Acórdão nº 99P285 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Junho de 1999 (caso NULL)
Magistrado Responsável | VIRGÍLIO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 30 de Junho de 1999 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. No Tribunal de Círculo de Paredes, perante o tribunal colectivo, foram submetidos a julgamento os arguidos A, casado, industrial, nascido em 13 de Fevereiro de 1965, em Ermesinde, Valongo e residente em Águas Santas, Maia, e B, casado, industrial, nascido em 5 de Janeiro de 1962, residente em Ermesinde. Imputava-lhes a acusação, a prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131 e 132, ns. 1 e 2, alíneas a), b), c) e g), em concurso real com outro crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131 e 132, ns. 1 e 2, alíneas b), c) e g) do Código Penal. Os assistentes C e D deduziram contra os arguidos pedido de indemnização civil, reclamando destes o pagamento da quantia de 6309028 escudos, acrescida dos juros legais desde a notificação aos arguidos do demandado cível, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos. Os arguidos contestaram as acusações do Ministério Público e dos assistentes, negando a prática dos crimes e pedindo a improcedência do pedido cível contra eles deduzido. 2. Após julgamento decidiu o tribunal colectivo: Julgar improcedentes as acusações do Ministério Público e dos assistentes, absolvendo, os arguidos A e B dos crimes de homicídio acusados; Julgar improcedente o pedido de indemnização deduzido pelos requerentes C e D contra os arguidos, absolvendo-os do pedido. Do respectivo acórdão recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça os assistentes e o Ministério Público. 3. Na sua motivação concluíram os assistentes: 3.1. Há contradição insanável da fundamentação, quando se verifique contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, pois pode existir contradição insanável entre os factos dados como provados, mas também entre os dados como provados e não provados, como entre a fundamentação probatória da matéria de facto (veja-se, Germano Marques da Silva, in "Curso de Processo Penal", volume III, página 325 e, entre outros, Acórdão do S.T.J. de 14 de Dezembro de 1995, C.J., Tomo III, página 264); Por seu turno, o erro notório na apreciação da prova, "é o erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente se dá conta" - obra citada, página 326 e, entre outros, Acórdão do S.T.J. de 31 de Janeiro de 1991, C.J., 1991, Tomo I, página 24 e Acórdão do S.T.J., de 3 de Maio de 1991, B.M.J. 405, página 314). 3.2. Em lado nenhum da fundamentação do acórdão, v.g. da exposição sucinta dos depoimentos das testemunhas ........, ......., ......, e .......,, bem como das testemunhas ...... e ......, sobrevém o que vem dado como provado nos pontos 20 e 35 dos factos provados; Não constando do processo lógico e racional utilizado pelo tribunal acerca das provas que serviram para formar a sua convicção e a razão de ser da valoração delas, ou seja, não constando da fundamentação da decisão em crise, o que resulta provado nos pontos 20 e 35 dos factos provados, verifica-se, pois: - a existência de erro na apreciação das provas, no conceito acima referido e pacificamente aceite - pois que o que resulta é que não poderia dar-se como provados tais factos e que partindo do mesmo critério tanto poderia o tribunal dar estes como provados como quaisquer outros; - contradição insanável da fundamentação - porquanto o que ali se deu como provado esta em oposição e contradição com a fundamentação da prova; Ou dito de outra forma: existe clara oposição entre o que serviu de substrato (fundamentação) e o que constitui o ponto de chegada (factos obtidos ou provados - pontos 20 e 35, "in casu"); 3.3. Vem dado como provado que os agentes da G.N.R. chegaram ao local "ainda antes da meia noite"; Quer do que resultou demonstrado em audiência de julgamento, quer dos elementos que constam da decisão recorrida, tal facto deveria e poderia ter sido melhor precisado no tempo, porquanto facilmente se demonstra que os referidos agentes da G.N.R. chegaram ao local quando muito antes das 23 horas e 30 minutos; Com efeito, consta da fundamentação do acórdão recorrido, a dado passo, o seguinte: " ....... e seu marido, ...... (...) por volta das 23 horas, ouviram os pedidos de socorro e dor provindos da Quinta, tendo sido ele quem ligou para o 115 e para a G.N.R. de Alfena; .... que também ouviu os gritos; ..., filha da ....., que por esta foi chamada cerca das 23 horas e 10 minutos...". " ,... Quando já estava em sua casa foi chamado pela testemunha ..... Ainda ouviu um grito aflitivo de uma voz masculina. Saiu e esteve cerca de 5 minutos no exterior. Voltou a entrar em sua casa e divisou, através (...). Essas duas pessoas... onde permaneceram cerca de 5 minutos. Depois voltaram a descer e instantes após desligarem as luzes da "Totocarnes". Entretanto chegou o jeep da G.N.R...." (vide páginas 34 a 36 da