Acórdão nº 293/07.2TTSNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução15 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Área Temática: DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO Doutrina: - Castro Mendes, Teoria Geral, pág. 562. - Júlio Manuel Vieira Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, p. 1064. - Mota Pinto, Teoria Geral, ed. de 1976, pág. 421. - P. Lima e A. Varela, Cod. Civil Anotado, vol. 1, pag. 153. - R.L.J., 110.º, 351. - Vaz Serra, R.L.J., 111.º, 220. Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 217.º, 224.º, 236.º, 342.º, N.º 1. CÓDIGO DO TRABALHO (CT DE 2003): - ARTIGOS 384.º, 447.º, 449.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA: - ARTIGO 47.º, N.º 1. Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 20.02.2008 (PROCESSO N.º 07S3529, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT) ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: - DE 27.02.2008 (PROCESSO N.º 10688/2007-4, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT) Sumário : I - O ordenamento jurídico português consagrou, no artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, a teoria da impressão do destinatário, segundo a qual nela deve prevalecer o sentido objectivo que se obtenha do ponto de vista do declaratário concreto supondo-o uma pessoa razoável.

II - Do n.º 2, do citado preceito, resulta que se o declaratário entendeu a declaração no sentido querido pelo declarante, nesse sentido é de interpretar a declaração.

III - Resultando provado que, em 27 de Abril de 2006, a trabalhadora comunicou ao seu chefe directo que o marido havia sido convidado para ir trabalhar para o estrangeiro e que, porque gostaria de o acompanhar, teria que deixar a empresa, mais resultando provado que, instada acerca da data máxima até à qual permaneceria na empresa, a fim de poder ser feita a passagem do trabalho, respondeu, peremptoriamente, que apenas poderia ficar até 30 de Junho de 2006, resulta evidente que para um destinatário normal, colocado na posição de chefe da trabalhadora, a declaração desta se apresenta como expressa e inequívoca quanto ao seu teor: a de que iria sair da empresa em 30 de Junho de 2006.

IV - Nos termos do artigo 384.º, do Código do Trabalho de 2003, o contrato de trabalho pode cessar por caducidade, revogação, resolução ou denúncia – por sua vez, o artigo 447.º, do mesmo diploma legal, estabelece que o trabalhador pode denunciar o contrato independentemente de justa causa mediante comunicação escrita enviada ao empregador, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, conforme tenha, respectivamente, até dois anos ou mais de dois anos de antiguidade.

V - Todavia, a comunicação escrita a que alude o artigo 447.º, n.º 1, do Código do Trabalho, é uma formalidade ad probationem, não produzindo a sua falta a invalidade da denúncia, justificando-se a exigência da sua forma escrita para prova de que foi respeitado o prazo de antecedência mínima referido no artigo 447.º, n.º 1, do Código do Trabalho.

VI - Com efeito, no caso da cessação do contrato de trabalho por iniciativa e vontade unilateral do trabalhador, prevalece o princípio da denúncia livre ou da liberdade de desvinculação: o trabalhador não pode ser forçado a continuar a prestar trabalho contra a sua vontade, independentemente do modo como tal vontade se tenha manifestado.

VII - Assim, a declaração verbal da denúncia por parte da trabalhadora – nos termos exarados em III – tem como efeito válido a extinção do contrato, sendo extemporânea, face ao disposto no artigo 449.º, n.º 1, do Código do Trabalho, a declaração, por si produzida em 20 de Julho de 2006, de que havia mudado de ideias.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

No Tribunal de Trabalho de Sintra, em acção declarativa com processo comum emergente de contrato individual de trabalho, proposta em 13 de Abril de 2007, AA demandou BB-K... F... Portugal I... Produtos Alimentares, S.A.

, à qual veio a suceder, processualmente, CC-K... F... Portugal I... – Produtos Alimentares, Unipessoal, Lda.

, pedindo que fosse declarado ilícito o despedimento de que disse ter sido alvo e a Ré condenada: i) a pagar-lhe o total das remunerações que deveria ter auferido desde a data do despedimento, até à data da sentença; ii) a reintegrar a Autora ou, conforme opção a fazer, a pagar-lhe a indemnização de antiguidade correspondente a 45 dias por cada ano de trabalho; iii) a pagar-lhe, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a importância de € 4.000,00; iv) no pagamento de juros de mora vencidos e vincendos sobre todas as quantias peticionadas vencidas, vincendas e, também, sobre as que resultarem, eventualmente, da aplicação do disposto no artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho, desde a data da citação até integral pagamento; v) no pagamento, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil, de uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a € 300,00 por cada dia de incumprimento, ainda que meramente parcial, do contrato de trabalho da Autora e da decisão judicial que viesse a ser proferida, desde a data do despedimento até à data da sentença e posteriormente até integral cumprimento desta.

