Acórdão nº 5124/06.8TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelGONÇALO SILVANO
Data da Resolução30 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I - A exigência de forma escrita para o contrato-promessa de compra e venda de fracção autónoma, é extensiva à cessão, integrada em contrato de compra e venda, da posição contratual de um dos outorgantes naquele primeiro contrato-promessa.

II- Ao contrato-promessa de cessão de tal posição contratual,que não já à própria cessão daquela, apenas importará, em matéria de forma, ter em consideração o disposto no art.º 410º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil.

III-No chamado enriquecimento por prestação ,esta muitas vezes não se refere imediatamente a uma única relação de atribuição entre duas pessoas, mas antes comporta várias relações de atribuição denominadas de atribuições patrimoniais indirectas, situação em que o requisito de imediação deixa de servir de base à determinação do obrigado à restituição da prestação.

IV- A verdadeira função do instituto do enriquecimento sem causa não é o requisito de prova do montante do empobrecimento à custa de outrem, mas a de reprimir o enriquecimento injustificado e não o de compensar os danos sofridos.

Decisão Texto Integral: Acordam neste Supremo Tribunal de Justiça: 1-Relatório AA, Sociedade de Mediação Imobiliária, S.A., intentou acção declarativa com processo comum sob a forma ordinária, contra BB e CC, pedindo a condenação dos RR. a pagarem-lhe: a) a quantia de € 60.363,00 de capital;b) a quantia de € 1.262,36 de juros moratórios à taxa legal já vencidos;c) juros moratórios vincendos à taxa supletiva legal de 4% ao ano até efectivo e integral pagamento;d) juros à taxa de 5% ao ano desde a data do trânsito em julgado da sentença condenatória até efectivo e integral pagamento, a título de sanção pecuniária compulsória.

A autora fundamentou o seu pedido no seguinte: Tendo a AA, ..., S.A. prometido vender a DD e mulher EE a fracção autónoma em causa, estes promitentes compradores celebraram com a A. um contrato de mediação imobiliária, incumbindo esta de mediar a cessão da posição contratual daqueles no referido contrato-promessa,pelo preço de € 147.500,00, estabelecendo-se a comissão da A. em 3% do preço do negócio + IVA.

Por contrato de 30-09-2005 os RR. prometeram tomar de cessão a DD e mulher a respectiva posição contratual, com pagamento do preço em três prestações , sendo o prometido contrato de cessão coincidente com a data da outorga da escritura de venda,tendo os RR. pago aos promitentes cedentes o ajustado sinal de € 25.000,00.

Foi comunicada a promessa de cessão à AA, ..., S.A; esta, por carta de 26-01-2006, notificou os RR. de que a prometida escritura pública de compra e venda seria outorgada em 23-02-2006, na sede da CGD, sendo solicitado aos RR. que pagassem na data da outorga da escritura o remanescente do preço em falta no montante de € 64.638,00, devido pela aquisição do imóvel.

A A. esqueceu-se de notificar os promitentes cedentes para que comparecessem ao acto da escritura pública de compra e venda e em 15-02-2006, a AA, ..., S.A., por escritura dessa data, vendeu aos RR. pelo ajustado preço de 129.276,00, o imóvel dos autos.

Tendo-se apercebido, na sequência de missiva dos promitentes cedentes, da falta de convocatória que havia cometido, a A. tentou contactar, por diversas vezes, os RR., no sentido de os mesmos “concretizarem a cessão definitiva que haviam prometido” e de pagarem aos promitentes cedentes o remanescente do preço ajustado, de € 60.362,00,o que tudo resultou em vão.

Assim, através de carta de 17-03-2006, do seu mandatário forense, a A. interpelou os RR. para que estes comparecessem no respectivo escritório em 23-07-2006 pelas 17,00h, a fim de aí ser celebrada a prometida “cessão definitiva” e pago aos promitentes cedentes o residual de preço em dívida,não comparecendo os RR ao acto – a que compareceram os promitentes cedentes – nem justificando tal ausência.

Em 11-04-2006 a A. pagou aos promitentes cedentes, em substituição dos RR., a quantia de € 60.362,00 e nessa mesma data declarando os promitentes cedentes prescindir da celebração com os RR. da “cessão definitiva”, tendo considerado integral e tacitamente cedido para estes o direito à aquisição do fogo respectivo, subrogando a A. no respectivo crédito de € 60.362,00 a cobrar dos RR,que até à data não reembolsaram a A.

Em contestação os Réus alegaram ocorrer incumprimento definitivo do contrato-promessa de cessão da posição contratual, por parte dos promitentes cedentes, que não compareceram na data da escritura de compra e venda onde também se devia celebrar a prometida cessão, agora definitivamente inviabilizada, por se ter celebrado a referida compra e venda,inexistindo assim o pretenso crédito dos promitentes cedentes sobre os RR., aquando da cessão daquele à A.

