, o que não lograram fazer. 8) Dos factos provados resulta inequivocamente que o pretenso Pai não alterou em momento algum e até à data da morte o seu comportamento, convicção e tratamento, assim como não foi alterada a reputação e convicção unânime do público. 9) Não se verifica a excepção de caducidade. Corridos os vistos, cumpre decidir. II Elementos a tomar em conta: 1. No dia 14 de Janeiro de 1996 faleceu D', com 68 anos de idade, no estado de solteiro. 2. No dia 2 de Julho de 1956 nasceu o Autor, sendo registado apenas como filho de E'. 3. Entre aquele D' e a mãe do Autor não existe qualquer relação de parentesco ou afinidade. 4. No período compreendido dentro dos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o nascimento do Autor a sua mãe manteve relações sexuais com aquele D', não tendo mantido relações sexuais com qualquer outro homem. 5. O D' por várias vezes manifestou a intenção de vir a casar com a mãe do Autor. 6. Muitas vezes o D' encontrava-se com o Autor, dispensava-lhe carinhos e chamava-lhe filho. 7. Algumas vezes o D' deu dinheiro ao Autor e à mãe deste, dinheiro e géneros...

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