Alegou, em síntese, que: - Estava ligada à Ré por contrato de trabalho desde Setembro de 1997; - No dia 27 de Abril de 2006, dirigiu-se ao seu chefe para lhe comunicar que o marido tinha sido convidado a ir trabalhar para Paris e que, por esse motivo, gostaria de gozar uma licença sem vencimento ou pretenderia que a empresa lhe emitisse a documentação necessária para obter o subsídio de desemprego; - Porém, a Ré iniciou de imediato um processo de recrutamento para o seu posto de trabalho; - Em Junho de 2006, o director de recursos humanos informou-a de que não existia a possibilidade de lhe ser concedida uma licença sem vencimento ou de lhe ser emitida documentação para acesso ao subsídio de desemprego; - Em reunião que teve lugar no dia 20 Julho de 2006, foi-lhe transmitido pelo director-geral da Ré que já não fazia parte da empresa.

Na contestação, em que defendeu a improcedência da acção e pediu a condenação da Autora como litigante de má fé, a Ré impugnou os fundamentos da acção, dizendo, no essencial, que, no dia 27 de Abril de 2006, a Autora comunicou ao seu chefe directo que ia deixar a empresa, sem estabelecer qualquer condição, desse modo denunciando, válida e eficazmente, o contrato de trabalho, denúncia que logo foi aceite, tendo sido combinada entre ambos a data, 30 de Junho de 2006, em que a mesma produziria efeitos; todavia, em Julho de 2006, já depois de a Ré ter procedido ao recrutamento interno de novo trabalhador para o seu posto, a Autora recuou na sua posição, pretendendo revogar a declaração de denúncia.

A Autora respondeu à contestação.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença na qual se considerou que o contrato de trabalho que vigorou entre as partes cessou em 30 de Junho de 2006, por denúncia efectuada verbalmente, pela Autora, em 27 de Abril do mesmo ano, tendo a acção sido julgada improcedente e a Ré sido absolvida de todos os pedidos; a mesma sentença condenou a Autora, como litigante de má fé, no pagamento à Ré de uma indemnização de montante, a apurar ulteriormente, correspondente ao valor das despesas processuais, incluindo os honorários dos mandatários, efectuadas pela demandada, e no pagamento de uma multa, no valor de 5 UCs.

  1. Tendo a Autora interposto recurso de apelação, o Tribunal da Relação confirmou a sentença na parte relativa à absolvição da Ré dos pedidos, mas revogou a condenação da Autora por litigância de má fé.

    Irresignada, com o parcial insucesso da apelação, veio a Autora pedir revista do acórdão daquele tribunal superior, tendo da respectiva alegação extraído as seguintes conclusões: «1 - A decisão proferida pelo Tribunal a quo é recorrível, a Recorrente tem legitimidade para interpor recurso, o qual mostra-se interposto tempestivamente e a taxa de justiça está liquidada; 2 - Face à matéria de facto dada como provada sob os n.ºs 15, 23, 24, 27, 28, 32, 33, 35, 38, 42, 47, 50, 55, 57, 60, 61, 67, 69, 75, 76, 77, 78, 81, 83, 85 e 87 da douta sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, impunha-se uma decisão diversa daquela que veio a ser proferida pelo Tribunal a quo; 3 - A A. sempre referiu à R., actuando como tal perante a R., que pretendia a cessação do seu contrato de trabalho em 30 de Junho de 2006, caso a R. lhe fornecesse a documentação para acesso ao subsídio de desemprego ou então lhe autorizasse uma licença sem vencimento; 4 - A cessação do contrato de trabalho da A. em 30 de Junho de 2006, nunca foi uma questão fechada e decidida pela A., conforme a R. veio alegar e como resulta das diversas reuniões mantidas entre a A. e a R. com vista à obtenção da documentação para acesso ao subsídio de desemprego ou atribuição de licença sem vencimento; 5 - Da conduta da R. durante o mês de Maio, Junho e Julho, resulta que a cessação do contrato de trabalho da A. não iria ter efeitos a 30 de Junho de [2006].

    6 - A R. pediu à A. que apresentasse carta de demissão, pedido esse que no contexto da relação laboral entre a A. e a R., só pode significar para a A. que a apresentação da referida carta era condição para a validade da denúncia do seu contrato de trabalho, não tendo resultado provado que se tratava de uma carta para efeitos de mero arquivo, conforme a R. alegou; 7 - A R. levou a cabo a actualização do computador atribuído à A. em 27 de Junho de 2006, como se a A. fosse continuar a prestar a sua actividade para além de 30 de Junho de 2006; 8 - A R. pagou o salário de Julho de 2006 à A., vindo somente em Agosto de 2006 invocar que se tinha tratado de lapso, lapso esse que não resultou provado para além da mera alegação da R.; 9 - A R. somente pediu à A. a devolução do veículo de serviço, telemóvel e computador, tudo instrumentos de trabalho, somente em Agosto de [2006] ou seja, mais de um mês após a alegada denúncia do contrato de trabalho levada a cabo pela A.; 10 - Entre a A. e a R. nunca foi atribuído qualquer valor ao silêncio, nem se pode...

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