Houve replica ampliando a A., subsidiariamente o pedido, considerando que ao não pagarem os réus a quantia de € 60.362,0000 e respectivos juros moratórios à taxa supletiva legal, vencidos desde 23-03-2006 e vincendos até integral pagamento, a título de restituição fundada em enriquecimento sem causa, devida aos promitentes cedentes a título de reembolso de parte da 1ª metade do preço de compra do imóvel que estes haviam pago à vendedora AA como sinal e respectivos reforços, logrando, na ausência daqueles, celebrar a escritura de compra e venda, com pagamento de apenas mais 50% do preço de venda, o seu património se enriqueceu injustamente, sem causa, naquele exacto montante, à custa dos promitentes cedentes.

Os Réus treplicaram, assinalando ter-se tratado, mais exactamente, de uma alteração da causa de pedir e não estarem verificados os requisitos do instituto do enriquecimento sem causa.

Após instrução e julgamento,veio a ser proferida sentença que julgou a acção procedente, condenando os RR. a pagar à A. “a quantia de € 60.362,00, acrescida de juros de mora, contados, à taxa legal, desde 15-02-2006 até integral pagamento e de juros de 5% sobre a mesma quantia contados desde a data do trânsito em julgado da presente decisão até integral pagamento.”.

Inconformados os réus apelaram para o Tribunal da Relação e aí por acórdão se julgou a apelação improcedente, confirmando-se (com fundamentos não totalmente coincidentes) a decisão recorrida.

Deste acórdão vieram os réus interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal, onde formulam as seguintes conclusões que delimitam o objecto do recurso: I.O Acórdão recorrido ao não considerar todos os factos aduzidos pelas partes, designadamente pelos Réus, ora Recorrentes e ao valorar diversamente os mesmos, presume uma realidade diversa da que efectivamente existiu e que não podia ignorar.

II.Daqui resulta, salvo melhor opinião um erro de julgamento da matéria de facto e concomitantemente, uma errada qualificação jurídica desses factos.

III.Acresce que, com o devido respeito que é muito, o Acórdão recorrido não especificou suficientemente os fundamentos de facto e de direito que justifica a decisão, sendo certo que os fundamentos aduzidos estão em oposição com a decisão.

IV.Ainda, as questões submetidas a apreciação não foram todas consideradas, o que consubstancia causa de nulidade do Acórdão e fundamentos de recurso.

V.No caso em apreço, não sabemos pois como o julgador formou a sua convicção, o que constitui uma omissão de fundamentação de facto, que, por sua vez, consubstancia uma nulidade do Acórdão, nos termos do preceituado no artigo 668.° nº 1 alínea b) do CPC, o que desde já se alega e requer para os devidos e legais efeitos.

VI.Entendem os aqui Recorrentes, que a decisão é ainda nula por se verificarem diversas contradições entre os fundamentos de facto e o segmento decisório da mesma.

VII.Na verdade, se se considera existir um incumprimento do contrato promessa de cessão, não se percebe como se ignora tal facto na decisão proferida.

VIII.Razão porque deverá a decisão ora recorrida ser considerada nula, ao abrigo do disposto no artº 668.° nº 1 al. c) do CPC - o que desde já se alega e requer.

Acresce que, IX.O contrato promessa de cessão da posição contratual (DOC. 11 junto com a petição inicial) foi objecto de reconhecimento notarial das assinaturas, feito em 04/10/2005, no Cartório Notarial de Lisboa de FF.

X.Todavia, tal facto enferma de (notória) ilegalidade porquanto não foi feita a certificação notarial da existência da licença de utilização como impõe o art.? 410.° nº 3 do Código Civil.

XI.Assim, os argumentos aduzidos para invocar a nulidade do contrato de cessão da posição contratual servem por maioria de razão, para que tivesse sido declarada a nulidade do próprio contrato promessa de cessão da posição contratual, o que não sucedeu pelo que a decisão proferida é nula ao abrigo do preceituado no artº 668.° nº1 al. d) do CPC, o que desde já se alega e requer.

XII.A decisão sobre a matéria de facto encontra-se ab initio viciado por erro. Porquanto, deu-se como assente matéria controvertida e que face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento, não pode ser tida como provada.

XIII.Estes factos são do conhecimento do tribunal, que não os ponderou na decisão proferida.

XIV.Nomeadamente, não considerou o facto de apesar de em 17/03/2006, os Réus terem recebido uma carta do mandatário da "AA - Sociedade de Mediação Imobiliária" a convocarem para estarem presentes no dia 23/03/2006 no escritório daquele (facto provado), os Réus, ora Recorrentes não terem comparecido por desconhecerem a entidade em causa, e do que se tratava.

XV.O que, aliás, é reforçado pelas declarações feitas pela AA ¬... perante o notário que lavrou a escritura de compra e venda e sob a advertência da prática do crime de falsas declarações, a saber que a compra e venda não havia sido objecto de intervenção de mediador imobiliário.

XVI.Estes factos, fundamentais para a decisão da demanda em apreço, não foram considerados na decisão proferida.

XVII.Na verdade, a conduta da...

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