decisão). Decorre de toda esta cronologia que, mesmo contabilizando os 10 minutos (5+5) contados das 23 horas e 10 minutos, o jeep da G.N.R. chegou ao local, o mais tardar cerca das 22 horas e 30 minutos. Do que antecede, conclui-se que tendo os agentes da autoridade (G.N.R.) chegado ao local a essa hora - 22 horas e 30 minutos - e no mesmo instante (a expressão entretanto no contexto utilizada é elucidativa da quase simultaneidade de acções - entrada da G.N.R. e saída dos arguidos) tendo saído os arguidos do mesmo local em direcção à "Casa Costa", os arguidos saíram das instalações da "Totocarnes" cerca das 23 horas e 30 minutos; Vem provado que os arguidos no percurso que efectuaram da "Casa Costa" até à "Totocarnes" depois do jantar, por volta das 22 horas, demoraram 15 minutos - vide ponto 20 dos factos provados; Vem igualmente dado como provado que os arguidos após saírem do matadouro... se dirigiram para o restaurante "Costa", onde o arguido Fernando havia deixado a sua viatura (vide ponto 35 dos factos provados); Por seu turno, consta da fundamentação (vide página 36 do acórdão) que por volta das 0 horas e 45 minutos a viatura do arguido A fora vista pelas testemunhas ...... e ..... no parque de estacionamento do mencionado restaurante; Ora, verifica-se erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação quando por um lado se dá como provado que os arguidos após saírem do matadouro se dirigiram para a "Casa Costa" para irem buscar a viatura do arguido Fernando que aí se encontrava estacionada, se do mesmo saíram cerca das 23 horas e 30 minutos, e por outro, se refere na fundamentação que a mesma viatura fora vista por duas testemunhas estacionadas no parque daquele restaurante por volta das 0 horas e 45 minutos; Tais erro na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, advém, além do mais, das regras comuns da experiência, por quanto, como é sabido, quanto mais o adiantado da hora, menor é o tráfego de veículos nas vias públicas, até porque coincidente com as horas normais de descanso dos cidadãos. Daí até que a mesma distância possa ser percorrida mais rapidamente durante o princípio da madrugada que ao princípio da noite. No caso dos autos não se encontra demonstrado que qualquer facto interruptivo no percurso tivesse existido, por forma a que os arguidos, num trajecto que antes fizeram em 15 minutos, tivessem depois que demorar pelo menos 1 hora e 15 minutos; Mesmo o que por bondade de raciocínio se admita que os arguidos apenas saíram das instalações da "Totocarnes" cerca das 24 horas, pelas mesmas razões existe erro na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, tal como resulta do texto da decisão recorrida e com apelo ainda às regras da experiência comum, pois que não poderiam os arguidos (sem que nada o justificasse) demorar pelo menos 45 minutos (às zero horas) para a realização de um percurso que cerca das 22 horas haviam demorado 15 minutos. Ainda mais que apenas se refere que a viatura fora vista no parque estacionada por volta das 6 horas, digo, das 0 horas e 45 minutos, e não que os arguidos a foram buscar a essa hora; A hora de chegada ao local da G. N. R. e o momento de saída dos arguidos da "Totocarnes" - assume particular relevância para a descoberta da verdade nos presentes autos, seja porque toda (ou quase toda) a prova é indirecta, seja porque o momento de chegada ao local destes agentes de autoridade praticamente coincidiu com a saída dos arguidos do mesmo local; Acresce a tudo isto que os arguidos - segundo a versão que apresentaram na sua defesa escrita - após abandonarem as instalações da "Totocarnes" dirigiram-se de imediato para o "restaurante Costa" na viatura VW Golf Van, azul escuro, então conduzida como de costume pelo Domingos, para irem buscar o carro do Fernando que aí, na zona destinada a aparcamento automóvel, permanecera estacionado e a cujo local, segundo os mesmos arguidos chegaram ainda antes das 24 horas; Ora, se os arguidos quando saíram das instalações da "Totocarnes" não se dirigiram para o restaurante "Costa", para onde foram? E o que foram fazer? E então qual a necessidade dos arguidos em mentir?; Sobre isto deveria o tribunal, ao menos, se ter interrogado em lugar de ficar com as certezas de não terem sido os arguidos a cometerem os crimes, como facilmente se conclui do ponto 20 dos factos provados; 3.4. Existe ainda contradição insanável da fundamentação entre, por um lado, os seguintes factos não provados; - que os arguidos não tenham ouvido, em momento algum, qualquer grito, som ou voz, que se ligasse ao pedido de socorro; - que os arguidos não tenham ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - que os arguidos não se tenham apercebido da luz emanada de forma constante e intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial; e a matéria do ponto 20 dos factos provados, onde vem dado como assente que o arguido Domingos "(...) após acender...
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